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Análise: Discurso é canto de cisne de Bush

Para 3/4 dos americanos o estado da nação não é grande coisa. O estado da presidência tampouco impressiona a opinião pública. Há grandes expectativas sobre o futuro, com o ciclo eleitoral em curso se confirmando como um dos mais competitivos e fascinantes

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Por Caio Blinder

Para 3/4 dos americanos o estado da nação não é grande coisa. O estado da presidência tampouco impressiona a opinião pública. Há grandes expectativas sobre o futuro, com o ciclo eleitoral em curso se confirmando como um dos mais competitivos e fascinantes da história. George W. Bush também tem expectativas de que o futuro reserve um julgamento mais generoso sobre seu governo do que as avaliações do momento. Este foi o pano de fundo do discurso proferido pelo presidente na segunda-feira à noite sobre o Estado da União em sessão conjunta no Congresso. Seu sétimo e último pronunciamento neste solene formato. Os doze meses restantes de governo são especialmente ingratos para um presidente americano na condição de "lame duck", ou "pato manco". O ocupante até dá passos para mostrar que ainda é relevante, mas Bush parecia em geral alheio a seu próprio discurso.A sensação é realmente de um Bush secundário diante da intensidade da corrida das primárias, tanto entre os democratas, como entre os republicanos. No seu próprio partido, Bush não tem peso nos lances sucessórios, ao contrário do que acontece com seu antecessor Bill Clinton entre os democratas. Última Chance O discurso de segunda-feira à noite talvez tenha sido uma das últimas oportunidades de Bush para chamar atenção sobre suas propostas e seu próprio governo. E não houve como o presidente usar o privilégio para um ganho espetacular. Ele apresentou algumas propostas modestas em educação e saúde, além da reciclagem de temas, mas sem grandes iniciativas de discursos anteriores como as fracassadas tentativas de reforma da imigração e previdência social. A guerra no Iraque segue impopular, apesar de alguns ganhos táticos com o reforço de tropas americanas, e outro pilar da presidência, a economia, está frágil. Isto quer dizer que Bush perde nas duas frentes cruciais de combate. A recessão poderá ser a marca do seu último ano de mandato e a doutrina Bush, de ataques preventivos, que abriu caminho para a invasão do Iraque, parece enterrada, embora o presidente não tenha resistido a estocadas retóricas contra o Irã no discurso de segunda-feira. Existem movimentações às pressas para conter os estragos econômicos, com o pacote de estímulos fiscais que a Casa Branca já amarrou com a maioria democrata na Câmara, mas não no Senado. Há um mês, nos primeiros rascunhos do discurso, nem havia menção à emergência econômica. Na segunda-feira, Bush admitiu que a economia passa por um "período de incerteza", mas que a longo prazo os americanos devem estar confiantes sobre crescimento. Ele pediu uma rápida aprovação do pacote de estímulos, justamente para afugentar o fantasma da recessão. Costurar um pacote econômico comprova que mesmo um "pato manco" ainda tem margem de manobra simplesmente por ocupar o Salão Oval da Casa Branca. E Bush ainda tem o poder de veto. No discurso, o presidente ameaçou utilizá-lo caso congressistas sejam pródigos para a aprovação de verbas para seus Estados. Tal rigor fiscal não era registrado quando os republicanos tinham maioria no Congresso e o compromisso de Bush acontece tarde demais. Legado Uma pesquisa Wall Street Journal/TV NBC mostra que para 70% dos americanos, a presidência Bush ficará caracterizada como pior que a maioria ou não tão boa como as anteriores. Para dar uma medida, 45% fizeram esta avaliação um ano antes do final do governo Clinton, em janeiro de 1999. Bush costuma dizer que no curto prazo a história erra e que a longo prazo são feitos os acertos. No aqui e agora, a história é implacável. Uma coalizão republicana que durou 30 anos para ser armada, reunindo conservadores em segurança nacional, a direita religiosa e os ortodoxos econômicos, talvez tenha sido destruída no segundo mandato de Bush. O presidente, no entanto, quer deixar o seu legado para um sucessor republicano. Um exemplo flagrante foi o apelo para que o Congresso ratifique os acordos de livre comércio com a Colômbia, Panamá e Coréia do Sul, num momento em que vozes protecionistas são mais estridentes. Candidatos republicanos preferem invocar Ronald Reagan e não o atual ocupante da Casa Branca. Ironicamente um modelo de Bush em termos de legado é o democrata Harry Truman, que deixou a presidência bastante diminuído em 1953, mas acabou engrandecido nos livros de história. O acerto, ou não, de contas, somente dentro de algumas décadas. Em 29 de janeiro de 2008, o estado da presidência Bush é sofrível. BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.

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