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Dino defende atuação do STF e diz que não há ditadura do Judiciário

Durante sabatina no Senado, ministro da Justiça indicado para cadeira no Supremo acenou a parlamentares: ‘Tenho a dimensão que o Judiciário não deve criar leis’

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Foto do author Rayssa Motta
Por Pepita Ortega e Rayssa Motta
Atualização:
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado faz sabatina com o ministro da Justiça, Flávio Dino, indicado pelo presidente Lula para uma vaga no Supremo Tribunal Federal, e com o subprocurador Paulo Gonet, indicado para comandar a Procuradoria Geral da República. Foto: WILTON JUNIOR / ESTADÃO

O ministro da Justiça Flávio Dino fez uma enfática defesa do Poder Judiciário durante sua sabatina no Senado nesta quarta, 13, ao rebater ataques do senador Magno Malta (PL-ES) ao Supremo Tribunal Federal. Dino afirmou que, como instituição humana, a Corte não é perfeita, mas não poderia concordar ‘com a ideia de que todos os ministros, todas as ministras que por ali passaram ao longo de décadas e os atuais sejam inimigos da Nação’.

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“Não existe ditadura judicial no Brasil. Tanto é que o senhor (Magno Malta) está aqui como senador falando o que o senhor está falando”, frisou durante a fase de indagações da sabatina. Dino passa pela inquirição dos parlamentares ao lado do subprocurador-geral Paulo Gonet, indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao cargo de procurador-geral da República.

Em outro momento da inquirição, Dino voltou a defender o Poder Judiciário, ressaltando que ‘não existe rigidez na separação dos poderes’ e que ‘há freios e contrapesos’. “Assim como sou contra a ideia ‘todos os políticos são corruptos’, uma ideia nociva ao Brasil, não posso concordar com a ideia de que ‘todos os juízes ameaçam a democracia’, que é uma ‘ditadura judicial’. Realmente eu divirjo profundamente”.

Dino usou seu pronunciamento no início da sabatina para afirmar que não é estranha a presença de políticos nas Supremas Cortes e firmar compromisso com a harmonia entre os Poderes. Além disso, fez acenos ao Congresso, ressaltando seu respeito pela política e afirmando que vai receber os parlamentares ‘sem nenhum medo, receio ou preconceito’.

“Os senhores são delegatários da soberania popular e independente das cores partidárias terão idêntico respeito”, frisou.

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Em outro afago ao parlamento, Dino ponderou: “Tenho a exata dimensão que o Judiciário não deve criar leis. Ele cria direito, ao caso concreto, mas interpretando a lei. O nosso sistema não é tricameral, não existe poder Legislativo em que atue Câmara, Senado e STF ao mesmo tempo. A autonomização do direito não pode se transformar em decisionismos, porque isso traz insegurança”, frisou.

O ministro também defendeu a ‘autocontenção’ e a ‘autorestrição’ dos Poderes durante as indagações de parlamentares. Ressaltou que o próprio STF tem procurado exercer essa autocontenção considerando as mudanças regimentais aprovadas sob a gestão da ministra Rosa Weber, quanto a pedidos de vista e decisões monocráticas.


Se, em meio o ministro da Justiça ressaltou o orgulho pela experiência política, também destacou a necessidade de uma conduta diferente enquanto juiz e, eventualmente, ministro do STF.

Segundo ele, um magistrado não assenta sua legitimidade no carisma pessoal, mas no cumprimento das normas e respeito às tradições. “É daí que o Judiciário pode extrair sua isenção aos olhos da sociedade. Discrição e ponderação são deveres indeclináveis de um magistrado”, pregou.

Dino garantiu ter a compreensão sobre a ética de cada uma das funções. Ele frisou: “Não se pode imaginar o que um juiz foi ou será a partir de sua atuação como político. Seria como examinar um goleiro à luz do comportamento como centroavante “.

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Além disso, exaltou suas passagens pelos três Poderes, ressaltando como tal prática pode o auxiliar se aprovado como ministro do Supremo Tribunal Federal. Segundo ele, a política é o espaço da pluralidade, mas no STF ‘todas as togas são iguais’.

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“Para ser um bom julgador, a prática tem um lugar insubstituível. E eu ofereço a experiência de quem foi juiz federal por 12 anos e teve prática honesta na função. A experiência ensina o valor da imparcialidade, equidistância aos valores em conflito. Da experiência de deputado federal, trago o respeito à função legislativa. Da experiência de governador, trago o respeito àqueles que têm a tarefa de concretizar direitos gerindo escassez e velando pela estabilidade institucional”, frisou.

Presunções

Dino ressaltou como o Brasil tem uma longa linhagem de parlamentares que foram alçados ao STF, destacando que estes usaram os ensinamentos da prática para dirimir conflitos na Corte máxima.

Flávio Dino se antecipou a eventuais críticas à sua indicação pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao ressaltar que todos os chefes do Executivo indicaram ministros de Estado ao STF.

Ex-juiz federal, Dino se declarou o confortável para ser examinado, pelos senadores, nos quesitos constitucionais. Ele adotou uma conduta diferente daquela vista em outras ocasiões no parlamento. “Não vim aqui fazer debate político. Não estou aqui como político”, ressaltou. Dino evitou confrontos, alegando que alguns debates políticos ‘precluiram’ vez que hoje ele é candidato a uma vaga no STF.

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Nessa linha, aproveitou o tempo para falar sobre seus compromissos, entre eles o compromisso ‘indeclinável’ com a harmonia entre os Poderes. “Controvérsias são normais, mas não podem ser paralisadoras do funcionamento das instituições”, ressaltou.

O ministro da Justiça ainda citou três presunções, a começar pela presunção de constitucionalidade das leis. Dino destacou que a inconstitucionalidade das normas é um ‘fato raro’ e só pode ser declarada quando não houver dúvida acima de qualquer critério razoável. “Nas zonas de penumbra há que se prestigiar atividade legislativa”, frisou, acenando aos parlamentares.

Invocou o princípio do paralelismo das formas, assinalando que, se uma lei é aprovada de forma colegiada, ‘o desfazimento não pode se dar por decisões monocráticas a não ser situações claras de perecimento de direito, como risco de guerra, de alguém morrer’.

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado faz sabatina com o ministro da Justiça, Flávio Dino, indicado pelo presidente Lula para uma vaga no Supremo Tribunal Federal, e com o subprocurador Paulo Gonet, indicado para comandar a Procuradoria Geral da República Foto: Wilton Junior/Estadão

A segunda presunção citada por ele foi a de legalidade dos atos administrativos. Dino disse saber como é difícil ‘gerir a escassez’ e defendeu que, apenas excepcionalmente o Judiciário deve infirmar a legalidade de um ato administrativo, levando em consideração as dificuldades e obstáculos reais do gestor.

Dino citou a presunção da inocência, ressaltando o respeito pelo processo legal, o contraditório, contra o punitivismo e linchamentos físicos ou morais.

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Questionamentos

Dino foi questionado sobre o 8 de janeiro, a participação na CMPI dos atos golpistas - na qual protagonizou embates. O ministro da Justiça rebateu críticas sobre a entrega das imagens de câmeras de segurança do Ministério da Justiça ao parlamento e ressaltou como seu comparecimento ao Congresso, oito vezes, para prestar esclarecimentos, é uma ‘prova de respeito às casas parlamentares’.

Além disso, sustentou que não recebeu alertas da Abin sobre a intentona golpista e rebateu alegação de suposta ‘inação’, ressaltando que ‘inicialmente, de modo solitário, agiu no 8 de janeiro tomando as decisões possíveis, embasadas na lei’.

O ministro também foi indagado sobre uma visita ao Complexo da Maré, rechaçando que teria visitado o local sem escolta policial, como circulou na internet.

Outra pergunta direcionada ao ministro da Justiça foi sobre a ideia de voto secreto no STF, como já foi aventado pelo presidente Lula. O ministro ponderou que, talvez o sistema de votação da do Tribunal mereça um ‘temperamento’, incorporando elementos de um sistema usado em outras Cortes constitucionais.

O STF usa o modelo setiatim, no qual a decisão é divulgada por meio do compilado de votos. Já no outro sistema, ao qual Dino fez referência, há apenas um pronunciamento institucional do colegiado.

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As convicções políticas de Dino também foram objeto de indagações. Ele rebateu afirmando que um juiz não pode sobrepor suas convicções individuais em relação aos valores das leis. “O juiz tem que controlar sua subjetividade porque não pode ser um ditador”, anotou.

Dino ainda foi questionado sobre as audiências das quais Luciane Barbosa Farias, conhecida como a ‘dama do tráfico amazonense’, mas se esquivou. “Sobre lendas que foram criadas sobre audiências que não houve e que se tivessem ocorrido não configurariam nenhum tipo penal, não há nada a dizer sobre isso porque não há materialidade”, afirmou.

Aborto e Drogas

O ex-juiz ainda reiterou sua manifestação sobre a criminalização do aborto. Disse que o sistema legal pode ser debatido no Congresso Nacional. “Não imagino que é caso de uma decisão judicial e sim de debate no parlamento”, anotou. Dino lembrou que a ministra Rosa Weber já antecipou seu voto sobre o tema - ‘em desconforme’ com o que ele pensa.

Nessa linha, Dino disse ser contrário a que o Judiciário, ‘unilateralmente’, faça a mudança sobre o tema. “Tenho me manifestado no sentido de que a lei em vigor, sobre alguns casos de aborto, já é suficiente”, anotou.

Já sobre a descriminalização da maconha - tema que gera tensão entre o STF e o Congresso - o ministro anotou que há questões de lei e de aplicação das mesmas. “Fico entristecido que haja dificuldades jurisprudenciais, para observar leis votadas no parlamento, mas que encontram resistência na jurisprudência”, indicou

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“O parlamento tem um papel insubstituível, seu e só seu, de dispor sobre esses assuntos”, ressaltou.

Risos com Moro

O senador Sérgio Moro perguntou sobre a manutenção do perfil de Dino nas redes, após a eventual nomeação. O ex-ministro ressaltou o ‘sacrifício’ que fará em dua vida política: “Gosto muito da atividade política, a vivo intensamente há 17 anos, mas, em merecendo a aprovação, deixo a vida política em todas as dimensões inclusive na redes”.

A avaliação de Dino é a de que é incompatível a discussão de temas políticos, por parte de um ministro do STF, no Twitter. O ex-juiz diz acreditar que temas jurídicos são compatíveis com as redes e brincou: “Preciso de um lugar pra falar do Botafogo e do Sampaio Correa”.

Retorno à política

A senadora Tereza Cristina (PP-MS), ex-ministra do governo Jair Bolsonaro, questionou sobre um eventual retorno de Dino à política. O ex-juiz narrou que, em 2006, tirou a sua toga na última audiência na Justiça federal, mas guardou a peça. “Não tenho muita segurança se nela caberei. Tenho me esforçado em uma dieta rigorosa para essa missão, mas isso significava um sinal que há 17 anos eu imaginava que um dia fosse precisar dela de novo”, brincou.

Segundo Dino, a expectativa não é a mesma para o ‘chapéu’ da política. “Tenho 55 anos e imagino que essa é uma decisão em que esse chapéu ficará na parede como uma boa memória. Mas que jamais voltarei a envergá-lo é o que creio”.

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Mandato

O senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS) indagou Dino sobre uma proposta que ele apresentou em 2019, enquanto deputado, uma proposta para que houvesse mandatos de 11 anos para ministros do STF. O ministro da Justiça disse ainda aderir à ideia, no sentido de que são bem vindos os aprimoramentos acerca do funcionamento das instituições.

De outro lado, Dino pontuou que um mandato para ministro do STF, se instituído, não pode ser muito curto, em razão do principio da segurança. “Se a alteração da Corte se der em pouco tempo, não é possível sedimentar jurisprudência”, alertou.

O ministro ainda destacou que, ‘quem gerou presenças no STF de 20 e 30 anos foi o próprio Congresso’. “E claro que ele pode rever isso, seja pela volta do parâmetro de 70 anos, pra ter um parâmetro mais curto. Mas não tão curto que acabe por negar a jurisprudência, nem tão longo que faça a pessoa ficar 30 anos no STF. Essa é a sugestão que tenho. O debate é legítimo”, anotou.

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