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Frete marítimo entre Ásia e Brasil volta a subir e preocupa indústria

Custo salta mais de 30% em julho e retoma níveis do auge dos gargalos provocados pela pandemia desde a 2.ª metade de 2020

Por Vinicius Neder
Atualização:

RIO - O custo do frete marítimo para a importação entre a Ásia e o Brasil, importante para o abastecimento de insumos para a indústria, voltou a encarecer em julho. O preço médio mensal ficou em US$ 10.550 por contêiner de 40 pés (com dimensões de cerca de 12 por 2,5 metros), alta de 30,2% ante a média de junho. O custo sobe desde maio, retomando os níveis do segundo semestre de 2021, auge da crise logística global iniciada na segunda metade 2020. O preço médio deste mês é de 5,1 a 6,6 vezes maior do que o dos dois primeiros de 2020, antes da pandemia.

O aumento recente, segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI), sugere que os gargalos logísticos globais podem levar ainda mais tempo para se dissolver. Para Matheus de Castro, especialista em infraestrutura da entidade, o valor de US$ 10 mil por contêiner pode ser o “novo normal” do custo da logística do comércio internacional – a CNI lançou, nesta quarta, 20, um painel online para divulgar os preços mensalmente.

Frete marítimo entre Ásia e Brasil volta a subir e preocupa indústria Foto: Rafael Arbex/Estadão

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Os gargalos logísticos contribuem para o encarecimento e a escassez de componentes da indústria, como os semicondutores, atrapalhando a produção e encarecendo de geladeiras e fogões a automóveis. Diante da mais elevada inflação em 40 anos, o presidente dos EUA, Joe Biden, vem criticando a concentração de mercado entre grandes operadores marítimos – multinacionais europeias e chinesas, nenhuma americana - como um dos fatores responsável pela elevação do custo do frete e, consequentemente, do encarecimento de bens.

Os problemas surgiram na retomada da economia global, passado o fundo do poço dos primeiros meses de pandemia. Como em todas as atividades, o sistema logístico do comércio internacional foi afetado pelas restrições ao contato social. Na retomada, a demanda por bens voltou mais rapidamente do que o esperado – turbinada por políticas de transferência de renda e pelo fato de que, no isolamento, consumidores passaram a gastar mais com produtos do que com serviços e optaram mais pelo comércio eletrônico. Isso levou a uma corrida pelos serviços de transporte, pressionando a capacidade de portos, armazéns, navios e contêineres. O desequilíbrio entre demanda e oferta fez os preços explodir.

As operadoras logísticas globais – as quatro maiores empresas, a ítalo-suíça MSC, a dinamarquesa A.P. Møller-Maersk, a francesa CMA CGM e a chinesa Cosco Shipping - respondem por quase 60% do mercado, segundo a Alphaliner, base de dados do setor. Estas companhias encomendaram mais navios, para ampliar a capacidade de transporte, mas a construção de um navio leva anos. O presidente para a América Latina e o Caribe da A.P. Møller-Maersk, Robbert van Trooijen, disse ao Estadão em fevereiro que as novas embarcações deverão de fato ampliar a capacidade apenas a partir de 2024.

A guerra na Ucrânia e a política de “covid zero” na China – que levou a “lockdowns” rigorosos em abril e maio, atingindo até mesmo a região de Xangai – agravaram ainda mais a crise neste ano. A invasão russa à Ucrânia fez saltar as cotações do petróleo, encarecendo o combustível usado pelos navios e a operação logística. O “bunker”, óleo combustível usado nas grandes embarcações, está nos maiores preços desde 2008, disse Castro.

Segundo o especialista da CNI, o pior já passou nos “lockdowns” na China, mas isso foi insuficiente para aliviar os gargalos logísticos globais. Em parte, na avaliação de Castro, por causa do congestionamento dos portos dos EUA. O travamento dos terminais da Costa Oeste fez os operadores remanejarem parte dos fluxos para a Costa Leste, o que espalhou os congestionamentos, em vez de resolver o problema.

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“Com os problemas no mercado americano, e eles estão se agravando, as empresas vão destinar navios e capacidade pra atender esse mercado”, afirmou Castro, lembrando que, embora as rotas que incluem o Brasil sejam consideradas “secundárias” no comércio internacional e não haja congestionamento nos portos brasileiros, todo o sistema global é integrado.

Conforme Fábio Pavani, gerente da filial de São Paulo da Asia Shipping, especializada em logística do comércio exterior, além do encarecimento do combustível e dos gargalos globais, o custo do frete é pressionado pela demanda por importações em alta. O consumo interno “segue em movimento”, disse. E, ainda que perca algum fôlego, o travamento das cadeias globais da indústria, agravado pelos “lockdowns” na China, derrubou os estoques de insumos na indústria brasileira. “A demanda pelo transporte, seja marítimo, seja aéreo, aumentou”, afirmou Pavani.

Os gargalos logísticos afetam sobretudo o transporte via contêineres, usado para carregar manufaturados ou produtos agropecuários específicos, como frutas e carnes. Por isso, para o Brasil, são mais atingidas as importações e a produção industrial. Com as cadeias de produção integradas, a indústria depende de importar componentes, especialmente da Ásia.

As exportações também são afetadas, mas com menos impacto para a economia nacional, porque o carro-chefe das vendas externas do Brasil são as matérias-primas, com destaque para soja, café, minério de ferro e petróleo. Essas “commodities” são transportadas em navios graneleiros, sem contêineres. Além disso, geralmente, o custo do frete dessas matérias-primas fica com os importadores.

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