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Economia e políticas públicas

Opinião|A PEC dos gastos e a Previdência

Sem uma dura reforma da Previdência, será impossível cumprir a PEC do limite dos gastos já no próximo mandato presidencial.

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Atualização:

Sem uma dura reforma da Previdência, em menos de dez anos será completamente impossível cumprir a PEC do limite dos gastos, caso esta seja aprovada. Cálculos relativamente otimistas de um analista de contas públicas indicam que, sem reforma da Previdência (INSS) - mas ainda assim supondo que o piso previdenciário passe a acompanhar a inflação após 2020 -, a PEC faria com que em 2027 as despesas de pessoal (incluindo previdência do funcionalismo), saúde, educação e Previdência atingissem 99,5% dos gastos primários da União (e "superassem" o total a partir daí). Gastos primários excluem os juros da dívida pública.

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Em outras palavras, não sobraria nada para as demais despesas primárias, como investimentos, subsídios, programas sociais não previdenciários e custeio de outras áreas que não saúde e educação. Com a PEC, a Previdência (INSS), em particular, salta de 40% para 70% da despesa primária da União entre 2016 e 2030, mesmo com o piso previdenciário seguindo a inflação a partir de 2020, primeiro ano após o fim da validade da atual regra, de inflação mais o PIB de dois anos antes (regra do salário mínimo).

Com a PEC e as hipóteses acima, as "demais despesas" cairiam para o seu mínimo histórico nas últimas décadas como proporção do gasto primário da União (14,5%, atingido em 2003) em 2021, e a partir daí teriam que rumar para praticamente zero em 2027. Posteriormente, chega-se à situação paradoxal em que as demais despesas teriam que ser negativas para que o teto fosse respeitado. É claro que bem antes de 2027 o governo já estaria inviabilizado.

"Sem uma dura reforma da Previdência, será impossível entregar o exigido pela PEC já no próximo mandato presidencial", diz o analista. Esta reforma, além de desindexar o piso previdenciário do salário mínimo a partir de 2020 (o cenário base de "não reforma" do economista; sem isto a situação seria ainda mais catastrófica), teria que restringir fortemente as regras de elegibilidade aos benefícios e lidar de forma contundente com questões como as diferenças entre homens e mulheres e a Previdência Rural.

O principal, porém, aponta o analista, é que a reforma da Previdência tem que ter regras de transição muito rápidas e duras, que vão afetar boa parte das pessoas já no mercado de trabalho, uma vez que "é preciso que ela dê dividendos fiscais já no próximo mandato, para permitir o cumprimento da PEC".

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As simulações da evolução do gasto primário no seu exercício de projeção são otimistas do ponto de vista fiscal. Ele prevê, por exemplo, que os gastos com saúde e educação fiquem até 2030, o horizonte da projeção, no novo mínimo previsto pela PEC - o nível de 2017 corrigido pela inflação.

No caso dos gastos de pessoal, a previsão é que, após os aumentos já acordados para os anos de 2017, 2018 e 2019, a folha da União passe a ser corrigida apenas pela inflação e por uma taxa de crescimento vegetativo do número de funcionários de 1,5%, que é a metade da taxa efetivamente ocorrida no período de 1998 a 2015. E, no caso da Previdência, além da taxa de crescimento vegetativo do número de benefícios de 3,8% a partir de 2018 (3,6% em 2016 e 2017), há a suposição otimista, já bastante enfatizada, de que o piso previdenciário passe a ser corrigido apenas pela inflação a partir de 2020.

O analista também fez simulações sobre possíveis mudanças no Congresso das regras da PEC referentes a saúde e educação, supondo que as duas rubricas subam 1%, 2% ou 3% acima do piso definido na PEC; ou que apenas a saúde suba 1%, 2% ou 3% acima.

O exercício mostra que a aplicação sem afrouxamento das regras da PEC em educação faria o piso do gasto, como proporção do PIB, ficar próximo - até acima em média - do quanto se gastou nesta área de 2000 a 2009, antes de um enorme salto em 2010 que o analista atribui em boa parte à construção de novas universidades. Qualquer adicional acima do piso definido na PEC levaria os gastos de educação a um nível bem acima da média daquele período. Já no caso da Saúde, a situação se inverte. Seria apenas com um afrouxamento da PEC, que permitisse que o piso da saúde crescesse 3% acima do previsto, que o gasto na área se aproximaria da média de 2002 a 2015, como proporção do PIB.

O analista nota que, em termos demográficos, o Brasil tende proporcionalmente a ter mais idosos e menos crianças e adolescentes, o que sugere que, entre saúde e educação, o maior risco é restringir demais os gastos com a primeira. Assim, ele prevê que haja alguma flexibilização do piso de saúde, mas alerta que esta terá que ser compensada com ainda mais dureza na reforma da Previdência.

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Relação dívida/PIB

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Uma das boas notícias que saem das suas projeções é que o cumprimento da PEC efetivamente estabilizaria a relação dívida bruta/PIB a partir de meados da próxima década, considerando um crescimento médio anual do PIB, superada a atual crise, de 2% (está é a projeção básica dos seus cenários).

E se aquele crescimento médio subisse para 3%, a estabilização seria antecipada e se daria num nível de quase oito pontos percentuais (pp) mais baixo. Com crescimento médio de 2%, este nível seria ligeiramente acima de 95% do PIB. Com 3%, seria entre 87% e 87,5%. Em 2030, a relação dívida/PIB teria caído para 92,7%, com crescimento de 2%, e para 78,4% com 3% - uma diferença de 14,3 pp do PIB (fernando.dantas@estadao.com)

Fernando Dantas é jornalista do Broadcast

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 13/9/16, terça-feira.

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Opinião por Fernando Dantas
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