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Padres ultraconservadores reforçam mobilização de Bolsonaro para ato de 7 de Setembro

Com dois milhões de seguidores, o padre Paulo Ricardo convocou fiéis para uma novena pela “natividade do Brasil”

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Foto do author Vinícius Valfré
Por Vinícius Valfré
Atualização:

BRASÍLIA - A estratégia do presidente Jair Bolsonaro (PL) para atrair público nos atos deste 7 de Setembro ganhou o reforço de padres e grupos ultraconservadores da Igreja Católica. Às vésperas do feriado, o candidato à reeleição e os religiosos atuaram de forma quase sincronizada. Nos sermões alinhados aos discursos de Bolsonaro, os sacerdotes chegaram a explorar notícias sobre a situação dos cristãos na Nicarágua para sugerir risco de fechamento dos templos na eventual vitória do petista Luiz Inácio Lula da Silva.

No início da tarde desta terça-feira, 6, Bolsonaro participou de missa na Paróquia São Miguel Arcanjo e Santo Expedito, frequentada por militares, na Asa Norte, em Brasília. Foi recebido pelos fiéis aos gritos de “mito” e abençoado pelo padre Jean Marcos. “O presidente tem uma missão maior para cumprir”, afirmou o religioso. Por sua vez, Bolsonaro disse que pedia a Deus para o “povo” não experimentar as “dores” do comunismo.

Jair Messias Bolsonaro (PL) acompanhado da primeira dama, Michelle Bolsonaro, do candidato a vice-presidente, General Walter Braga Netto, do ministro da defesa, Paulo Sérgio Nogueira e do senador, Flávio Bolsonaro, assistem a missa na Paróquia São Miguel Arcanjo e Santo Expedito, em Brasília. Foto: Wilton Junior Foto: Wilton Junior

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Sermões alinhados ao discurso de Bolsonaro predominaram nas redes de apoio ao presidente. Com dois milhões de seguidores na internet, o padre Paulo Ricardo, do Mato Grosso, convocou fiéis para uma novena pela “natividade do Brasil”. “As pessoas perdem suas liberdade numa concentração de poder, porque este pessoal que concentra poder está prometendo ‘um futuro melhor, liberté, égalité, fraternité’”, disse em vídeo.

Apoiadores de Bolsonaro usaram a declaração de Paulo Ricardo em vídeos com imagens de manifestações de rua e trechos do Hino da Independência. Referência no catolicismo ultraconservador, Paulo Ricardo foi professor no seminário de Allan dos Santos, blogueiro que tem mandado de prisão em aberto por ameaças a ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e vive foragido nos Estados Unidos.

Nas últimas semanas, as referências ao padre se intensificaram nas redes de Bolsonaro com a notícia falsa de que o religioso tinha sido censurado pelo STF. Na verdade, a Corte determinou, em março, que grandes canais de Telegram sejam monitorados pela plataforma para combater a desinformação. A decisão abrangeu o canal do padre. O episódio foi usado, sem contexto, pelo perfil oficial do Gettr Brasil, uma rede social norte-americana de extrema-direita, em uma publicação na sexta-feira.

Um dos temas que o padre aborda é a Nicarágua, onde religiosos estão sendo alvo do governo de Daniel Ortega. “A perseguição à Igreja na Nicarágua acendeu um alerta em muitos católicos no Brasil”, disse o religioso nas suas redes. Militantes do presidente Jair Bolsonaro usam a situação do país da América Central para dizer que Lula poderia fazer o mesmo, caso seja eleito. A Justiça Eleitoral mandou o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) apagar publicações que faziam a associação.

Os Arautos do Evangelho, uma associação católica ultraconservadora, também estimula o apoio a Bolsonaro. Investigado por assédio e agressões físicas contra jovens internos, o grupo é ligado ao Instituto Plínio Corrêa de Oliveira, também extremista. A deputada Carla Zambelli (PL-SP) tem propagado sermões da seita que sugerem um aspecto divino nas escolhas pró-Bolsonaro. “Sabemos que as escolhas devem ser feitas em função de Deus, escolher entre o bem e o mal, a verdade e o erro. E jamais ficarmos indiferentes”, disse a parlamentar ao padre Alex Brito, em um vídeo compartilhado por ela no domingo, 4. “Obrigada pelos ensinamentos, padre”, afirmou.

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No sábado, 3, Zambelli publicou um vídeo do padre Francisco de Assis de Souza, de Sergipe, criticando Lula. “Seria interessante esse senhor que gosta de tomar 51 e que dá de político lembrar que ele só fez carreira política porque teve padre e bispo que abriram a porta para esse infeliz. E desde que chegou ao poder ele cospe no prato que comeu”, disse.

Outros grupos ultraconservadores católicos também estão dedicados a estimular os atos de Bolsonaro neste 7 de setembro. O Centro Dom Bosco (CDB), que busca se contrapor à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), tem servido à militância do presidente com conteúdo a favor dos atos. A entidade é influenciada por ideias do escritor Olavo de Carvalho e de dom Bertrand de Orleans e Bragança, monarquista e ultraconservador.

Uma das estratégias do CDB para o 7 de setembro foi massificar um vídeo no qual a atriz Cássia Kiss, que recentemente anunciou sua conversão ao catolicismo, convida para orações na madrugada. “Desejo convidá-lo para fazer uma vigília comigo, a partir das 4h, para que Nossa Senhora Conceição Aparecida mais uma vez tome as rédeas da nossa história e nos livre dos males que ameaçam o Brasil”, diz a artista.

Um dos principais nomes do Centro Dom Bosco é o youtuber bolsonarista Bernardo Kuster. “É uma oportunidade única que o povo brasileiro tem para celebrar o processo de independência que completa duzentos anos, reafirmando sua posição em defesa das nossas liberdades que são, todo dia, tolhidas por alguns membros do STF”, disse ao Estadão.

Contraponto

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A ala predominante da Igreja Católica reagiu aos acenos de sacerdotes e religiosos a atos antidemocráticos. Nesta terça, 450 padres divulgaram uma carta em que dão dez motivos para que os católicos reflitam sobre Jair Bolsonaro. “Em 2018 a população, enganada por fake news, desmotivada por crises econômicas, escândalos de corrupção e insuflada por discursos de ódio acabou por eleger para a presidência da República Jair Messias Bolsonaro. Uma catástrofe anunciada!”, escreveram. “Hoje, distante quatro anos daquele momento, nós Padres, conscientes do nosso dever de pastores do povo de Deus, queremos alertar para o perigo de repetirmos o mesmo erro.”

A CNBB também tornou pública uma posição. O presidente da entidade e arcebispo de Belo Horizonte, dom Walmor Oliveira de Azevedo, frisou que comemorar a independência exige não tolerar ataques à democracia e às instituições que possibilitam a participação popular nas decisões. “O Brasil precisa urgentemente trilhar novos caminhos para superar problemas que estão na contramão da independência. Indicadores mostram que a fome avançou mais rapidamente no Brasil nos últimos dois anos. Fica a pergunta: existe independência num país com mais de 32 milhões de pessoas aprisionadas na fome?”, questionou.

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