O discurso da presidente afastada Dilma Rousseff no Senado foi como se esperava. Um pronunciamento político e de despedida. As tecnicalidades sobre as pedaladas fiscais apareceram, mas ficaram em segundo plano. Dilma resgatou seu passado e defendeu as realizações dos 13 anos de administrações petistas. Não houve claro pedido de desculpas sobre práticas específicas ou o anúncio de novas medidas no caso de permanecer no poder – a não ser uma vaga convocação de eleições.
Foi um discurso voltado àqueles que apoiam seu governo e não a alterar votos dos senadores ou a sensibilizar eventuais indecisos. A opção foi por uma defesa política, e não jurídica. A presença de Dilma no Senado não mudará o destino de sua administração ou a percepção que a maioria da opinião pública tem de sua Presidência.
Seu objetivo foi tentar demonstrar que seu governo sofreu um julgamento político sem embasamento legal. De maneira mais sutil que a usual, foi o de fortalecer a narrativa do golpe tendo em vista os próximos embates políticos que o País terá pela frente, não apenas eleitorais, mas também no Congresso, em torno de votações importantes, como a reforma da Previdência e o contingenciamento de gastos.
A fala de Dilma, porém, nos ajuda a pensar sobre as razões do fim de seu governo e sobre a natureza do processo de impeachment. Em que pesem todos os esforços dos advogados de ambos os lados em estabelecer argumentos e interpretações a favor ou contra a sua saída, não é por conta das pedaladas fiscais que seu governo se desmanchou. Nenhuma das alegações feitas pela acusação avançaria se o governo não tivesse perdido o apoio no Congresso Nacional, se o País não estivesse passando pela pior crise econômica em décadas e se o próprio instituto do impeachment não fosse tão aberto a interpretações. Os principais equívocos do governo não estiveram na esfera contábil, mas nos âmbitos político e econômico.
Ao final, ainda que indiretamente, o discurso da presidente afastada ressaltou algumas das disfuncionalidades de nosso sistema político e deu um recado importante aos próximos presidentes sobre como proceder na sua relação com o Congresso. *Cientista político e professor da Unicamp