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Uma avaliação dos nossos riscos

Opinião|Governar ficou mais difícil pois tipo de semipresidencialismo praticado no Brasil acirra conflitos

Qualquer tipo de decisão, não importa a urgência dela, é submetida a um tortuoso processo de negociações que ignora o mérito de políticas públicas

Foto do author William Waack
Atualização:

Salvo uma nova Constituição e um novo sistema de governo o atual semipresidencialismo é um caminho sem volta. Lula comete um autoengano em centrar o foco da questão política em indivíduos como o deputado Arthur Lira, e sair a campo buscando um candidato próprio à sucessão do presidente da Câmara, que ocorre daqui um ano.

Na prática, esse semipresidencialismo (ainda por cima com dois primeiros-ministros) está produzindo um “semigoverno”. Qualquer tipo de decisão, não importa a urgência dela, é submetida a um tortuoso processo de negociações que, por exemplo, acaba ignorando o mérito de políticas públicas (é o caso da oneração/desoneração de folhas de pagamento).

Fortalecimento dos comandos do Legislativo têm enfraquecido capacidade do Executivo de negociar rumos do país Foto: Wilton Junior/Estadão

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De saída já seria difícil um presidente que representa “a esquerda” lidar com um Legislativo “de centro-direita” (é difícil enquadrar as correntes políticas brasileiras nos padrões convencionais). Nessa empreitada, Lula tem empregado as ferramentas que ele conhece e julga ter utilizado bem uns vinte anos atrás, mas dá sinais de não ter entendido como hoje não mais funcionam (da perspectiva do Executivo).

Isto ocorre por dois fatores, sendo o primeiro a inédita acumulação de poderes do Legislativo, processo que se acelera há 10 anos. O segundo é um enorme grau de resistência social à figura do presidente e seu partido, outro longo processo que se consolida hoje em fortes divisões regionais, atravessando classes sociais e até com colorações religiosas. Fora a calcificação da polarização política, que reflete antagonismo ideológico poucas vezes registrado na história do País.

Os setores organizados que lutam por seus interesses específicos acabam dando grande força ao semipresidencialismo. Uma das demonstrações mais evidentes disso é a atuação das diversas frentes parlamentares, que hoje ocupam o lugar das antigas bancadas ou blocos partidários, dos quais menos se ouve falar cada vez menos.

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É difícil imaginar que essa “redistribuição” de influência política, aumentada pela pulverização das emendas parlamentares, se altere fundamentalmente com uma nova figura no comando da Câmara ou do Senado. Sim, ambos têm um grande poder de pautar matérias, mas são obrigados também a se mover num cenário difuso de lideranças que se articulam em torno de questões específicas, e não tanto em função da sigla partidária (e seus caciques).

Tudo isso ocorre quando Lula, segundo interlocutores, dá repetidos sinais de profunda impaciência e irritação com as minúcias de governar – algo que se tornou muito mais complicado. Mas a culpa não é de algum indivíduo.

Opinião por William Waack

Jornalista e apresentador do programa WW, da CNN

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