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Corregedor manda investigar pagamento de salários de mais de R$ 1 milhão a juízes de Rondônia

Ministro Luís Felipe Salomão, corregedor nacional de Justiça, adverte que, desde o segundo semestre de 2023, os desembolsos relativos a adicional por tempo de serviço (ATS) para magistrados estão suspensos em todos os tribunais do País; TJ de Rondônia informou que repasses milionários realizados em fevereiro foram incluídos na previsão orçamentária da Corte em 2023

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Por Pepita Ortega e Fausto Macedo
Atualização:
Edifício do CNJ tem fachada em Brasília Foto: GABRIELA BILO / ESTADAO

A Corregedoria Nacional de Justiça decidiu apurar o pagamento de salários milionários a juízes e desembargadores do Tribunal de Justiça de Rondônia em fevereiro. Como mostrou o Estadão, 46 integrantes da Corte tiveram subsídios de mais de R$ 1 milhão cada, em valores brutos. Dez juízes e desembargadores receberam R$ 1 milhão líquidos, ou seja, já com os descontos de praxe.

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A ordem para investigar os subsídios dos juízes e desembargadores de Rondônia é do ministro Luís Felipe Salomão, corregedor nacional de Justiça, que tem se empenhado notadamente para corrigir distorções e privilégios em tribunais.

A Corregedoria abriu um ‘pedido de providências’ sobre o caso para requerer informações da Corte estadual que divulgou, em nota, que as ‘vantagens’ que elevaram os subsídios de seus magistrados em fevereiro incluem ‘adicional por tempo de serviço, indenização de férias e outros direitos que estavam acumulados’.

Ainda de acordo com o Tribunal, os pagamentos foram ‘devidamente autorizados pelo Conselho Nacional de Justiça e também pelo Tribunal Pleno Administrativo de Rondônia’.

O Conselho Nacional de Justiça, no entanto, ressaltou que o deferimento dos retroativos do ATS está suspenso para todos os Tribunais desde o segundo semestre de 2023. O órgão disse não ter encontrado, em sua base de dados, a autorização do benefício para a Corte de Rondônia.

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Em despacho assinado neste domingo, 5, o juiz auxiliar da Corregedoria Nacional de Justiça ressaltou a suspensão determinada em abril do ano passado, frisando que ‘não houve’, por parte do órgão, ‘autorização de pagamento expressa, e nem mesmo tácita, de Adicional por Tempo de Serviço aos magistrados do Tribunal de Justiça de Rondônia’.

“Considerando as informações contraditórias e inconsistentes presentes na mencionada nota do TJRO, necessária a instauração de pedido de providências para manifestação e esclarecimentos do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia”, registra o despacho.

A Corregedoria deu cinco dias para a presidência da Corte estadual prestar informações sobre a ‘natureza das verbas pagas a título de vantagens eventuais e ao fundamento normativo que autorizou referido pagamento por parte do Tribunal’.

Na nota encaminhada à reportagem após o questionamento sobre os pagamentos milionários em fevereiro, o Tribunal de Justiça de Rondônia argumentou que a previsão orçamentária para os pagamentos existe desde o ano passado, o que possibilitou o desembolso em fevereiro.

Os 10 magistrados com os maiores holerites do TJRO em fevereiro Foto: TJRO/Transparência

O site da Transparência da Corte não especifica a quantia exata que foi paga a cada magistrado a título de ATS ou quaisquer outros pagamentos retroativos. O painel de remunerações do CNJ elenca os pagamentos apenas como ‘retroativos’ com o detalhe de que são ‘direitos eventuais’.

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A Corte informou que foi em dezembro de 2022 que o Pleno do Tribunal de Justiça julgou procedente o pagamento do Adicional por Tempo de Serviço a ‘magistrados da ativa, aposentados e pensionistas’. Apontou ainda que o ministro Luís Felipe Salomão, corregedor nacional de Justiça, estabeleceu a legalidade do pagamento no caso de juízes federais, após o Conselho da Justiça Federal restabelecer o ATS. Segundo a Corte, o Conselho Nacional de Justiça ‘reconheceu o direito de magistrados em receber o ATS como vantagem pessoal’.

A reportagem voltou a questionar o Tribunal de Justiça de Rondônia após os questionamentos do CNJ. O espaço está aberto para manifestações.

Fachada do Tribunal de Justiça de Rondônia Foto: CNJ/Reprodução

Como mostrou o Estadão, em meio à polêmica da PEC do Quinquênio dos juízes e procuradores - proposta que avança no Senado com previsão de rombo superior a R$ 40 bilhões -, o Tribunal de Justiça de Rondônia fez pagamentos milionários a seus magistrados no último mês de fevereiro.

Os três juízes que receberam, em valores líquidos, os maiores subsídios são: Glauco Antônio Alves (R$ 1,19 milhão líquido), diretor do foro de 2.ª entrância lotado no Juizado Especial Cível e Criminal da Comarca de Ouro Preto do Oeste, município com 35 mil habitantes situado a 340 quilômetros de Porto Velho; Francisco Borges Ferreira Neto (R$ 1,1 milhão líquido), desembargador da 2.ª Câmara Criminal; e Glodner Luiz Pauletto (1,09 milhão líquido), da 1.ª Câmara Especial.

O desembargador Jorge Luiz dos Santos Leal, da 1.ª Câmara Criminal, recebeu contracheque de R$ 1,64 milhão bruto - com descontos de R$ 589 mil, incluindo ‘abate-teto’, seu holerite ficou em R$ 1,054 milhão líquido.

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A série de desembolsos de grande monta, que incluíram ‘vantagens eventuais’, alçou os juízes de Rondônia ao patamar dos mais bem pagos do País entre os tribunais estaduais. Os dados constam da folha de subsídios do Tribunal de Justiça de Rondônia.

O retorno dos quinquênios, com o aval de Salomão, gerou uma reação em cadeia que não se restringiu ao Judiciário, chegando hoje ao Legislativo. A decisão do corregedor versou sobre os pagamentos a juízes federais, mas levou outros braços da Justiça a reivindicarem o benefício. A Corte de Rondônia, por exemplo, destacou como entendimento do corregedor o de que o pagamento dos quinquênios, retroativamente, ‘encontrava respaldo em julgados do Supremo Tribunal Federal e que as ações coletivas, portanto, tinham efeito vinculativo’.

O bônus entrou na mira do Tribunal de Contas da União, que estimou que o impacto da medida, somente considerando pagamentos a juízes federais – não estaduais, como no caso de Rondônia – implicaria um rombo de R$ 1 bilhão aos cofres públicos. A Corte de Contas chegou a vetar o desembolso, gerando reação de Salomão em defesa da decisão ‘administrativa’.

O caso chegou ao Supremo Tribunal Federal e, em dezembro do ano passado, o ministro Dias Toffoli derrubou a suspensão dos pagamentos determinada pelo TCU. Ainda caberá à Corte máxima dar a palavra final sobre o caso, mas a discussão sobre o tema foi suspensa por um pedido de vista do ministro Gilmar Mendes, em fevereiro. O decano tem até o próximo dia 23 para devolver o processo à pauta do STF.

Enquanto a decisão administrativa de Salomão é debatida no Judiciário, o tema também chegou ao Legislativo, que pode determinar a efetiva volta do penduricalho. A chamada PEC do Quinquênio pode gerar um impacto anual de R$ 40 bilhões, estima o governo federal. O texto foi elaborado pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que diz que o quinquênio é uma forma de valorizar as carreiras do Judiciário e do Ministério Público.

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LEIA A ÍNTEGRA DA NOTA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE RONDÔNIA

Sobre os pagamentos efetuados aos magistrados de Rondônia, identificados pela rubrica " vantagens eventuais”, o Poder Judiciário de Rondônia informa que eles se referem ao ATS - Adicional por Tempo de Serviço, indenização de férias e outros direitos que estavam acumulados, os quais foram devidamente autorizados pelo Conselho Nacional de Justiça e também pelo Tribunal Pleno Administrativo de Rondônia.

A previsão orçamentária para isso existe desde 2023, o que possibilitou o pagamento em fevereiro de 2024. Todas os pagamentos estão devidamente identificados com sua base legal na página da transparência do TJRO.

Portanto, os pagamentos legais realizados em fevereiro não invalidam a responsabilidade fiscal e o compromisso, tanto de juízes quanto de servidores, de contribuírem, com o seu trabalho, não apenas para o engrandecimento do Tribunal, mas sobretudo para o adequado atendimento ao jurisdicionado.

Sobre o ATS

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Em dezembro de 2022, o Pleno do Tribunal de Justiça de Rondônia julgou procedente, a exemplo de outros tribunais, o pagamento do retroativo do Adicional de Tempo de Serviço a magistrados da ativa, aposentados e pensionistas, que teve origem em ação ajuizada pela Associação dos Magistrados Brasileiros, em 2007.

O Conselho da Justiça Federal, que congrega os cinco tribunais regionais federais, também em 2022 (Processo n. 0003402-07.2022.4.90.8000), reestabeleceu o ATS e a matéria foi submetida ao Conselho Nacional de Justiça, que reconheceu o direito dos magistrados em receber o ATS como vantagem pessoal.

No CNJ (Pedido de Providências n. 0007591-71.2022.2.00.0000) o Ministro Luis Felipe Salomão, Corregedor Nacional de Justiça, entendeu que a decisão encontrava respaldo em julgados do Supremo Tribunal Federal, (RE 606.358, ADI 3.854/DF e ADI 4014/DF) e que as ações coletivas, portanto, tinham efeito vinculativo, não podendo o CNJ se opor, e então estabeleceu a legalidade do pagamento.

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