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Opinião|Recursos extraordinários e RI/STF

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convidado
Atualização:
Alexandre Langaro. Foto: ARQUIVO PESSOAL

  1. O Regimento Interno do STF -- RI/STF -- determina:

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Art. 321. O recurso extraordinário para o Tribunal será interposto no prazo estabelecido na lei processual pertinente, com indicação do dispositivo que o autorize, dentre os casos previstos nos arts. 102, III, a, b, c, e 121, § 3º, da Constituição Federal.[1]

  1. Nos meus livros, escritos sobre o tema[2] -- recursos extraordinários, nos campos civil e penal --, disse da necessidade de o recorrente, ao elaborar os recursos extraordinários, observar a norma consubstanciada no art. 321, RI/STF.

  1. Continuo a insistir, no ponto, porque os recursos extraordinários -- abro parêntesis aqui -- têm de conter motivação adequada e, sobretudo, vinculada. Isso porquesão recursos essencialmente técnicos; técnicos e políticos; políticos e constitucionais; constitucionais e ímpares.

  1. Fundamentação ou motivação vinculada[3] -- e, aqui, o parêntesis ainda permanece aberto -- quer dizer, no particular, que o recursante não pode -- e, portanto, nunca, jamais, deve -- 'reiterar' ou 'ratificar' as peças processuais e as teses anteriormente articuladas[4], por ele, nos autos. Sob pena de incidir em erro tosco e atecncia chapada.

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  1. No CPC:

Art. 1.029. O recurso extraordinário e o recurso especial, nos casos previstos na Constituição Federal, serão interpostos perante o presidente ou o vice-presidente do tribunal recorrido, em petições distintas que conterão:

I - a exposição do fato e do direito;

II - a demonstração do cabimento do recurso interposto;

III - as razões do pedido de reforma ou de invalidação da decisão recorrida[5].

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  1. No STJ -- Superior Tribunal de Justiça:

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA - DANOS MORAIS. PLANO DE SAÚDE. CARÊNCIA DE APONTAMENTO CLARO DO DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL QUE TERIA SIDO MACULADO NO ACÓRDÃO ESTADUAL. FUNDAMENTAÇÃO RECURSAL DEFICIENTE. SÚMULA 284/STF. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.

  1. Consoante orientação do Superior Tribunal de Justiça, o conhecimento de recurso especial exige a indicação dos dispositivos de lei federal supostamente violados. Ausente tal requisito, "incide a Súmula n.284/STF" (AgInt no AREsp n. 2.108.361/DF, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 19/9/2022, DJe de 23/9/2022).

  1. É sabido que, "nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o especial é recurso de fundamentação vinculada, não lhe sendo aplicável o brocardo iura novit curia e, portanto, ao relator, por esforço hermenêutico, não cabe extrair da argumentação qual dispositivo teria sido supostamente contrariado a fim de suprir deficiência da fundamentação recursal, cuja responsabilidade é inteiramente do recorrente" (AgInt no AREsp n. 2.025.474/MS, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 10/10/2022, DJe de 17/10/2022).
  2. Agravo interno desprovido.[6]

  1. De modo a se fazer pertinente, no ponto -- agora fechando o parêntesis -- o apelo ao postulado da dialeticidade[7] -- ou postulado da dialeticidade recursal, caso se prefira -- tal e como tem assentado o STJ:

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AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. FUNDAMENTO DA DECISÃO ATACADA NÃO COMBATIDO. PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. REGIME FECHADO. FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. AGRAVO REGIMENTAL PARCIALMENTE CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

  1. Verificado que o agravante se restringiu a reiterar as razões do habeas corpus, sem impugnar os fundamentos da decisão agravada, incide o enunciado sumular n. 182 do STJ.

  1. O princípio da dialeticidade impõe à defesa o ônus de demonstrar o desacerto da decisão agravada. Nos termos da jurisprudência desta Corte Superior, "em obediência ao princípio da dialeticidade, os recursos devem impugnar, de maneira clara, objetiva, específica e pormenorizada todos os fundamentos da decisão contra a qual se insurgem, sob pena de vê-los mantidos" (AgRg no AREsp 1262653/SP, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª T., DJe 30/05/2018).
  2. O regime fechado é o mais adequado dada as peculiaridades do caso concreto, notadamente em razão de a condenação ser superior a 4 anos, o réu haver sido apreendido com grande quantidade de drogas em seu poder - 31,45 kg de maconha.

  1. Agravo regimental parcialmente conhecido e, nessa parte, rejeitado.[8]

  1. [Retomando o tema central]. O Supremo Tribunal Federal -- STF -- tem relativizado o rigor primitivo que envolvia a controvérsia revelada neste estudo.

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  1. No final dos anos noventa até o ano de 2012, como demonstrei[9], a inobservância do preceito inscrito no art. 321, RI/STF, era conducente, em princípio, ao não conhecimento do extraordinário; o mesmo valia, analogicamente, por inafastável imposição sistemática, ao recurso especial[10]. Nesse sentido, por exemplo, dentre outros:

AGRAVO DE INSTRUMENTO -- DESRESPEITO À NORMA INSCRITA NO ART. 321 DO RISTF --  INCOGNOSCIBILIDADE DO APELO EXTREMO - RECURSO IMPROVIDO.

Revela-se insuscetível de conhecimento o recurso extraordinário, sempre que a petição que o veicular não contiver a precisa indicação do dispositivo constitucional autorizador de sua interposição ou, então, não aludir ao preceito da Constituição alegadamente vulnerado pela decisão recorrida. Precedentes[11].

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. NÃO-INDICAÇÃO DA ALÍNEA QUE AUTORIZA SUA INTERPOSIÇÃO. NÃO-CONHECIMENTO.

Interposição do extraordinário sem a precisa indicação do dispositivo constitucional que o autoriza. Não-observância do artigo 321 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal. Agravo regimental não provido[12].

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RECURSO EXTRAORDINÁRIO -- INDICAÇÃO DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL -- FORMALIDADE ESSENCIAL.

A teor do disposto no artigo 321 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, o recorrente deve indicar, na petição de encaminhamento do extraordinário, o permissivo constitucional que o autoriza. A importância do tema de fundo não é de molde a colocar em plano secundário a disciplina da matéria.[13]

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. ACÚMULO DE CARGOS. NECESSIDADE DE REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO CONSTANTE DOS AUTOS. SÚMULA 279 DO STF. DISPOSITIVO AUTORIZADOR DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. INDICAÇÃO. AUSÊNCIA. AGRAVO IMPROVIDO.

I - O acórdão recorrido dirimiu a questão dos autos com base na legislação infraconstitucional aplicável à espécie. Inadmissibilidade do RE, porquanto a ofensa à Constituição, se ocorrente, seria indireta.

II - Matéria que demanda a análise de fatos e provas, o que atrai a incidência da Súmula 279 do STF.

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III - A indicação correta do dispositivo constitucional autorizador do recurso extraordinário - artigo, inciso e alínea - é requisito indispensável ao seu conhecimento, a teor do art. 321 do RISTF e da pacífica jurisprudência do Tribunal.

IV - Agravo regimental improvido.[14]

  1. O Supremo, todavia, aos poucos, passou mitigar a matéria, malgrado o que assentado, no particular, no seu Regimento Interno:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. INDICAÇÃO DA ALÍNEA QUE FUNDAMENTA A INTERPOSIÇÃO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO CONHECIDO.

  1. O Supremo Tribunal Federal tem entendido que, se da leitura das razões recursais for possível identificar a alínea que teria fundamentado a interposição do recurso extraordinário, não se deve aplicar o rigor do art. 321 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal. Precedentes.

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  1. Incabível recurso contra decisão que determina a subida dos autos do recurso extraordinário para melhor exame, excetuando-se a hipótese de má-formação do agravo de instrumento, que não é o caso dos autos.[15]

  1. E mais recentemente:

  1. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CONVERSÃO EM REGIMENTAL. COFINS. LEI Nº 9.718/98 E LC Nº 70/91. ALTERAÇÃO DE ALÍQUOTA. LEI ORDINÁRIA E LEI COMPLEMENTAR. HIERARQUIA DE LEIS EM MATÉRIA TRIBUTÁRIA. AUSÊNCIA.

Agravo regimental não provido.

  1. REGIMENTAL. VÍCIO FORMAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL. ART. 321 DO RISTF. MITIGAÇÃO.

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Se da leitura do recurso extraordinário é possível se inferir seu dispositivo constitucional autorizador, deve-se apreciar a violação ao texto constitucional em homenagem ao princípio da instrumentalidade das formas.

  1. Agravo regimental não provido.[16]

Muito embora os recursos extraordinários não tenham sido interpostos com fundamento na letra d do permissivo constitucional, tenho, para mim, que a questão constitucional está presente, sendo possível a apreciação da controvérsia com apoio na letra a.[17]

  1. Soma-se a isso, ademais, que, o CPC, art. 1.029, § 3º, parece ter aderido à tese da mitigação:

Art. 1.029. O recurso extraordinário e o recurso especial, nos casos previstos na Constituição Federal, serão interpostos perante o presidente ou o vice-presidente do tribunal recorrido, em petições distintas que conterão:

§3º O Supremo Tribunal Federal ou o Superior Tribunal de Justiça poderá desconsiderar vício formal de recurso tempestivo ou determinar sua correção, desde que não o repute grave[18].

  1. O risco, portanto, permanece vivo e, por isso mesmo, tem de ser tecnicamente contornado, pelo recorrente, no extraordinário.

  1. Primeiro, porque, como acima comprovado, as divergências existentes no Supremo entre as suas duas turmas e entre os ministros de uma mesma turma, no ponto, não estão resolvidas -- não há pá de cal sobre a matéria.

  1. Segundo, porque a lei utilizou o verbo poder, a revelar uma faculdade, uma possibilidade -- 'dever' é outra coisa; outra coisa que -- vale destacar -- não consta no texto do CPC. Ao intérprete, decerto, não cabe inserir palavras não contidas no texto e vice-versa.

  1. Terceiro, porque a boa técnica instrumental indica a necessidade de o advogado, ao recorrer extraordinariamente, notadamente porque não há apenas uma única hipótese de cabimento dos recursos de natureza extraordinária, cumprir o ônus processual -- ou o requisito objetivo de admissibilidade recursal, se se preferir -- , a que se refere o art. 321, caput, CPC[19].

  1. O autor deste artigo informa que, ao recorrer extraordinariamente, indica, com precisão -- no mínimo, duas vezes --, na petição recursal extraordinária, o permissivo político-constitucional autorizador da interposição, para os tribunais superiores, dos recursos especial e extraordinário.

*Alexandre Langaro, advogado criminal, recursal, parecerista e palestrante. Autor de livros e artigos jurídicos. Articulista da Escola Superior de Advocacia da Ordem dos Advogados do Brasil - Seção São Paulo e do jornal 'O Estado de S. Paulo' - Estadão. Professor da Escola Superior de Advocacia da Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional do Rio Grande do Sul. Estudou o NY Criminal Procedure Law em Nova York

[1][Redação dada pela Emenda Regimental n. 12, de 12 de dezembro de 2003].

[Alexandre Langaro, videoaula "Como fazer o seu recurso especial ser admitido", Parte 2 (https://www.youtube.com/watch?v=0X4pCnJoI60, 5' em diante)].

[2][Alexandre Langaro, 'Recurso Especial Letras A e C Passo a Passo, IOB Thomson, 2005, pág. 16 e seguintes]

[Alexandre Langaro, 'Dogmática Penal por artigos', 2020, Kindle/Amazon, https://www.amazon.com.br/Dogm%C3%A1tica-Penal-artigos-Alexandre-Langaro-ebook/dp/B08BWSRV84/ref=sr_1_2?__mk_pt_BR=%C3%85M%C3%85%C5%BD].%C3%95%C3%91&keywords=ALEXANDRE+LANGARO&qid=1677953647&s=digital-text&sr=1-2&asin=B08BWSRV84&revisionId=f314bdb2&format=1&depth=1].

[3][Alexandre Langaro, videoaula "Como fazer o seu recurso especial ser admitido", Parte 1 (https://www.youtube.com/watch?v=df9T-Ac7SZg, 7' em diante)].

[4][Alexandre Langaro, videoaula "Como fazer o seu recurso especial ser admitido", Parte 2 (https://www.youtube.com/watch?v=0X4pCnJoI60, 3' em diante)].

[5][No tocante à incompletude do art. 1.029, CPC, ver o artigo anterior, meu, "A DOGMÁTICA DOS RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS", postado, no grupo].

[6][AgInt nos EDcl no AREsp 2175300/BA].

[7][CPC

Art. 932. Incumbe ao relator:

III - não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida.

STF/SÚMULA 284

É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia.

STJ/SÚMULA 182

É inviável o agravo do art. 545 do CPC que deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agravada.

[8][AgRg no HC 783172/ SP, grifos aditados].

[9][Vide, no ponto, notas 2 e 3].

[10][Ver, no particular, a nota 2].

[11][AgRg no AI 357834, DJ 12/4/2002].

[12][RE 367852 AgR, DJ 22/4/2005]

[13][ARE697695 AgR, 23/10/2012].

[14][AI 688875 AgR, DJ 16/12/2008].

[15][AI 682393AgR, 13/6/2008, grifado por conta].

[16][RE 488650 ED, 27/10/2011, sem os destaques no original].

[17][RE 1363013 RG/RJ, DJ 23/5/2022].

[Alexandre Langaro, videoaula "Como fazer o seu recurso especial ser admitido", Parte 2 (https://www.youtube.com/watch?v=0X4pCnJoI60, 5' em diante)].

[18][Grifos aditados].

[19][Alexandre Langaro, videoaula "Como fazer o seu recurso especial ser admitido", Parte 2 (https://www.youtube.com/watch?v=0X4pCnJoI60, 5' em diante)].

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