'A gente gasta mais que muitos países, mas não produz boa educação', diz Paulo Tafner

Se a qualidade dos gastos melhorar, pobres e ricos poderão competir em pé de igualdade, uma vez que País oferece poucas oportunidades de ascensão social, diz especialista

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BRASÍLIA - Fundador e diretor-presidente do recém-lançado Instituto Mobilidade e Desenvolvimento Social (IMDS), o economista Paulo Tafner afirma que é preciso melhorar a qualidade do gasto para garantir que brasileiros possam competir em pé de igualdade no mercado de trabalho e ascender na pirâmide social. Sem mobilidade social, segundo ele, o País terá menor potencial de crescimento. Confira os principais trechos da entrevista:

Para Paulo Tafner, 'o resultado efetivo do gasto é muito precário no Brasil'. Foto: Marcos Arcoverde/ Estadão

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De onde veio a ideia do instituto?

Em primeiro lugar, porque são mais de 30 anos de trabalho que envolvem questões sociais, particularmente a persistente pobreza no Brasil e os elevados índices de desigualdade. O Brasil nos últimos anos não cresceu, mas há 30 anos vem crescendo, embora menos do que poderia, e a gente tem situação de persistência de pobreza e de desigualdade. E tem programas sociais fortes, como Bolsa Família. Isso nos levou a questionar o seguinte: por que a gente, apesar de crescer, ainda que moderadamente, apesar de ter feito amplo programa de transferência de renda como o Bolsa Família e outros programas sociais, por que (mesmo) a gente tendo aumentado gasto com educação, saúde, a gente persiste com índices de pobreza e desigualdade tão assustadores? É diferente do que se poderia imaginar depois de tanto ter sido feito.

E qual é a causa?

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No Brasil, lamentavelmente, a mobilidade social é baixa. É um País fechado. Pessoas dos estratos mais pobres, com baixa escolaridade, os filhos têm pouquíssimas chances de ascender socialmente, tirando casos excepcionais como jogador de futebol, um cara que é especialmente talentoso em alguma área. É assim que funciona nossa sociedade. Então a gente começou a desenvolver essa ideia e convenceu um conjunto de atores privados, que acharam pertinente um instituto voltado exclusivamente à questão da mobilidade e do desenvolvimento social no Brasil, com foco em levantamento das informações, estruturação desse conhecimento e, mais à frente, a proposição de políticas públicas que aumentem a mobilidade social.

O que pode ser feito?

Há medidas relativamente simples que podem ser adequadas como política pública independentemente de transferência de renda. Mobilidade basicamente é pegar filhos de famílias cujos pais têm baixa instrução e remuneração para que eles possam ter possibilidades maiores de migrar para estratos médios de renda e escolaridade. Assim como será importante ver o extremo oposto. Num país com alta mobilidade, mais igualdade de oportunidade, você tem gente indo dos baixos estratos para o médio, tem do médio indo para rico e tem o contrário, rico indo para o estrato médio. No caso do Brasil, tudo leva a crer que a migração do 1% mais rico é muito baixa. Significa dizer o seguinte: são basicamente as mesmas famílias que controlam a riqueza e os acessos há décadas, e isso não é bom. O bom é ter mobilidade.

O que está por trás do problema?

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Basicamente, uma primeira constatação é que não falta dinheiro. A gente gasta com educação mais do que gastam muitos países no mundo, e a gente não produz educação boa para as crianças. E educação é o mais potente fator para mobilidade social. Gastamos com saúde a média de outros países como proporção do PIB, mas a nossa saúde em geral é ruim. O resultado efetivo do gasto é muito precário no Brasil. Isso significa ter mudança importante de política pública. Na área de educação, é necessário não só que haja manutenção do gasto, mas também um controle da qualidade do gasto.

Como?

Ter conteúdo mínimo obrigatório para todas as escolas públicas, independentemente da região, da renda média. Pobre e rico vão ter que aprender. É difícil? Então aí tem que ter um acompanhamento, por exemplo, com reforço escolar. Tem que diminuir o número de aulas perdidas na escola, que é enorme. Em alguns lugares isso chega a 20%, 22% das aulas. Isso ocorre nas localidades de renda baixa, com famílias mais pobres. Não adianta só gastar, é necessário cuidar da política pública, acompanhar, gerar mecanismos que gerem resultados efetivos.

Do ponto de vista racial, tem essa diferenciação na mobilidade social?

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Tem, em que pese o fato isso ser um recorte. Obviamente eu não poderia dizer que o problema de mobilidade no Brasil está restrito à questão racial. Vale para todo mundo. Obviamente que no caso dos negros é um pouco mais grave. Em alguns casos, se assemelham muito.

Como fica o discurso da meritocracia?

Acho que temos que privilegiar a meritocracia, mas temos que dar condições para que as crianças filhas de ricos e de pobres, de instruídos e de analfabetos, participem da mesma corrida. Uma vez que eu crio essas condições, aí o mérito predomina. É claro que igualdade (total) é a meta, mas é uma meta que nunca vai ser atingida. Filho de rico vai ter acesso a coisas que o Estado jamais poderá prover, como networking social. Mas ele vai ter o mesmo conteúdo na escola. Se eu colocar para disputar na universidade em pé de igualdade em termos de conhecimentos gerais, matemática, física, química, português, um preto pobre e um branco rico têm condições iguais de ir bem no vestibular e fazer faculdade com mérito, inclusive sem precisar de cotas.

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