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Opinião|Ética no Judiciário: tempestade perfeita

Infelizmente, o STF se considera imune aos preceitos do Código de Ética. E os juízes, além de não receberem um exemplar quando tomam posse, nunca são incentivados a lê-lo e a observá-lo

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convidado
Por José Renato Nalini

A ciência do comportamento moral do homem em sociedade está em desprestígio generalizado. Embora seja a matéria-prima de cuja carência o Brasil mais se ressinta, é um verbete que perdeu espaço até no discurso. As palavras da moda são pragmatismo, empreendedorismo, resultado, competitividade, ranking, Inteligência Artificial.

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O declínio dos valores afeta praticamente todas as instituições, aquelas ideias-força nutridas por uma firme crença em sua validade e permanência através os tempos. Assim a família, a escola, a Igreja, a política. E a instituição judiciária, o equipamento estatal encarregado de solucionar controvérsias não escapou à crise.

As críticas ao sistema Justiça atingem todas as instâncias. A Suprema Corte vê-se acossada de acusações, desde pretensa invasão em espaços reservados aos demais Poderes da República, até à promiscuidade no convívio entre seus integrantes e jurisdicionados que custeiam encontros internacionais dispendiosos.

Se ao primeiro argumento é fácil alegar que é a Constituição Cidadã de 1988 que confere esse protagonismo à cúpula do Poder Judiciário, ao segundo resta frágil qualquer defesa. Qual o proveito dessas incursões nababescas para o aprimoramento da Justiça brasileira?

O STJ, o “Tribunal da Cidadania”, foi concebido para funcionar como Corte de Cassação, no modelo italiano. Essa a inspiração de seus defensores. Converteu-se em terceira instância e sua fórmula amplia o chamado “Quinto Constitucional” para adotar um “Terço Constitucional”. Com a agravante de que desembargadores que chegaram aos Tribunais pelo critério do “quinto”, concorram a suas vagas como se fossem “magistrados-raiz”, aqueles que prestam concurso para ingressar na Magistratura.

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Um clamor generalizado é o custo da Justiça brasileira. Enquanto países mais desenvolvidos destinam alguma coisa inferior a um por cento do PIB para o funcionamento de seus sistemas, o Brasil precisa de 1,6% para sustentar a máquina que não para de crescer. Resultado da proliferação de Faculdades de Direito, que também multiplica as carreiras jurídicas e transforme o Brasil no cenário de uma beligerância judicial verdadeiramente surreal?

O anacronismo dos concursos de ingresso à Magistratura continua a priorizar a memorização e negligencia atributos muito mais importantes do que saber de cor o acervo enciclopédico da legislação, doutrina e multifária jurisprudência tupiniquim. Não se insiste em labor incansável – abundam as queixas de inexplicável atraso na tramitação dos processos – em urbanidade em relação às partes – quantos advogados não se queixam da recusa em atender ou da pouca atenção de magistrados quando os atendem?

Formalmente, não há ser tão vigiado e fiscalizado como o juiz. Quando na primeira instância, ele tem um Corregedor atento. Para todos, uma Corregedoria Nacional. Mas há o tribunal da mídia, da sociedade, da Universidade, da academia. Só que, mesmo assim, a prestação jurisdicional continua aquém das expectativas de uma sociedade que, sacudida pelas tecnologias da Revolução Industrial, caracteriza-se pela pressa, pela urgência, pela celeridade a qualquer custo.

Como seria bom que as lideranças do Poder Judiciário atentassem para a falta que a ética tem feito para o funcionamento do sistema Justiça como um todo. Problemas existem não só no Judiciário, mas no Ministério Público, na Defensoria Pública, na Polícia, no sistema penitenciário, na advocacia em geral.

Para os juízes existe o Código da Magistratura Nacional, editado pelo CNJ em 2008 e, infelizmente, não obrigatório. Tanto que não há sanções para as faltas éticas. Um artigo seu, o 25, deveria merecer leitura diária por parte de todos os magistrados: atentar para as consequências concretas de sua decisão. Não cabe mais o “fiat justitia, pereat mundus”. O juiz não está dispensado de perseguir os objetivos nacionais permanentes, de observar os fundamentos da República, de contribuir para a melhor qualidade de vida de todos os humanos. E, segundo alguns, de todos os seres vivos.

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Infelizmente, o STF se considera imune aos preceitos do Código de Ética. E os juízes, além de não receberem um exemplar quando tomam posse, nunca são incentivados a lê-lo e a observá-lo. É a tempestade perfeita, para colocar a Justiça brasileira num estágio de confiabilidade que não constitui motivo de orgulho para os que exercem suas missões como verdadeiros artífices na edificação de um mundo melhor, de harmonia e de paz.

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José Renato Nalini
Reitor da Uniregistral, docente da pós-graduação da Uninove e secretário executivo das Mudanças Climáticas de São Paulo. Foto: Alex Silva/Estadão
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