BRASÍLIA – Alvo de um pedido de auditoria por parte do presidente Jair Bolsonaro, o PSL acumula dívidas de ao menos R$ 5,9 milhões com a União relacionados aos seus diretórios regionais. A maior parte (86%) diz respeito a multas eleitorais, aplicadas por irregularidades envolvendo gastos em campanhas de candidatos do partido. Dirigentes da sigla atribuem os débitos a gestões anteriores da sigla nos Estados.
Advogados do presidente dizem que as irregularidades no uso do Fundo Partidário – que banca gastos do dia a dia, como aluguéis e salário de funcionários, além de campanhas – podem servir de argumento para uma saída de deputados do partido por “justa causa”, sem perda de mandato.
A falta de transparência na utilização de recursos públicos destinados à sigla é um dos argumentos da ala ligada a Bolsonaro para cobrar o afastamento do atual presidente do PSL, deputado Luciano Bivar (PE), que comanda o partido há 25 anos.
Na lista de devedores da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) – órgão do governo responsável por cobrar as dívidas –, estão diretórios locais do PSL que deixaram de pagar os débitos após 30 dias da decisão da Justiça Eleitoral.
O que acumula o maior saldo devedor é o de São Paulo, comandado desde julho pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente. O total de R$ 1,01 milhão se refere a multas eleitorais (R$ 896,5 mil) e débitos tributários (R$ 115,2 mil). Procurado, o diretorio paulista não respondeu sobre os débitos.
Conforme mostrou o Estado em agosto, dos 362 municípios paulistas onde o PSL tem diretório, apenas 147 estão aptos a funcionar.
O restante foi desativado ou tem pendências que vão de ausência de prestação de contas à falta de CNPJ. As irregularidades impedem o partido de lançar candidatos a prefeito ou a vereador nestas cidades no ano que vem. Eduardo afirmou que tem atuado para regularizar a situação a tempo.
No “caderninho” da PGFN também consta uma multa criminal de R$ 7,1 mil ao PSL de Altamira, no Pará. Questionado sobre o motivo da cobrança, o presidente do diretório paraense da sigla, Hugo Barra, afirmou desconhecer.
“Isso tem relação com a antiga gestão, que antecedeu a minha. Não temos um levantamento ainda da situação do partido em todas as cidades”, afirmou Barra, que é secretário de Justiça no governo de Helder Barbalho (MDB) e filho do deputado Eder Mauro (PSD-PA).
Barra assumiu a direção partidária no Estado no ano passado, quando o PSL deixou de ser um partido nanico e se tornou uma superpotência. Impulsionada pela onda bolsonarista, a sigla foi a mais votada na disputa para a Câmara em 2018 e deve receber, apenas neste ano, R$ 110 milhões do Fundo Partidário.
Fundo Partidário para quitar débitos
Um projeto aprovado na Câmara no mês passado pode ajudar o PSL a usar o cofre inflado para quitar as dívidas. Isso porque deputados incluíram no texto a previsão de que os recursos do Fundo Partidário podem ser usados para o pagamento de multas – aplicadas, na maioria das vezes, por uso irregular do dinheiro público. Este trecho, porém, foi vetado por Bolsonaro ao sancionar a lei. Parlamentares discutem derrubar o veto.
Para o advogado Cristiano Vilela, integrante da comissão eleitoral da seccional de São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP), o pagamento das dívidas com recursos públicos, apesar de soar como uma incoerência, é uma necessidade dos partidos após o fim do financiamento empresarial, proibido em 2015 pelo Supremo Tribunal Federal. “Se não puder usar recurso público vai pagar como?”, questionou Vilela.
Ação contra ex-presidentes
Em Goiás, o deputado Delegado Waldir (PSL-GO), presidente do diretório estadual desde o ano passado, disse que ingressou com uma ação judicial para responsabilizar os antigos dirigentes da sigla pelas dívidas. Ele tem R$ 300 mil pendente de pagamento. “Não fui eu e nem o presidente Luciano Bivar que causamos essas dívidas”, afirmou. Ele argumentou que, nos casos dos diretórios municipais de Goiás, cada gestor terá que resolver a situação por conta própria. “Cada um por si e Deus por todos.”
O presidente do diretório do Ceará, deputado Heitor Freire (PSL-CE), também disse ter herdado o passivo ao assumir o posto. “Eu estou respondendo processo por contas desaprovadas em 2014 e 2015. Essa semana chegou uma senhora lá operada de câncer com uma carteira de trabalho na mão que desde 2015 o partido nunca tinha dado baixa”, disse Freire. “Eu tive de contratar um escritório contábil para resolver isso”, afirmou. Segundo ele, as dívidas, na casa de R$ 40 mil, são referentes a multas por falta de prestação de contas.
Procurado, Bivar também afirmou, por meio de sua assessoria, não ser responsável pelos valores devidos por diretórios locais do partido. “O diretório nacional não tem nenhuma dívida inscrita na dívida ativa da União. Essa dívida é de cada um dos diretórios”, afirmou. Pela lei, cabe ao diretório nacional repassar parte do que é recebido do Fundo Partidário aos diretórios locais.
A crise incontrolável do PSL; ouça no podcast abaixo
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.