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Olavismo será chave para compreender futuro da extrema-direita; leia análise

Olavo morreu, mas suas ideias permanecem; resta saber se o legado sobreviverá à ganância de seus herdeiros

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Por Guilherme Casarões
Atualização:

Morreu o homem que resgatou a direita do ostracismo, a radicalizou e a popularizou – tudo isso em poucos anos. Até meados da década passada, Olavo de Carvalho era um ideólogo de nicho. Com seus cursos de filosofia, pregava para algumas centenas de pessoas, potencializado pela inserção precoce no mundo digital e nas redes sociais.

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O terremoto político iniciado em 2013, que levou à ascensão de vários movimentos de direita, coincidiu com a chegada de Olavo ao mainstream editorial. Em pouco tempo, o sucesso de seus livros começou a repercutir nas manifestações antipetistas, na forma de cartazes com o escrito “Olavo tem razão”. Olavo, de fato, tinha razão numa coisa. Havia um espaço enorme para o pensamento conservador no mercado das ideias políticas.

Na realidade brasileira, que o ideólogo alegava ser dominada pelo “marxismo cultural”, o fortalecimento do conservadorismo exigiria a destruição total da esquerda. A saída, portanto, era a articulação de um projeto reacionário, uma espécie de jacobinismo de direita. Esse movimento demandava três ingredientes: uma narrativa conspiracionista, uma legião de seguidores fiéis e uma liderança populista que pudesse colocar o projeto em prática.

Olavo de Carvalho faleceu na noite de segunda-feira, 24, nos Estados Unidos Foto: TV Escola

As teorias conspiratórias foram ganhando força após 2013. Misturando perenialismo de René Guénon, variações católicas e militares do anticomunismo e a paranoia supremacista da alt-right americana, Olavo foi capaz de criar uma narrativa que acolheu e deu sentido a um número crescente de críticos ao Partido dos Trabalhadores.

Uma vez tornadas populares, as teses de Olavo trouxeram milhares de alunos, alguns dos quais passaram a compor uma suposta “nova elite intelectual” tupiniquim. Para certos influenciadores digitais e políticos, ser aluno do Olavo era a maior das virtudes, além de receita certeira de engajamento – mesmo que isso exigisse subscrever a ideias estapafúrdias, equivocadas e muitas vezes perigosas.

O ápice do olavismo deu-se em 2018, diante da possibilidade real da vitória de Jair Bolsonaro à presidência. As concepções tortas e a vocação populista do ex-capitão, mas sobretudo seu ímpeto destrutivo, casavam-se bem com o projeto reacionário de Olavo. Mais que isso: uma vez no poder, Bolsonaro poderia transformar o ideólogo em guru e seus seguidores em peças-chave do desmantelamento institucional do país. E assim o fez.

Mas a combinação entre incompetência técnica, fundamentalismo ideológico e desavenças políticas logo tornou Olavo e seu grupo um fardo para Bolsonaro. Para chegar ao fim do mandato, o governo trocou a extrema direita jacobina pela direita fisiológica, ainda que permaneça o legado de destruição em áreas tão diversas como saúde, educação e relações exteriores.

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Olavo morreu, mas suas ideias permanecem – e serão chave para compreendermos o futuro da extrema direita, de Bolsonaro e da política nacional. No momento, elas estão à espera de alguém que confira alguma unidade ao movimento forjado a partir de 2013 e que vem rachando sob o peso das disputas de poder. Resta saber se o legado do olavismo sobreviverá à ganância de seus herdeiros.

*GUILHERME CASARÕES É PROFESSOR DA FGV-EAESP

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