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Matar startup não é sinal de fracasso, mostra empreendedor em série

Para Guilherme Freire, que coleciona nomes como Livo, Grin e Dolado, é importante ter empatia para entender a dor do cliente; cultura de unicórnio é superestimada, diz ele

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Por Letícia Ginak
Atualização:

A metodologia ágil das startups imprime um outro ritmo e mesmo uma nova lógica no empreendedorismo. É possível validar o produto de forma rápida, vender a solução para grandes empresas em busca de inovação e, talvez o principal, testar mercados. Não é porque você fundou uma startup no setor de alimentação que precisa permanecer à frente dela para o resto da vida. Ou que tenha que empreender apenas no setor de alimentação.

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“A própria definição de startup formulada pelo professor Steve Blank pressupõe a natureza transitória, experimental e falível da startup. Ou seja, a alta taxa de mortalidade de startups faz parte do método utilizado e não é algo especialmente negativo. Desde que se erre rápido, barato e aprenda muito com a experiência. Um dos aspectos inerentes à dinâmica das startups é que os métodos utilizados hoje privilegiam o aprender rápido e barato”, diz o professor de empreendedorismo do Insper Marcelo Nakagawa. 

Assim surgiu o que chamamos de empreendedor serial. Criar, abrir, vender ou fechar. Não importa. O que o motiva é detectar mercados e provocar soluções para o mesmo.Guilherme Freire é um empreendedor serial. Criador da primeira marca de óculos nativa digital Livo Eyewear, ex-sócio da empresa de patinetes Grin, ex-presidente da Grow, e atualmente criador da Dolado, marketplace que fomenta o comércio de pequenos varejistas, o engenheiro de produção de formação conversou com o Estadão PME para explicar os altos e baixos de um empreendedor profissional. Alerta spoiler: é preciso estudar. Muito.

Como foi a sua trajetória na universidade? Já pensava em empreender? 

Fiz engenharia de produção na PUC-RJ e desde aquela época eu já sabia queria direcionar a minha carreira para o empreendedorismo. Por um tempo eu tentei seguir uma carreira no mercado corporativo, isso era em 2007 e não tinha startup, nada disso. Comecei de forma tradicional, mas não conseguia parar em lugar nenhum. 

Comecei no mercado financeiro. Odiei. Foi o pior ano da minha vida. Aí fui para consultoria, fiquei dois anos de saco cheio, só preparava slide, não conseguia ver nenhum sentido no que eu fazia e também não me encontrei. Aí fui tentar uma coisa totalmente diferente do convencional e virei headhunter. Achei até legal, mas também não era aquilo. 

Então, quando eu estava totalmente perdido, abri a minha primeira empresa, que foi no mercado tradicional, não no de tecnologia. Criei um bairro planejado e foi muito legal, me encontrei com esse formato de poder fazer as coisas do meu jeito. Cometi vários erros, mas pensei: é isso o que eu quero para o resto da minha vida. 

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Guilherme Freire já criou vários negócios em setores diferentes da economia; atualmente, é CEO do marketplace Dolado. Foto: Felipe Rau/Estadão

Eu vi que eu queria empreender, mas a economia tradicional não era tão interessante, as coisas acontecem mais devagar. E então surgiu uma oportunidade de eu entrar de sócio em um e-commerce. Ali foi quando eu pensei ‘agora eu achei’. Vi que a base de tecnologia é muito mais dinâmica, você busca referência em tudo quanto é lugar do mundo, vai atrás de investidor. Me seduziu demais. 

Na mesma época, em 2011, passei no meu MBA na Wharton Business School, nos Estados Unidos. Esse era o sonho da minha vida. Fui focado em aprender sobre empreendedorismo e pensei que tinha ido para lá para encontrar o meu próximo negócio. 

E encontrou? 

Sim, conheci um pessoal que tinha começado a vender óculos pela internet. Não tinha muito esse conceito de vender óculos pela internet, era meio loucura. A ideia surgiu dentro da universidade, conheci os fundadores e em pouco tempo o negócio dominou os EUA. E eu me encantei. Pensei: será que isso daria certo no Brasil? Então eu paguei para ver e criei a Livo Eyewear, que foi a primeira marca de produto físico que só vendia pela internet, em 2012. 

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Foi a experiência mais incrível da minha vida. Só que quando deu cinco anos de empresa eu comecei a ficar de saco cheio. Queria fazer algo diferente. Então surgiu a oportunidade de eu vender a minha participação. Mas já fiquei naquela ‘vamos para o próximo’. Eu queria achar o próximo negócio. 

Você empreendeu logo em seguida?

Não. Eu fui fundar um grupo de investidores-anjo. Na verdade, trouxe o grupo de investidores-anjo da Wharton para a América Latina. E com isso eu comecei a interagir com vários tipos de negócios até que esbarrei em um negócio de mobilidade. Eu não conhecia muito o setor. Então conheci uma pessoa que estava com uma ideia maluca de trazer patinete elétrico para a América Latina. Para mim era uma loucura completa. 

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Ele me pediu para ajudá-lo a desenvolver o plano de negócio e, nesse processo, eu achei o cara incrível, a história era muito legal, os números faziam muito sentido e falei: vamos fazer. Muito rápido a gente fez a fusão com uma outra empresa e nos tornamos Grin. Em seguida, fizemos a fusão com a Yellow, compramos outras empresas e viramos Grow. Me tornei o presidente da Grow. A empresa despontou muito no primeiro ano, cresceu rápido, mas começamos a ter muito atrito e vendi a empresa em janeiro 2020. 

Quando vendeu a Grow já tinha mais um mercado em vista?

Pensei em tirar um ano sabático, só que eu não me aguentei. Meu atual sócio veio me contar de uma pessoa que ele conheceu e que queria ajudar os pequenos varejos de cidades do interior e periferias que estavam para fechar as portas por conta da pandemia. Então em abril criamos a Dolado, um projeto muito legal, porque você usa a tecnologia para resolver as dores desse público. Já estamos com mais de 40 funcionários e com quase 2 mil lojistas.

Empreendendo em tantos mercados diferentes, qual é a sua visão para o ecossistema de startups no Brasil? 

Eu odeio a cultura do unicórnio. Primeiro que ela parte de uma lógica que já começa errada. O unicórnio é a empresa que está sendo avaliada por investidores por mais de U$ 1 bilhão com base na última captação que ela fez. Qual é o problema disso: os investidores muitas vezes avaliam muito mal o valor das empresas. A Grow estava nesse jogo, nessa cultura. Não quero isso nunca mais. A coisa mais ridícula do mundo é quando o empreendedor comemora o valuation. Motivo para celebrar eu vou ter quando bater 100 mil clientes, gerar milhares de empregos, transformar vidas.

Mas tem uma parte desse cenário que me deixa muito feliz.Na minha época, o sonho de 9 em cada 10 era ou trabalhar no mercado financeiro ou trabalhar em uma multinacional. Hoje, o grande sonho é empreender, trabalhar em uma startup. Você vê ótimos negócios locais, rentáveis, que não são negócios de bilhões, mas que tem muito mais valor do que negócios de bilhões. 

O que você diria para um jovem universitário que tem o empreendedorismo como plano de carreira? 

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O que eu faria se estivesse me formando hoje: não pensaria já em empreender de cara. Começaria em uma startup, veria como se faz em uma, depois vai para outra, depois outra… lá pela quarta, quando eu já tivesse diferentes visões, aí eu iria começar a pensar em fazer a minha. 

Muita gente quer fazer isso dentro da universidade e achar que já vai valer U$ 1 bilhão e aí acaba sendo muito frustrante. O que é para ser um processo gostoso, legal, uma descoberta, acaba sendo muito traumático. Bem ou mal é uma empresa, exige gestão. Tem que saber fazer um planejamento estratégico, tem que ter noções de gestão. Em negócios de tecnologia, a complexidade operacional é muito alta. 

Tenha profundidade no conhecimento sobre gestão, metodologias que as empresas usam, é uma busca infinita por conhecimento. E uma soft skill muito importante é empatia. É preciso ter empatia com ousuário da sua solução. 

 

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