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Opinião|A Águia de volta ao Brasil

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convidado

Encerrados os trabalhos da Conferência de Paz de 1907, Ruy Barbosa voltou ao Brasil e retomou suas atividades políticas e profissionais. Era alguém que o Brasil já conhecia como advogado, deputado, jornalista, Ministro de Estado do Governo Provisório. Cresceu ainda como escritor, ofertando à língua portuguesa algumas de suas páginas mais belas. Erudito, escreveu memórias e ensaios e elaborou um formidável arsenal de conhecimentos. Como orador, mantinha presa, sem fadiga, a atenção de auditórios durante horas seguidas. Parlamentar, tomou – com brilho e sucesso – parte em todas as discussões, seja na defesa, como no ataque.

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Ministro de Estado, foi corajoso e combatido. Como legislador, tomou iniciativas administrativas e normativas de extraordinário destaque. Na condição de jornalista, produzia o milagre de publicar, cada dia, durante meses seguidos, um artigo elegante, convincente, documentado. Jurisconsulto, escreveu notáveis pareceres cheios de saber, de clareza, de lógica ou a defender causas com o vigor, a dialética e precisão conducentes à vitória. Como internacionalista, defendeu, na segunda Conferência de Haia, os grandes princípios do direito público e se impôs à admiração universal.

Sobrevindo a primeira grande guerra, em tempo em que a vitória dos aliados ainda era duvidosa, manifestou-se em conferências de repercussão mundial, contra expedientes dos impérios centrais e estabeleceu os novos caminhos para a neutralidade.

Sua glória foi inexcedível e mais resplandecente, quando defensor dos oprimidos e das liberdades públicas. Mostrou aos brasileiros o valor, a eficácia e a extensão das armas de defesa contra o Estado que a Constituição, cujo definitivo projeto ele mesmo redigira, lhes punha nas mãos. Ruy constituía uma Escola Prática de Direito Constitucional, uma lição de ética dada a jurisconsultos e a políticos e um Curso de Direito Prático ensinado à República.

Ruy nasceu na Baía, em 5 de novembro de 1849. Estudou direito em São Paulo. Desfraldou a bandeira do Federalismo, como fórmula de salvação do Império. Não aderira ainda à República. Recusou-se a participar do Governo do Visconde de Ouro Preto e é esse o momento em que se o considera conquistado pela República. Cai o governo em 15.11.1889 e Ruy aparece como Vice-Presidente do Governo Provisório e Ministro da Fazenda.

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No mesmo dia da proclamação, promulga o decreto que estabelece a federação e lhe dá as bases. Em 7 de janeiro de 1890, decreta a liberdade dos cultos, não para subordinar a Igreja ao Estado, mas para a tornar realmente livre. Esses dois atos fundamentais do novo regime são obra sua.

Na visão de Dunshee de Abranches, em “Atos e atas do governo provisório”, “pode-se dizer, com justiça, que na primeira semana depois da proclamação da República, um único cérebro pensou e agiu, o de Ruy Barbosa”. Esse prestígio o acompanhou até os últimos dias do Primeiro Ministério do Governo. Ruy ainda preparou o projeto da Constituição para ser submetido à Assembleia Constituinte e foi o inspirador do sistema federativo. Só ele o conhecia, entre os integrantes do novo governo. Seus mais ilustres companheiros, Benjamin Constant, Quintino Bocaiuva e Campos Salles só haviam estudado livros franceses e estavam impregnados da cultura e do espírito latino. Somente Ruy conhecia o que se passava nos Estados Unidos da América do Norte.

Foi muito criticado por eliminar os arquivos da escravidão e pelo episódio do Encilhamento, que precisa ser devidamente analisado em outro texto. Ao deixar o governo voltou à atividade forense e logo enfrentou as dificuldades postas pelo Presidente Marechal Floriano Peixoto. Destemido, afrontando o autoritarismo violento, impetrou habeas-corpus em favor de presos e perseguidos. Quando ia sustentar, enchia-se de gente a Casa da Justiça. E isso porque eram formidáveis as suas falas. Eloquente e firme, todos acreditavam ser impossível não se obter a concessão do benefício constitucional, cuja introdução no Brasil ele mesmo, o próprio Ruy Barbosa, arquitetara para a nova ordem fundante.

Todavia, a cabeça de juízes é labiríntica e nem sempre acessível à sociedade jejuna em ciência jurídica. Ruy mais perdia do que ganhava, quando o que estava em jogo era a liberdade. Direito fundamental desde sempre explicitado na Constituição da República, então ainda criança.

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José Renato Nalini
Reitor da Uniregistral, docente da pós-graduação da Uninove e secretário executivo das Mudanças Climáticas de São Paulo
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