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Arqueólogos resgatam vestígios do período imperial em Petrópolis

Pedaços de louça inglesa, brinquedos e fragmentos de construções da cidade que, por muitas vezes, serviu à corte no período do império estão sendo separados por uma equipe de técnicos e arqueólogos no Palácio de Cristal

Foto do author Marcio Dolzan
Por Marcio Dolzan
Atualização:

Em Petrópolis, na região serrana do Rio de Janeiro, o que ficou sob a terra há pelo menos 137 anos passou a ser resgatado a partir desta segunda-feira, 24. Pedaços de louça inglesa, de brinquedos, lembranças da imigração alemã e fragmentos de construções da cidade que, por muitas vezes, serviu à corte no período do império estão sendo separados por uma equipe de técnicos e arqueólogos. Tudo isso no entorno do Palácio de Cristal, um dos pontos turísticos mais famosos da cidade.

Palácio de Cristal, em Petrópolis Foto: WILTON JUNIOR / ESTADÃO

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O resgate das peças históricas enterradas a poucos palmos do chão começou meio que por efeito colateral. Em 2019, a prefeitura da cidade decidiu fazer obras de melhorias na Praça da Confluência, onde foi construído o Palácio de Cristal. As intervenções visavam adequar o local a boas práticas de acessibilidade, construir banheiros e resolver um problema crônico da área: o sistema elétrico. Desde sempre – e isso remonta ao século 19 –, a praça abriga feiras, exposições e outros eventos. E, toda vez que isso acontecia, a prefeitura se via obrigada a puxar cabos de energia pelo alto, atrapalhando a vista do belo palácio. A solução encontrada foi aterrar os cabos. Mas bastou a construtora responsável pelo trabalho abrir as primeiras valas para o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) embargar a obra, em fevereiro do ano passado. O motivo: ausência de Projeto de Monitoramento Arqueológico. Desde então, a área está fechada.

O projeto de monitoramento foi aprovado recentemente. E ontem, finalmente, os técnicos começaram a busca por peças enterradas na área que podem ajudar a contar um pouco mais sobre a rica história de Petrópolis. “Este é um espaço que foi utilizado para festas, feiras, exposições e outros eventos isolados. Toda essa forma de ocupação deixa um reflexo. Em princípio, não se encontrarão vestígios domésticos, de uma casa, mas alguma coisa que foi perdida, alguma coisa de obra, ou associadas a essas exposições”, explicou ao Estadão Giovani Scaramella, cuja empresa, a Grifo Arqueologia, foi contratada para acompanhar as escavações. Por ora, o trabalho vai se concentrar nas valas que já haviam sido abertas antes que o Iphan determinasse a interrupção dos trabalhos. “Pelo que já deu para observar nessas trincheiras, temos tijolos, fragmentos de construção, de louça, vidro e alguma coisa de tubulação”, contou.

Apesar de, em um primeiro momento, tais fragmentos por si só não parecerem um grande atrativo aos olhos do público, para os estudiosos eles têm valor considerável, porque ajudam a entender melhor a própria formação do local. “A gente consegue resgatar o passado não apenas pelos registros escritos, mas também com os registros materiais”, ponderou a historiadora Roselene Martins, que também atua no levantamento. Todas as peças que forem recolhidas serão levadas para um laboratório, higienizadas e passarão por análise. Um pedaço de louça ou um simples caco de vidro, por exemplo, podem ser suficientes para pesquisadores descobrirem de onde eles vieram – e isso é capaz de ajudar a entender um pouco mais sobre a própria dinâmica de construção da cidade. Além disso, há a intenção de se criar uma pequena área para exposição de algumas das melhores peças no pórtico de acesso à Praça da Confluência – isso, claro, quando o Palácio de Cristal voltar a receber público. A previsão inicial é de que os trabalhos durem cinco meses. 

PONTO TURÍSTICO MAIS VISITADO EM PETRÓPOLISCom uma estrutura encomendada na França, o Palácio de Cristal foi inaugurado em 1884 com um grande baile

Inaugurado em 2 de fevereiro de 1884, o Palácio de Cristal foi tombado pelo Iphan junto com a Praça da Confluência em 1967. A bela construção fica na região central de Petrópolis e é o ponto turístico mais visitado da cidade. A pedra fundamental foi colocada na Praça da Confluência – que recebeu esse nome por ficar na região que marca o encontro de dois rios que cruzam Petrópolis –, em 1879, exatamente cinco anos antes inauguração do palácio. Quem decidiu pela construção foi o Conde d’Eu, que se tornou príncipe consorte ao se casar com a Princesa Isabel.

“Conde d’Eu era presidente de uma associação de hortícolas em Petrópolis. Ele construiu o Palácio de Cristal para abrigar essa exposição. Foi inspirado no Palácio de Cristal de Londres, com a estrutura sendo toda encomendada da França”, explica a historiadora Roselene Martins. A inauguração contou com um grandioso baile, que reuniu muitos membros da família imperial. Nos anos seguintes, o Palácio de Cristal sediou eventos importantes, mas perdeu importância com a Proclamação da República, em 1889. Com o passar dos tempos, o local sofreu outro impacto: o da descaracterização. A falta de ocupação do espaço e uma série de intervenções afastaram a construção do seu projeto original, o que começou a ser revertido a partir dos anos 1990.

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Nas últimas décadas, o Palácio de Cristal retomou sua vocação original e se tornou palco dos principais eventos de Petrópolis. “É um dos maiores patrimônios turísticos que nós temos na cidade, e com certeza o maior em termos de visitação. Ele abriga todas as nossas principais festas, e vínhamos há um tempo tentando retomar essa obra”, disse o prefeito em exercício, Hingo Hammes (DEM). “Nossa meta é tê-lo de volta até novembro para, no fim do ano, podermos fazer novamente o nosso Natal Imperial.” Segundo a Secretaria de Obras de Petrópolis, as obras de melhoria do palácio e da Praça da Confluência foram orçadas inicialmente em R$ 1,14 milhão. Após o embargo, dois novos aditivos – que somaram R$ 211 mil – foram feitos, ambos voltados ao projeto arqueológico.

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