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Polícia do RS investiga advogados por uso de atestados falsos para soltar presos

Alegação é de que clientes teriam de ser liberados por estarem nos grupos de risco do novo coronavírus

Por Lucas Rivas
Atualização:

PORTO ALEGRE - A Polícia Civil do Rio Grande do Sul abriu investigação para apurar a conduta de advogados que estariam utilizando atestados médicos falsos para encaminhar pedidos de soltura de apenados gaúchos. Eles alegaram que os clientes estariam nos grupos de risco do novo coronavírus. O inquérito foi aberto após ter circulado áudios em grupos de WhatsApp que indicam o esquema fraudulento.

No fim de março, a Justiça de Camaquã, na região metropolitana de Porto Alegre, acatou recurso da defesa e concedeu prisão domiciliar para um detento, que cumpria pena por assassinato. Na decisão, o juiz considerou que o apenado corria riscos por ter diabetes, conforme atestava o falso laudo médico apresentado. Após a soltura, o advogado comemorou o despacho, conforme um dos áudios examinados pela investigação.

Esquema no Rio Grande do Sul é suspeito de se aproveitar da pandemia para libertar presos Foto: Flavio Lo Scalzo/Reuters

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"O plantão acabou de mandar uma decisão aí ô, de um cliente lá de Camaquã, imagina cidade lá do interior. Esse louco aí já responde um tráfico e lá em Camaquã tá respondendo um duplo homicídio qualificado. Apresentamos um laudinho frio, frio, friozinho, lá do Hospital de Clínicas, mas bem feitinho ali, de diabetes, que ele tinha diabetes e cantou (sic)", mencionou o advogado.

Responsável por coordenar a investigação, o delegado de Combate à Corrupção da Polícia Civil, Marcus Viafore, revela que a apuração está começando e que futuramente poderá desencadear em diferentes frentes.

"Recebemos informações de que alguns processos estariam com atestados falsificados para tentar a liberação de presos, que supostamente estariam nos grupos de riscos do coronavírus. Ainda não sabemos quem teria fraudado os laudos. Em Camaquã, a suspeita é muito forte, mas ainda não temos nada conclusivo. Será muito nocivo para sociedade, se isso se confirmar. Estes presos não deveriam ter benefícios e podem prejudicar a sociedade", disse Viafore ao Estado.

Após ter sido beneficiado com a prisão domiciliar, o detento de Camaquã fugiu. Um novo mandado de prisão já foi expedido contra ele, confirma o delegado. Marcus Viafore também explica que ao término das investigações, os responsáveis poderão responder por falsidade documental ou crime contra a administração da Justiça, por exemplo.

Ao tomar conhecimento do fato, a Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Rio Grande do Sul (OAB/RS), abriu processo ético disciplinar para investigar a conduta destes advogados. "Está sendo instaurado processo ético-disciplinar no Tribunal de Ética e Disciplina (TED) da OAB/RS. Nestes processos, com direito à ampla defesa, pode se chegar até a exclusão do registro profissional, caso comprovada falta ética grave", diz comunicado.

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Em função da pandemia, o Tribunal de Justiça do RS concedeu mais de 1,8 mil decisões de liberdade provisória para presos, no último mês de março. A Justiça gaúcha esclarece que a maioria destes apenados, que integram os grupos de risco, já cumpria pena em regimes aberto ou semiaberto. O total de detentos beneficiados equivale a menos de 5% de um total de 42 mil encarcerados no Rio Grande do Sul.

Nota da OAB/RS

A Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Rio Grande do Sul (OAB/RS), a partir de denúncias e de reportagens jornalísticas mencionando suposta prática de advogados gaúchos que estariam usando laudos médicos forjados para justificar pedidos judiciais de prisão domiciliar para apenados do sistema penitenciário, vem a público informar que:

- Tomou conhecimento das denúncias e recebeu nomes de advogados que estariam envolvidos;

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- Está sendo instaurado processo ético-disciplinar no Tribunal de Ética e Disciplina (TED) da OAB/RS. Nestes processos, com direito à ampla defesa, pode se chegar até a exclusão do registro profissional, caso comprovada falta ética grave.

- A Ordem aguarda novos documentos e provas da investigação realizada pelo Ministério Público e pela Polícia Civil, para anexar ao processo.

- A entidade está atuando nas apurações das denúncias com duas frentes de trabalho: Comissão de Fiscalização do Exercício Profissional, liderada pelo Dr. Sérgio Martinez, e Tribunal de Ética e Disciplina, liderado pelo Dr. César Souza.

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- A OAB/RS conta com mais de 100 mil advogados inscritos. A imensa maioria atua de forma ética e profissional. Em nossa entidade, não permitimos que profissionais que atuem sem a ética necessária sigam representando a advocacia.

- Conforme a Constituição Federal, em seu artigo 133, o advogado é considerado indispensável para a administração da Justiça e, nesse sentido, é inaceitável qualquer associação a práticas imorais ou ilícitas.

- Denúncias podem ser enviadas diretamente ao presidente da OAB/RS para o e-mail: gabinetedapresidencia@oabrs.org.br.

Ricardo Breier

Presidente da OAB/RS

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