
Um técnico de enfermagem assediado sexualmente pelo enfermeiro da unidade de saúde onde trabalhava deve receber indenização por danos morais e por sua demissão discriminatória, após denunciar os fatos a superiores. Por maioria de votos, os magistrados da 6ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) reformaram a sentença do juízo da 9ª Vara do Trabalho de Porto Alegre.
A reparação por danos morais foi fixada em R$ 10 mil. O pagamento em dobro das remunerações devidas desde a demissão até a data da publicação da decisão de segundo grau foi determinado com base na Lei 9.028/95, que proíbe condutas discriminatórias.
Segundo a ação, a despedida imotivada do trabalhador ocorreu nove dias após ele ter denunciado os constrangimentos pelos quais vinha passando em função das ‘investidas’ de cunho sexual reiteradas do enfermeiro.
O superior o trancava no laboratório e insistia em perguntas sobre um possível relacionamento, mesmo diante das negativas do trabalhador que informou ter namorado.
Ante as insistentes tentativas, o técnico relatou os fatos à gerente do posto. Também registrou um boletim de ocorrência e fez denúncia ao Conselho Regional de Enfermagem (Coren).
Ao buscar orientações no setor de Recursos Humanos, ele foi orientado a ‘tocar o assunto sozinho’. A superior apenas transferiu o enfermeiro de setor. O técnico foi despedido sob a alegação de que não estava mais adequado às normas da empresa.
O profissional juntou ao processo uma ata elaborada no próprio posto com a descrição dos fatos, mensagens enviadas pelo enfermeiro e uma gravação na qual uma colega dizia ter presenciado tudo. A mulher afirmou que tinha medo de testemunhar em juízo e sofrer retaliações ou mesmo ser despedida.
Na primeira instância, o juiz entendeu que as provas não eram suficientes à comprovação do assédio. Ao julgar o recurso do empregado, a relatora do acórdão, desembargadora Simone Maria Nunes, manteve esse entendimento.
Em voto divergente, a desembargadora Beatriz Renck ressaltou que o Tribunal Superior do Trabalho, inspirado no Protocolo para Julgamento sob a Perspectiva de Gênero, do Conselho Nacional de Justiça, criou um estudo acerca do enfoque a ser adotado em casos como esse.
A recomendação é de que não apenas casos que envolvam mulheres devam ser julgados a partir do Protocolo, mas todos que incluam agentes que enfrentam alguma forma de assédio ou discriminação pela sua condição pessoal.
Para a magistrada, não se pode ignorar que os assédios no trabalho ‘geralmente são praticados em ambientes fechados e fora do olhar público, gerando no caso concreto dificuldades probatórias’.
“Considerando que na maioria das situações práticas existem testemunhas que trabalham diretamente com o assediador e, por receio de sofrer retaliações ou mesmo de serem despedidas, não querem prestar depoimento, é relevante atribuir um peso diferenciado à palavra da vítima da violência moral ou sexual no ambiente de trabalho”, afirmou Beatriz.
O desembargador Fernando Luiz de Moura Cassal acompanhou o voto de Beatriz. Não houve recurso da decisão.