Incontinência urinária após cirurgia de próstata: Fisioterapia pélvica melhora 85% dos casos

A incontinência urinária e a disfunção erétil são comuns em homens que passaram por cirurgia de retirada da próstata, mas uma série de exercícios pode ajudar a reverter esses problemas

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Por Giovanna Castro
Atualização:

Algumas das maiores queixas de pacientes de câncer de próstata que passam pela prostatectomia –cirurgia em que é feita a remoção da glândula da próstata e das estruturas ao redor dela, como as vesículas seminais – são a incontinência urinária e a disfunção erétil (impotência). No entanto, esses efeitos colaterais comuns do procedimento podem ser melhorados com a fisioterapia pélvica, que ajuda a fortalecer a musculatura íntima.

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Segundo estudo publicado na revista científica International Journal of Environmental Research and Public Health em 2021, a fisioterapia pélvica provoca alguma melhora em 85% dos quadros de incontinência urinária pós cirurgia de próstata. Já os estudos sobre melhora dos quadros de impotência ainda estão em fase inicial, mas alguns pacientes já relatam a diferença.

João Alberto* (nome fictício), de 73 anos, passou pela prostatectomia em outubro de 2022 e teve os dois efeitos colaterais. Cerca de duas semanas depois do procedimento, iniciou a fisioterapia pélvica e desde então tem visto resultados positivos, principalmente em relação à incontinência urinária.

“A fisioterapia é um processo lento, mas vai melhorando ao longo do tempo”, diz. Ele conta ter feito a cirurgia em outubro, mas no início do ano já estava bem. “No começo, eu tinha de usar fralda geriátrica direto. Com a evolução, fui fazendo testes, ficando alguns períodos sem e hoje eu já estou completamente sem fralda.”

Já em relação à dificuldade de ereção, João diz que entende que é um problema que demanda mais tempo de fisioterapia, mas já começou a perceber a diferença. “É preciso ter paciência e, como sempre digo, melhor alguns meses sem ereção do que perder a vida”, diz.

"Os hábitos do paciente são revistos para que ele evite comportamentos que podem piorar o quadro", diz a fisioterapeuta Dalila Duarte. Foto: Felipe Rau/Estadão

Impacto da cirurgia

O câncer de próstata é o tipo mais comum de câncer entre a população masculina e representa 29% dos diagnósticos da doença no País, segundo o Instituto Nacional de Câncer (Inca). Entre os diagnosticados, cerca de 49% dos pacientes passam pela cirurgia de prostatectomia.

“Quando o paciente está em um estágio inicial da doença, sem a presença de metástases, nós indicamos a cirurgia. Se não, geralmente é preciso fazer a quimioterapia primeiro”, diz Bruno Benigno, urologista do Centro de Oncologia e Urologia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz.

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Segundo o especialista, trata-se de uma cirurgia bastante delicada e que exige precisão nos movimentos, já que a próstata fica em uma posição de difícil alcance e está “colada” à uretra e aos nervos responsáveis pela ereção – o que explica os efeitos colaterais.

“Hoje, com a cirurgia robótica, que garante maior precisão de movimentos, houve uma diminuição de quadros de complicações pós cirurgia de próstata no Brasil. Menos pessoas sofrem com incontinência urinária severa e impotência. Porém, no SUS, a grande maioria das cirurgias ainda são abertas (feitas manualmente pelo médico)”, diz. Na maioria dos casos, tanto a disfunção erétil quanto a incontinência urinária são passageiras, afirma o médico.

A fisioterapia pélvica para pacientes que passaram pela cirurgia de próstata é ofertada pelo Sistema Único de Saúde (SUS). No sistema particular, existe também a opção de fazer uma cirurgia capaz de reverter alguns quadros de incontinência, inclusive com o uso de próteses.

Para a disfunção erétil, há um medicamento injetável que provoca a ereção, além da fisioterapia, que utiliza uma espécie de bomba para provocar a rigidez do pênis. “Medicamentos orais, como o Viagra, não funcionam nesse caso, pois eles atingem o pênis por meio das terminações nervosas, ou seja, se elas foram comprometidas pela cirurgia, o remédio não fará efeito”, diz Benigno.

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Recentemente, o Estadão divulgou também uma técnica que recria pênis ”do zero” e promete devolver a vida sexual a pessoas que tiveram o órgão comprometido de alguma forma.

Fortalecimento

A fisioterapia pélvica fortalece os músculos da região genital e, com isso, devolve autonomia corporal para o paciente. Por isso, é recomendada não só para pacientes de câncer de próstata, como também para gestantes ou pessoas com incontinência urinária em geral.

Segundo a fisioterapeuta pélvica Dalila Duarte, no caso dos homens que passam pela prostatectomia, os exercícios podem ser feitos antes da cirurgia, com o intuito de reeducar o paciente sobre a sua musculatura – tendo em vista que muitos nunca trabalharam os músculos da região –, e depois, como tratamento, fortalecendo a região a fim de melhorar os quadros de incontinência e impotência.

“É essa consciência corporal e essa musculatura fortalecida que vão ajudá-lo a controlar melhor a urina e a ereção. Além disso, os hábitos do paciente são revistos para que ele evite comportamentos que podem piorar o quadro”, diz a especialista. No caso da disfunção erétil, os exercícios funcionam como um complemento ao tratamento, que geralmente é feito com medicamentos.

O ideal é que as sessões comecem entre 10 a 30 dias depois da cirurgia, caso o paciente tenha recomendação médica. O mínimo é de dez sessões – que geralmente duram em torno de uma hora cada –, mas o volume pode variar de acordo com a severidade do problema.

Os exercícios, chamados de Quíron – em homenagem ao psicólogo que descobriu que tinham função terapêutica e ajudavam inicialmente as mulheres a segurar a urina –, são movimentos de contração e relaxamento dos músculos da região genital (em especial do esfíncter uretral, que é o “cano” pelo qual sai a urina) e do ânus. Em alguns casos, são utilizados estímulos externos, com pequenos choques que fazem com que os músculos se movimentem.

“É importante ter o acompanhamento do fisioterapeuta especialista em fisioterapia pélvica, porque a maioria das pessoas nunca realizou esse tipo de movimento e nós precisamos nos certificar de que o paciente não está contraindo outros músculos, como o do abdome. O exercício precisa ser especificamente no músculo pélvico”, diz a especialista.

Especificamente para a disfunção erétil, é utilizado um dispositivo de bomba a vácuo. O exercício dura em torno de 5 a 10 minutos e deve ser feito todos os dias, em casa, de acordo com a orientação do fisioterapeuta.

“Esses exercícios com a bomba são importantes porque o paciente precisa ter frequência de estímulo mecânico no membro. Como o pênis é um músculo, ele acaba atrofiando se não for estimulado”, afirma a fisioterapeuta. Além da bomba, pode ser utilizada a masturbação, mesmo que não resulte em ereção.

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“Não dói absolutamente nada, nem causa nenhum desconforto, é muito tranquilo”, afirma João sobre os exercícios.

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