Palotina: poeira gerada pelos grãos de milho cria ‘atmosfera explosiva’ em silos; entenda riscos

Acidentes não são considerados incomuns no setor e, por isso, o manejo de grãos exigem medidas de proteção específicas. ‘Produto altamente combustível’, diz professor

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Por Marcio Dolzan
Atualização:

A explosão de um silo em Palotina, no interior do Paraná, chamou a atenção por provocar oito mortes e deixar mais de uma dezena de feridos, mas esse tipo de incidente não é tão incomum como pode parecer. Isso porque a armazenagem de grãos traz riscos, sobretudo de incêndios e explosões.

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“Se for de fato um silo de milho, como tem sido noticiado, é preciso lembrar que se trata de produto altamente combustível. A gente tira etanol do milho. Aliás, qualquer outro grão vegetal é combustível”, pondera o professor Enrique Munaretti, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Diretor da Associação Internacional de Engenharia de Explosivos (ISEE, na sigla em inglês), Munaretti afirma que explosões em silos “são relativamente comuns, no mundo todo”. Ele ressalta, contudo, que uma série de fatores precisam coincidir para que um incidente desses aconteça.

Explosão destruiu silo da C.Vale, cooperativa agroindustrial de Palotina, no oeste do Paraná Foto: Consamu

“Para gerar uma explosão, é preciso ter oxigênio, combustível e energia de ativação, que pode ser uma fagulha, uma faísca ou mesmo um atrito. E as pessoas ignoram que, num silo, até mesmo uma correia transportadora pode ser uma fonte e tem potencial explosivo”, lembra o professor.

“Parece que havia uma manutenção. Nessa manutenção pode ter sido gerado um corte de alguma chapa, que gerou calor ou faísca, ou pode ter sido feita uma solda. Mesmo que isso não tenha acontecido, um rolamento com defeito, um motor que superaquece, uma correia desalinhada podem servir como energia de ativação”, acrescenta.

Munaretti também aponta outros fatores podem ter contribuído para a explosão, cujas causas ainda estão sendo investigadas. “Esses silos ficam transportando grãos de um ponto a outro, e isso gera uma poeirinha fininha, que aumenta o contato desse combustível. E há ainda a questão de ser um espaço confinado, que aumenta essa atmosfera explosiva”, enumera. “Quando a gente passa de uma certa concentração de pó, aumenta muito o risco de explosão”

De acordo com o professor da UFRGS, silos como o que explodiu em Palotina costumam operar sob uma série de regras e normas rígidas. “A questão é que estamos em meio a um período de alta produção. Às vezes são contratados funcionários terceirizados, que não estão habituados com as normas de segurança”, pontua.

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Segundo ele, o Brasil costuma ser “bem eficiente” na criação e aplicação dessas normas. E, no caso dos silos, Munaretti ressalta a importância de se controlar o nível de combustível que os grãos estão dispersando. “O milho fermentado, quando libera calor, tem cheiro mais azedo. Mas a pessoa está lá trabalhando, sentindo cheiro o dia inteiro, não tem como saber. É preciso ter detector. O Brasil tem normas para isso”, exemplifica.

O que se sabe sobre o acidente em Palotina?

O silo estava sendo usado para armazenar milho e próximo ao centro de Palotina, numa área com vários silos. A explosão teria ocorrido em um túnel de transporte enquanto alguns funcionários da cooperativa estavam fazendo a manutenção da estrutura. Segundo os bombeiros, a explosão também destruiu parcialmente outros dois silos.

De acordo com o portal de notícias G1, foram ao menos cinco explosões em sequência. O capitão Guilherme Rodrigues, do Corpo de Bombeiros, disse ao portal de notícias que o ambiente onde ocorreu a primeira explosão é bastante fechado e empoeirado. Segundo ele, a poeira do local contém partículas inflamáveis que, em contato com qualquer fagulha, podem provocar explosões em série.

O estrondo foi ouvido a quilômetros de distância e provocou a quebra de vidros de janelas de imóveis em bairros próximos. Também surgiram pequenos incêndios no próprio silo, combatidos pelos bombeiros.

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A C.Vale é uma das duas maiores cooperativas agroindustriais singulares do Brasil e tem atuação no Paraná, Santa Catarina, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Sul e Paraguai. Fundada em 1969 por um grupo de agricultores, hoje é uma gigante que produz principalmente soja, milho, trigo, mandioca, leite, frango, peixe e suínos. Em 2022, produziu 4,2 milhões de toneladas destes produtos e faturou cerca de R$ 22,693 bilhões.

Em nota, a C.Vale disse que “no momento, a prioridade está centrada na mobilização de todos os esforços e recursos necessários à preservação da integridade dos colaboradores atingidos pelo incidente e apoio aos familiares das possíveis vítimas atingidas”.

A empresa afirmou que “todas as equipes de segurança da cooperativa estão ativas colaborando com autoridades públicas envolvidas, visando minimizar efeitos desse lamentável evento”. De acordo com ela, assim que forem identificadas as causas e repercussões do acidente, uma nova nota de esclarecimento será emitida.

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