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Governo prevê embargar metade da área desmatada em áreas protegidas e rastrear produto agropecuário

Plano ainda reforça necessidade de aval ambiental para projetos de infraestrutura; pasta do Meio Ambiente tem visto tentativas de esvaziamento e polêmica sobre exploração de petróleo

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Por Roberta Jansen
Atualização:

O Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima lançou nesta segunda-feira, 5, as novas metas para o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm). Criado em 2004, na outra passagem da ministra Marina Silva pela pasta, o objetivo é reduzir de forma contínua o desmatamento na região até 2030. Uma das primeiras medidas, anunciadas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, é o embargo imediato de metade das áreas desmatadas em unidades de conservação federais.

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A identificação dessas áreas será feita por meio do sistema Prodes, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, órgão oficial de monitoramento do desmatamento via satélites. O embargo é uma sanção administrativa que suspende as atividades desenvolvidas na propriedade atingida.

Em 2022, quase 50% do desmate (5.738 km²) ocorreu em reservas públicas, como unidades de conservação ou terras indígenas. O plano também planeja criar três milhões de hectares de unidades de conservação até 2027.

Dentre outros destaques, estão o desenvolvimento de sistemas de rastreabilidade dos produtos agropecuários e minerais da Amazônia com o objetivo de coibir as práticas ilegais. Nessa lógica, estão previstas também criar a “Marca Amazônia”, do “Selo Amazônia” e do “Selo Verde” – que certificarão mercadorias da região quanto à produção sustentável, uso de insumos locais e produção verde, dentre outros aspectos.

A medida está em consonância com demandas da União Europeia, com quem o Brasil negocia detalhes finais para a assinatura de um acordo econômico. O bloco pressiona o Brasil para intensificar medidas antidesmate. O Parlamento Europeu aprovou, em abril, veto à importação de produtos ligados ao desmatamento. Na semana passada, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) anunciou que não vai oferecer crédito a frigoríficos que comprarem gado de áreas desmatadas.

Marina Silva e Lula durante cerimônia em comemoração ao Dia Mundial do Meio Ambiente, no Palácio do Planalto, em Brasília Foto: WILTON JUNIOR/ESTADÃO

Especialistas ouvidos pelo Estadão dizem que o plano é factível, justamente porque suas ações não dependem do Congresso Nacional, mas ressaltam que, se forem aprovadas leis que estimulem a devastação, isso pode enfraquece-lo.

”Esse plano não depende de mudança na legislação; na verdade, ele foi criado para funcionar com as leis em vigor já que estamos retomando o plano criado em 2004 e que havia sido interrompido pelo governo Bolsonaro”, afirma Suely Araujo, especialista políticas públicas do Observatório do Clima e presidente do Ibama na gestão Michel Temer (MDB). “Dependendo do que o Congresso aprovar, pode prejudicar a eficácia do plano e sua aplicação.”

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Marcio Astrini, também do Observatório do Clima, também destaca a necessidade de recursos. “É preciso arrumar mais dinheiro. O que tem no Fundo Amazônia não é suficiente)”, afirma.

Outra frente de fiscalização prevista pelo plano será sobre a cadeia do ouro. O garimpo ilegal, sobretudo em terras indígenas, tem sido um dos motores de destruição da floresta. Em abril, a maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votou por suspender a presunção da boa-fé na venda de ouro, regra que havia sido criada em 2013 e que abria brecha para a falsificação de dados.

Outro destaque é tornar obrigatória a realização de Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental para grandes empreendimentos e projetos de infraestrutura na região – uma ação coordenada por diversos ministérios. O objetivo, diz o documento, é “alinhar o planejamento dos grandes empreendimentos com a meta de desmatamento zero até 2030″.

A previsão vem no momento de disputa interna dentro do governo por causa de um projeto da Petrobras de exploração de petróleo na região do Amapá e também de tentativas de esvaziamento dos ministérios do Meio Ambiente e dos Povos Indígenas.

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O documento também prevê reforço na fiscalização, com a criação de quatro delegacias da Polícia Federal na região, criação de escritórios de investigação nos nove Estados da Amazônia, contratação de 1,6 mil analistas ambientais, compra ou locação de seis aeronaves e reforço do monitoramento tecnológico dos crimes.

O plano antidesmate foi o principal responsável pela redução de 63,5% da taxa de devastação da floresta até 2019, quando foi extinto pela gestão Jair Bolsonaro (PL). O programa foi reinstituído por decreto em janeiro deste ano, quando foi aberto à consulta pública. Também em janeiro, o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) criou uma comissão com representantes de 19 ministérios para retomar as ações e reorganizar as estruturas desmontadas durante a gestão anterior na área ambiental.

O objetivo do plano, segundo o governo, é “integrar o combate ao desmatamento às políticas de Estado brasileiras, partindo-se do princípio que o combate às causas do desmatamento não pode ser conduzido de forma isolada pelos órgãos ambientais”.

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A nova versão do PPCDAm tem quatro eixos estratégicos: atividades produtivas sustentáveis, monitoramento e controle ambiental, ordenamento territorial e fundiário e instrumentos normativos econômicos.

O plano prevê o desenvolvimento de atividades produtivas sustentáveis, com a retomada das políticas de exploração sustentável de florestas públicas, incentivos à restauração florestal, à bioeconomia, à agricultura de baixo carbono e ao estabelecimento de infraestrutura verde.

O documento também trata do monitoramento e controle ambiental, o que envolve a retomada do controle de territórios ocupados por atividades ilegais, expulsão de invasores de unidades de conservação e terras indígenas (a exemplo da reserva Yanomami, em Roraima, onde o governo decretou emergência), e implementação de instrumentos de apoio à fiscalização e melhoria da rastreabilidade de produtos agropecuários.

Outro ponto trata das regras fundiárias e territoriais, com a implementação do Cadastro Ambiental Rural (CAR), titulação de territórios tradicionais e criação de unidades de conservação. Também envolve reforçar instrumentos normativos e econômicos, como o Fundo Amazônia e o Bolsa Verde, pagamento por serviços ambientais e regulamentação do mercado de carbono e das cadeias de commodities, além de normas de reforço às ações de comando e controle em municípios críticos e em emergência ambiental por desmatamento.

Ao assinar o Acordo de Paris, em 2015, o Brasil se comprometeu também em reduzir as emissões de gases do efeito estufa. A Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, na sigla em inglês) de 2015 estabelece que o Brasil deve reduzir suas emissões em 37% até 2025 (em relação a valores de 2005) e alcançar a neutralidade climática até 2050.

O governo também determinou a criação de planos semelhantes para outros biomas, como Pantanal e Cerrado - este também visto uma escalada no desmatamento neste ano. As metas para essas outras áreas, no entanto, ainda não foram lançadas.

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