Apesar do nome, o horário eleitoral, em rádios e televisões, nada tem de gratuito. Segundo previsão feita pela ONG Contas Abertas, por meio de uma estimativa da Receita Federal, com a isenção de impostos dada às emissoras prevista para 2018, os cofres públicos deixarão de receber cerca de R$ 1 bilhão. A dedução fiscal é equivalente a cerca de 80% do que seria obtido pelas rádios e TVs com a venda publicitária do espaço. O valor total representa, em média, R$ 6,9 para cada eleitor, tomando por base o número de pessoas que podiam votar no ano passado, de 144 milhões de eleitores.
Segundo o economista Gil Castello Branco, fundador do Contas Abertas, o nome "gratuito" confunde o eleitor, que muitas vezes não sabe que o espaço não tem custos para o partido ou para o candidato, não para ele próprio. "O nome não é o mais adequado. O cidadão não tem claramente a sensação de que isso, de certa forma, está implicando em menos recursos para os cofres públicos. Com o governo numa situação fiscal dificílima, é importante que fique claro que são recursos públicos que deixam de entrar", diz.
Enquanto o polêmico fundo eleitoral com dinheiro público não ganha consenso no Congresso, outros projetos para financiar as eleições começam a voltar à discussão. Um deles, de autoria do senador Ronaldo Caiado (DEM-GO), propõe que o horário eleitoral gratuito seja extinto e que o recurso poupado da renúncia fiscal mantenha o fundo para as campanhas. Apenas emissoras públicas seriam obrigadas a manter o horário eleitoral.
Embora não defenda diretamente o fim do horário eleitoral, Castello Branco sugere um melhor uso desses recursos públicos. "Os brasileiros ficam até chocados de ver, muitas vezes no horário nobre, a mesma propaganda repetida, literalmente idêntica, três, quatro vezes. É o uso abusivo desse horário eleitoral", diz o economista.
O diretor geral da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV (Abert), Luis Roberto Antonik, nega que a isenção fiscal seja um benefício às emissoras. "Nós perdemos muito com o horário eleitoral. A isenção compensa apenas parte do que a gente perde", afirma. Segundo Antonik, a audiência média das TVs abertas é de 47% antes do horário eleitoral e cai para 34% durante as propagandas. Com o fim das inserções, a audiência não volta ao que era antes e fica estagnada próxima aos 41%.
Ele diz, ainda, que a associação é favorável ao fim do horário político, como sugerem as propostas no Congresso. "Nós passaríamos a ter uma vida normal", afirma. Antonik justifica, ainda, que o abatimento das emissoras pode ser menor que os 80% que estão em lei - segundo ele, a Receita Federal pode calcular, ainda, um desconto nas tabelas de preço dadas às empresas que compram espaço publicitário.
ORIGEM DO HORÁRIO ELEITORAL
As campanhas no rádio e na televisão foram criadas por meio de uma lei de 1962, como explica o verbete da Fundação Getúlio Vargas (FGV) sobre horário gratuito de propaganda eleitoral. Pela legislação da época, nos 60 dias anteriores às 48 horas das eleições, as emissoras eram obrigadas a reservar duas horas de sua programação para as propagandas, respeitando um critério de rotatividade dos partidos. Na época, a propaganda paga só ficou proibida a 30 dias antes do pleito - ou seja, um candidato também poderia pagar para veicular sua propaganda.
LEI FALCÃO
Sob a orientação do então ministro da Justiça, Armando Falcão, foi criada a Lei Falcão, em 1976, que restringiu a propaganda eleitoral à apresentação do currículo do candidato e uma foto. Em blocos de cinco minutos, na TV e no rádio, os candidatos se apresentavam com nome, partido, número e foto. O formato, criado durante a ditadura militar, tinha como objetivo evitar a comunicação entre candidato e eleitor.
Em 15 de setembro de 1989 entrava no ar novamente a propaganda eleitoral gratuita para as eleições presidenciais. Como mostrou o Acervo Estadão, os programas deste ano chegaram a ser mais livres que os atuais.
COMO FUNCIONA HOJE
O horário eleitoral sofreu algumas modificações após a minireforma eleitoral, em 2015. O período da propaganda, por exemplo, foi reduzido de 45 para 35 dias antes do pleito, e já passou a valer nas eleições municipais de 2016.
A diferença no tempo de televisão de cada candidato está diretamente ligada à representação dos partidos na Câmara dos Deputados. Por isso, inclusive, as coligações influenciam diretamente no tempo de cada partido. A divisão ocorre da seguinte forma: 90% distribuídos proporcionalmente ao número de representantes que o partido tenha na Câmara dos Deputados e 10% igualitariamente.
Às vésperas da eleição, a Justiça Eleitoral faz um sorteio para definir a ordem de veiculação da propaganda de cada partido ou coligação. A cada dia, a propaganda veiculada por último no dia anterior será a primeira.
No ano passado, para as eleições municipais, a propaganda foi feita de segunda a sábado das 7h às 7h 10 e das 12h às 12h10 no rádio; e das 13h às 13h10 e das 20h30 às 20h40 para a televisão. Além disso, de segunda a domingo foram distribuídos um total de 70 minutos diários, em inserções de 30 e de 60 segundos, ao longo da programação entre 05h e 00h - sendo 60% para prefeito e 40% para vereador.
Leia na íntegra a resolução do TSE.
PROPOSTAS EM DISCUSSÃO
No Senado, há pelo menos outras três propostas em discussão. O texto de Caiado sugere que o eleitor possa escolher uma parcela proporcional para destinar ao partido ou candidato de sua preferência. Segundo enquete feita pelo site da Casa, 607 internautas responderam ser a favor da matéria, enquanto 171 foram contrários.
Já o líder da bancada do PSDB, Paulo Bauer (SC), propõe incorporar à reforma política um projeto de sua autoria que prevê o fim do horário eleitoral em rádio e TV. A medida teria como objetivo baratear as campanhas e usar o valor da dedução fiscal das emissoras para financiar o fundo. O tucano critica, no texto, o que chama de "marketagem" da imagem política.
O mesmo tema é tratado pelo senador Cristovam Buarque (PPS-DF), que também fala sobre o "excesso de marketing eleitoral" e propõe o fim das propagandas eleitorais na TV e no rádio. Segundo ele, isso teria "contribuído para distorções e manipulações do processo eleitoral".