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COP 27 e a instituição do fundo de reparação de perdas e danos climáticos

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Por Eduardo Ferreira , Aline Barreto Philodemos e Laura Rodrigues Gonçales
Atualização:
Eduardo Ferreira, Aline Barreto Philodemos e Laura Rodrigues Gonçales. FOTOS: DIVULGAÇÃO  Foto: Estadão

Em novembro de 2022, houve o encerramento da 27ª edição da Conferência das Partes (Conference of Parties - COP), realizada em Sharm el-Sheikh, no Egito. Muitas eram as expectativas para a COP 27, uma vez que sua maior pretensão e objetivo seriam a previsão de normas e diretrizes para assegurar a implementação do Acordo de Paris, compromisso mundial celebrado na COP 21, em 2015, que prevê metas para a redução da emissão de gases do efeito estufa.

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Dentre os assuntos que foram pautados para discussão na COP 27, esperavam-se grandes discussões sobre alternativas para o financiamento de ações concretas para mitigação de impactos decorrentes das emissões de gases do efeito estufa, bem como a adoção de mecanismos de indenização de perdas e danos pelas variações climáticas. Foram travadas inúmeras discussões acerca da possibilidade de criação de um fundo de perdas e danos para países mais vulneráveis aos impactos climáticos.

É de se frisar, porém, que a discussão em torno do financiamento e perdas e danos climáticos não é recente: na COP 15, de 2009, foi firmado o Acordo de Copenhague, por meio do qual os países desenvolvidos comprometeram-se a contribuir com recursos financeiros para mitigação e adaptação dos países mais vulneráveis às mudanças climáticas.

No ano seguinte, durante a COP 16, foi prevista a criação de um "Fundo Verde", o qual entraria em funcionamento em 2020, para auxiliar países em desenvolvimento com a implementação de medidas de mitigação à crise climática. Na COP 17, realizada em Durban, na África do Sul, foi acordado entre as partes o procedimento para o funcionamento do fundo.

Em 2013, na COP 19, foi então elaborado o Mecanismo Internacional de Varsóvia para Perdas e Danos, que previa a disponibilização de recursos financeiros para ajudar países vulneráveis a lidarem com os impactos de eventos climáticos extremos resultantes das mudanças climáticas.

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O Mecanismo de Varsóvia foi reafirmado no Acordo de Paris, sem que houvesse, no entanto, definição sobre a operacionalização de recursos ou a criação de um fundo específico sobre o tema. O fato de terem se passado quase dez anos sem maiores definições no Regime Internacional de Mudanças Climáticas sobre o tema de perdas e danos ilustra a dificuldade que há em negociações relativas a essa temática.

Historicamente, as convenções das Partes e as discussões relacionadas a perdas e danos por eventos climáticos apresentam diversas dificuldades para a efetiva implementação de mecanismos globais para subsidiar ações de combate a mudanças climáticas em países mais vulneráveis. Por exemplo, nota-se a postura contrária adotada por representantes do Reino Unido e da União Europeia, receosos de que a criação de um fundo global representasse admissão de culpa por parte dos países desenvolvidos e assim fomentasse o surgimento de pedidos de reparação e responsabilização dos países historicamente considerados como grandes emissores de gases de efeito estufa.

As discussões para a criação de fundo para as perdas e danos também perpassaram pelas tratativas sobre a aplicação do princípio de responsabilidades comuns, porém diferenciadas. Este princípio, formalizado na Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima em 1992, prevê que há uma responsabilidade comum em empenhar esforços para combater as mudanças climáticas, devendo tal responsabilidade ser diferenciada entre cada país, em função de suas distintas capacidades contributivas.

Os países desenvolvidos defendiam a aplicação mitigada do princípio de responsabilidades comuns, porém diferenciadas, sob o argumento de que países emergentes, que também devem ser considerados relevantes emissores de gases de efeito estufa, deveriam contribuir financeiramente. Por sua vez, os países emergentes consolidados nas negociações climáticas no grupo G77 + China - o qual contém 134 nações em desenvolvimento, incluindo o Brasil - defendiam a aplicação plena do princípio de responsabilidades comuns, porém diferenciadas, com a preocupação de que sua participação nos mecanismos de financiamento agravasse a diferença entre países emergentes e desenvolvidos.

Após diversos anos de discussões acerca da criação de um fundo de perdas e danos climáticos, a COP 27 terminou com um resultado histórico: a efetiva criação do "Plano para Implementação de Sharm el-Sheikh". O referido plano delineou a necessidade de os esforços para mitigação da crise climática refletirem a melhor ciência disponível, dentro das responsabilidades e capacidades de cada país, à luz do princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas.

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Embora a criação de tal fundo seja uma inovação relevante no Regime Internacional de Mudanças Climáticas, maiores detalhes quanto ao funcionamento e operacionalização do novo fundo permanecem pendentes de definição e geram expectativas para a COP 28, prevista para ser realizada este ano, em Dubai. Pelo resultado das discussões no Egito, há muito ainda a ser avançado pelos países para uma definição concreta de critérios claros sobre quais países poderão ser beneficiados pelo novo fundo, bem como quais países terão que contribuir em caráter mandatório ou voluntário para subsidiar ações de mitigação de efeitos de eventos climáticos extremos.

Apesar de embrionário, o fundo de perdas e danos climáticos criado pela COP 27 é extremamente relevante para a implementação de medidas de mitigação das mudanças climáticas. É um primeiro passo para o andamento de discussões que perduram por anos e que ainda estão longe de serem concluídas. As novas expectativas agora estão voltadas ao funcionamento e à futura operacionalização do referido fundo.

*Eduardo Ferreira, Aline Barreto Philodemos e Laura Rodrigues Gonçales são, respectivamente, sócio, advogada e assessora jurídica da área Ambiental do Machado Meyer Advogados

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