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Economista e diretor-presidente da MCM Consultores

Opinião|Mercado de trabalho recomenda gradualismo na queda do juro

Não é possível ainda afirmar que o aquecimento no mercado de trabalho já esteja pressionando a inflação, mas parece claro que estamos próximos desse ponto

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Atualização:

Uma das principais variáveis para as decisões de política monetária dos bancos centrais é a diferença entre as taxas de desemprego observada e a neutra, essa última conhecida pela sigla Nairu, iniciais da expressão em inglês Non-Accelerating Inflation Rate of Unemployment, ou seja, a menor taxa de desemprego que não acelera a inflação.

Para dificultar a tarefa dos bancos centrais, obviamente também do Banco Central brasileiro (BC), a Nairu não pode ser observada diretamente. É necessário estimá-la por modelagens estatísticas que fornecem resultados não muito precisos. Pior: a Nairu não é estática, pois muda no tempo em função de parâmetros institucionais, demográficos, grau de flexibilidade no mercado de trabalho, maior ou menor incompatibilidade das habilidades da mão de obra em relação às necessidades das empresas, entre outros.

Quando não se pode diagnosticar com segurança um problema, analisam-se seus efeitos em variáveis observáveis. O dado mais relevante, nesse caso, é o chamado custo unitário do trabalho (CUT), que é o valor total das despesas salariais dividido pela quantidade de produto gerado. Se o salário e a produtividade do trabalho crescerem na mesma proporção, o CUT ficará inalterado e não deve haver preocupações com pressões inflacionárias advindas do mercado de trabalho, mesmo que o rendimento médio real esteja subindo.

No Brasil, o rendimento médio real do trabalho habitual, no trimestre encerrado em fevereiro/2024, cresceu 4,3% em relação a igual período de 2023 Foto: Tiago Queiroz/Estadão

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No Brasil, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua do IBGE, o rendimento médio real (descontada a inflação) do trabalho habitual, no trimestre encerrado em fevereiro/2024, cresceu 4,3% em relação a igual período de 2023. Para muitos, isso acendeu o sinal de alerta. No entanto, segundo minhas estimativas, em 2023, o CUT cresceu cerca de 3,5%, acima da meta de inflação, mas abaixo do IPCA do mesmo período (4,6%).

Assim, por esses números, não é possível ainda afirmar que o aquecimento no mercado de trabalho já esteja pressionando a inflação, mas parece claro que estamos próximos desse ponto.

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De fato, outros indicadores, por exemplo, o alto número de vagas geradas no mercado formal (com carteira assinada), resultado de também elevados volumes de admissões e demissões, mostram aquecimento intenso nesse segmento do mercado de trabalho.

Além disso, os serviços intensivos em mão de obra, influenciados, entre outras variáveis, pelos salários reais, vêm apresentando taxas de variação bem acima da meta de inflação. A média móvel semestral, livre de efeitos sazonais e anualizada, foi de 6,2% no IPCA de março, tendo crescido 0,6 ponto porcentual desde o fim de 2023.

Como se vê, o mercado de trabalho encontra-se aquecido, embora seus efeitos sobre a inflação ainda não sejam conclusivos. Mas essa incerteza já justifica que o BC conduza com maior gradualismo o ciclo de redução da Selic, já a partir de sua decisão em junho próximo.

Opinião por Claudio Adilson Gonçalez

Economista e diretor-presidente da MCM Consultores, foi consultor do Banco Mundial, subsecretário do Tesouro Nacional e chefe da Assessoria Econômica do Ministério da Fazenda

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