As condições climáticas para a propagação do fogo em São Paulo devem voltar até sexta-feira, 30, segundo especialistas em clima. Entre os fatores, estão a baixa umidade, o calor excessivo e ventos acima de 30km/h.
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Com o afastamento da frente fria, a expectativa é de que a temperatura volte a subir. Governo federal e cientistas preveem que a temporada seca se estenda até outubro, o que eleva o risco de fogo. Nesta segunda-feira, 26, não havia focos ativos no Estado, mas 48 municípios seguem em alerta máximo.
São Paulo registrou 1,8 mil pontos de incêndio só na sexta-feira, 23, número recorde desde o início da medição oficial em 1998. Até o momento, as queimadas deixaram dois mortos.
Dadas as condições climáticas favoráveis, o fogo se espalhou rapidamente. “Temos uma ferramenta para informar à Defesa Civil, que leva em conta temperatura, umidade, seca e vento”, diz o coordenador de operações do Centro de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (Cemaden), Marcelo Seluchi.
“São muitos dias consecutivos de seca, sem chuva, por isso esta época do ano é particularmente crítica, temperatura acima de 30ºC, umidade abaixo dos 30% e ventos acima de 30km/h”, acrescenta ele.
Conforme Guilherme Borges, meteorologista do Climatempo, a frente fria que passou pelo Centro-Sul do País desde o fim da semana passada ajuda a carregar a fumaça por tantos quilômetros. “O ar das queimadas é quente e, por isso, mais leve. Já o ar da frente fria é mais denso, pesado. A frente fria ajuda a compactar a fumaça, a impedindo de se dissipar e a arrastando para outros Estados”, diz.
São possíveis episódios similares - de fumaça e fuligem no céu mesmo em cidades e Estados que não enfrentam queimadas - até o começo do período de chuvas, no início da primavera, entre o fim de setembro e começo de outubro. Nos próximos dias, como a frente fria está chegando ao oceano, o risco diminui. “Se houver novas frentes frias até lá (fim da temporada seca), é bem provável acontecer de novo”, diz Borges.
‘Rios voadores da Amazônia viram corredores de fumaça
Os chamados rios voadores – canais de ventos intensos que transportam a umidade da Amazônia para o Sul e o Sudeste – também têm funcionado como espécies de rios secos, transportando fumaça das queimadas no Norte - e agravando a crise que já existia em vários pontos do Sudeste.
Na Floresta Amazônica e no Pantanal, o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem sido alvo de críticas pelas falhas no combate às queimadas, que bateram recordes nos dois biomas.
“Como a Cordilheira dos Andes é muito alta, essas correntes não se dispersam. Elas passam por Peru, Bolívia, e depois, dependendo da situação meteorológica, vão diretamente para Sul ou Sudeste. No verão, elas carregam umidade”, afirma Seluchi.
“Mas, nesta época do ano, em que não chove, é como um rio seco, um jato de fumaça no Sudeste, situação ampliada pelos incêndios no interior do próprio Estado de São Paulo”, continua.
“Chamamos de rio voador porque é um volume de água evaporada realmente muito grande. Acontece principalmente no verão, traz chuva para o Sul e o Sudeste, mas, agora, como estamos no tempo seco e com quantidade grande de queimadas, essas correntes de vento trazem fumaça”, diz o climatologista José Marengo, coordenador de Pesquisa e Desenvolvimento do Cemaden.
Na semana passada, por exemplo, a Defesa Civil de Santa Catarina afirmou ter identificado no Estado partículas das queimadas do Pantanal.
Quais regiões podem ser afetadas pelo ‘corredor de fumaça’?
As regiões mais propícias de receberem correntes de vento com fuligem dos incêndios da Amazônia e do Pantanal, conforme o meteorologista do Climatempo, é a porção Sul de Goiás, todo o Centro-Oeste e Sul do País e o Oeste do Estado de São Paulo e de Minas Gerais.
A possível piora na qualidade do ar alerta para cuidados com a saúde. Problemas respiratórios, desidratação e ressecamento são os principais riscos. Especialistas recomendam beber mais água, manter-se na sombra e em locais arejados e usar soro fisiológico, colírios lubrificantes e hidratantes para conter o ressecamento da pele, olhos e narinas.
Origem dos incêndios em SP
Seluchi e o físico Paulo Artaxo, integrante do Painel Internacional para Mudanças Climáticas (IPCC) da Organização das Nações Unidas (ONU), acreditam que um grande número de incêndios pode ter sido criminoso, mas se espalhou rapidamente por causa das condições climáticas.
“A maior parte dos incêndios (em São Paulo) começou na sexta-feira, às 12h30. Não existe fenômeno natural com hora marcada para começar”, afirmou Artaxo. “Há forte indício de que os incêndios foram provocados.”
O governo federal e o governo de São Paulo apontam suspeitas diferentes para a origem das queimadas que têm causado transtornos no interior de São Paulo desde o fim da semana passada. O Ibama, órgão ligado ao Ministério do Meio Ambiente, vê indícios de crime orquestrado. Já o governo estadual diz que prendeu três suspeitos e investiga crimes, mas afirma não ver sinais de ação organizada.
As autoridades federais e estaduais afirmam que a temporada seca e os ventos fortes aumentaram o risco de fogo. Mas o Ibama, ligado ao Ministério do Meio Ambiente, afirma que o início dos focos de forma quase simultânea na sexta-feira, 23, é um indício de ação orquestrada. A Polícia Federal também investiga possível ação criminosa.
A gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos), por sua vez, afirma que não há até agora elementos que conectem as ocorrências e acredita que o espalhamento rápido se deve às condições climáticas adversas.