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Seu inquilino está infringindo as regras de quarentena? Você pode despejá-lo

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Por Marcelo Tapai
Atualização:
Marcelo Tapai. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Consta na Lei do Inquilinato nº 8245/91, no artigo 59, o direito do proprietário do imóvel de despejar seu inquilino por falta de pagamento. Inclusive, em março, as ações locatícias subiram 4% sobre fevereiro, de acordo com o Secovi, das quais 88% foram por falta de pagamento e 5,6% de despejo.

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Nem sempre o locador opta por despejar seu inquilino por inadimplência, como podem ver. Mas, há outros motivos para o despejo e, curiosamente, vieram à tona em plena pandemia do coronavírus.

Se por um lado tivemos a criação do Projeto de Lei 872/2020, que determina a suspensão das ações de despejo por falta de pagamento durante a validade do estado de calamidade pública, ajudando o inquilino que foi prejudicado pela crise econômica e sanitária a se recuperar financeiramente sem ter que se preocupar com a perda da moradia por falta de pagamento, de outro estamos vendo crescer o número de processos judiciais para forçar a saída de locatários transgressores.

Na semana passada, chamou a atenção o caso de inquilinos de um condomínio de luxo no Guarujá que foram despejados não por falta de pagamento, mas por descumprirem as regras de isolamento social e combate ao Covid-19 impostas pelo condomínio.

Segundo a ação, os locatários faziam festas dentro do apartamento aglomerando pessoas e frequentavam as áreas de lazer mesmo com os avisos de proibição. Após diversas reclamações de vizinhos e aplicação de multas, o locador decidiu resolver o problema judicialmente para evitar o agravamento da situação.

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Mas a questão que surge é: o condomínio pode impedir o morador de receber pessoas em sua residência e de usar as áreas comuns pelas quais paga a taxa condominial e tem o direito de usufruir? E o proprietário? Tem o direito de despejar seu inquilino que não cumpre com as ordens do condomínio?

A resposta é sim para as duas situações.

Primeiro, é preciso reforçar que está previsto em Lei que os moradores não atrapalhem a convivência com os demais vizinhos, seja por infringir regras de saúde, segurança ou barulho. O artigo 1336, inciso IV do Código Civil dispõe que todo condômino tem o dever de preservar e não prejudicar a saúde, segurança e o sossego dos demais moradores.

Daí já podemos entender que existem limites, sobretudo em meio a uma pandemia. Com a chegada do Covid-19, um evento totalmente inesperado e de força maior, muitos síndicos começaram a tomar providências imediatistas que não agradaram a todos, mas, se foram votadas pela maioria, ainda que por assembleia virtual, as novas imposições são válidas, mesmo que impliquem no direito de ir, vir, permanecer e exercer a propriedade.

Nesse cenário, cabe aos síndicos lançar mão de regras que caminhem em conformidade com o estabelecido pelas autoridades sanitárias. No caso, a Organização Mundial da Saúde e os próprios governantes determinaram que para frear a transmissão do vírus é necessário o isolamento social. Daí veio o slogan "fique em casa". Mas muitas pessoas não entenderam que o ficar em casa é afastado e não significa que pode receber pessoas e confraternizar. O objetivo da medida é justamente evitar o contato entre pessoas.

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Diante da falta de bom senso de muitos moradores, que insistem em encarar a quarentena como férias e se aglomerar, é direito do condomínio interditar as áreas comuns, inclusive vetar aluguel de churrasqueiras e salões de festas, visando o bem-estar e manutenção da saúde de todos.

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Tal proibição criou um novo problema. Moradores começaram a receber amigos e parentes dentro de sua unidade para uma festinha particular, gerando inconformismo nos vizinhos tanto pelo risco de contaminação quanto por barulhos que ultrapassavam o horário estabelecido na lei do silêncio.

Não cabe ao síndico nem à administradora o direito de proibir visitas, mas pode, por exemplo, limitar o número de pessoas por unidade.

No caso do Guarujá, mesmo com medidas contra o Coronavírus, os moradores continuaram fazendo festas, trazendo pessoas de fora que podem ser vetores potenciais da doença, além de incomodar o sossego alheio. Se as multas não resolveram, o proprietário, e não o condomínio, tem o direito de entrar com ação de despejo.

Mas, vale a ressalva. O ato de despejar, neste caso, não é por conta de recair sobre o proprietário o prejuízo de multas eventualmente não pagas pelos inquilinos, e sim porque eles estão colocando em risco a vida e saúde dos demais moradores e infringindo a lei do sossego.

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O despejo, portanto, mesmo durante a pandemia, é passível de discussão nos tribunais, e tem bons fundamentos para isso.

*Marcelo Tapai é advogado especialista em Direito Imobiliário, sócio do escritório Tapai Advogados, professor de Direito e diretor do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (Brasilcon)

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