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‘Não é papel de comandante militar opinar sobre política’, diz presidente do PT

Parlamentares criticam nota dos comandantes da Marinha, Exército e Aeronáutica; já aliados do presidente Jair Bolsonaro reclamam de falta de clareza na posição do Ministério da Defesa

Foto do author Davi Medeiros
Foto do author Lauriberto Pompeu
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Por Davi Medeiros , Lauriberto Pompeu e Weslley Galzo
Atualização:

BRASÍLIA - A nota divulgada nesta sexta-feira, 11, pelas Forças Armadas e antecipada pelo Estadão causou mal estar nos partidos políticos de esquerda e centro. A reação mais dura foi da presidente do PT, Gleisi Hoffmann. Em mensagem no Twitter, ela afirmou que os chefes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica não devem se envolver em política.

“Não é papel dos comandantes militares opinar sobre o processo político, muito menos sobre a atuação das instituições republicanas”, afirmou. A petista ainda declarou que a liberdade de manifestação “não se aplica a atos contra a democracia, que devem ser tratados pelo nome: golpismo”. Muitos dos manifestantes têm pedido intervenção militar para que o petista Luiz Inácio Lula da Silva não assuma a Presidência após a vitória no segundo turno.

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Ao falar depois da reunião do conselho político no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), onde está a equipe de transição, a petista disse que o endosso aos protestos de apoio ao presidente Jair Bolsonaro e de caráter antidemocrático não acontece em todo o meio militar. “Essa é uma leitura clara. Nós temos de defender a Constituição e a democracia, mas vejo isso como um fato desses comandantes, desse governo, e um fato que tende a ser isolado. Não entendo que a totalidade das Forças Armadas pense assim”, completou.

O presidente do União Brasil, Luciano Bivar, também destacou que a política não deveria ser um assunto das Forças Armadas, mas ressalvou que, no momento atual, a manifestação delas é justificável. “Embora não caiba às Forças Armadas se manifestarem sobre um problema de tumulto público, pelo transe que estamos passando, sempre é boa mensagem sobre o sentimento institucional dos militares”, disse ao Estadão.

Um ex-ministro da Defesa, sob a condição de anonimato, avaliou que o texto foi feito para responder às pressões de Bolsonaro, algo que não é bom, mas também não significa um indício de ruptura democrática. O ex-ministro também afirmou que o texto é uma “nota política” e que isso “não é atribuição das forças”. Há uma avaliação de que Lula poderia agir para evitar essa instabilidade ao acelerar a escolha de quem será o ministro da Defesa e os comandantes das três forças militares, pois isso deixaria mais claro quais seriam os planos do presidente eleito para a área e, em vez de se prenderem às discussões de interesse de Bolsonaro, “jogaria para o futuro”.

Entre oficiais, conforme apurou a reportagem, a leitura foi a de que o objetivo da nota era deixar bem clara a separação entre as instituições militares em si e o governo Bolsonaro, tanto que o ministro da Defesa, chefe político dos militares, não é signatário do texto.

Ministério da Defesa e o TSE

O comunicado das três Forças Armadas foi apresentado na mesma semana em que o Ministério da Defesa enviou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) relatório que não aponta fraude nas eleições, mas pede investigação técnica urgente nas urnas eletrônicas. Bolsonaro já colocou em dúvida, sem provas e diversas vezes, a legitimidade do sistema eletrônico de votação e acusou ministros do TSE e do Supremo Tribunal Federal (STF) de o prejudicarem.

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A divulgação da nota desta sexta-feira, antecipada pelo Estadão, acontece um dia depois de Lula ter dito que Bolsonaro “humilha” as Forças Armadas. “Eu não sei se o presidente está doente, mas ele tem a obrigação de vir à televisão e pedir desculpa à sociedade brasileira e pedir desculpa por ter usado as Forças Armadas, que é uma instituição séria, que é uma garantia para o povo brasileiro contra possíveis inimigos externos, fosse humilhada apresentando um relatório que não diz nada, absolutamente nada daquilo que ele durante tanto tempo acusou”, declarou o petista ontem, 10. Interlocutores do meio militar também justificam o texto divulgado ao dizerem que há bastante “ansiedade com o governo Lula e o que ele vai representar para as Forças”.

Nota das Forças Armadas foi assinada pelos comandantes da Marinha, Exército e Aeronáutica, respectivamente, Almir Garnier Santos, Marco Antônio Freire Gomes e Carlos de Almeida Baptista Junior.  Foto: MD, MARCOS CORRÊA/PR E FAB

Já aliados do presidente Jair Bolsonaro viram dubiedade nas manifestações dos militares. Em vídeo publicado nesta sexta-feira, 11, o deputado federal Marco Feliciano (PL) pediu que a Defesa “não fique em cima do muro” e “não brinque com os sentimentos” dos manifestantes pró-Bolsonaro, que nutrem esperanças sobre uma eventual confirmação de fraude.

“Por misericórdia, sejam mais explícitos em suas notas. (Peço) que o ministro da Defesa venha a público e diga com todas as letras o que encontraram nessas benditas urnas eletrônicas. Por favor, não prolonguem mais essa agonia, não brinquem com os sentimentos do povo brasileiro, que é ordeiro e patriota e está nas ruas protestando”, afirmou o deputado.

Feliciano disse, ainda, que a investigação sugerida pela pasta ao TSE deve ter um prazo para começar, e que deve ser estabelecido se isso ocorrerá antes ou depois da posse de Lula. Contudo, o presidente da Corte, ministro Alexandre de Moraes, afirmou nesta semana que esse assunto “já está encerrado faz tempo”, ao ser questionado sobre a investigação.

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A deputada estadual Janaina Paschoal (PRTB-SP), que se afastou do presidente Bolsonaro durante a campanha eleitoral deste ano, afirmou ao Estadão que considera “irresponsável” o que ela chamou de “mensagens cifradas” da Defesa.

“Penso ser uma irresponsabilidade o Ministério da Defesa adotar uma postura ambígua. Se houve alguma irregularidade nesta eleição de 2022, que tenham coragem de apontar com clareza. Se não houve, que cessem as mensagens cifradas, que findam estimulando falsas esperanças na população infeliz com o resultado”, disse.

O senador Omar Aziz (PSD-AM) criticou o fato de a nota das Forças Armadas divulgada nesta sexta-feira, 11, ter, segundo ele, minimizado o caráter inconstitucional das manifestações que pedem intervenção militar. “Isso (os atos) é balbúrdia, essas pessoas têm de ser punidas por pedir intervenção, isso é inconstitucional, é crime, e aqueles que aceitam isso também estão cometendo esse crime, estão sendo coniventes”, afirmou, em entrevista ao portal UOL.

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O deputado federal General Girão (PL-RN) elogiou a nota das Forças Armadas e afirmou que cabe à instituição “restabelecer a ordem e a harmonia entre os poderes”. “Mesmo diante do momento de exceção que vivemos no Brasil, onde alguns ministros estão atropelando a Constituição e nossas garantias, a censura e o cerceamento da livre manifestação não deverão ser tolerados”, escreveu.

A deputada federal Bia Kicis (PL-DF) cobrou uma ação mais enfática do Congresso Nacional. “A nós, parlamentares, cabe agirmos com firmeza e não nos acovardarmos diante dos atos arbitrários de quem quer que seja.”

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