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Médico faz expedição anual para atender moradores de áreas isoladas no Pantanal

Projeto chamado de ‘Alma Pantaneira’ atendeu cerca de 700 pessoas e realizou mais de 4 mil procedimentos médicos e odontológicos em 2022

Foto do author Cleide Silva
Por Cleide Silva

Todos os anos, desde 2012, o médico ortopedista Waldir Albaneze, de 42 anos, aproveita o período de férias e parte em viagem para áreas isoladas do Pantanal para prestar atendimento primário à população que vive em áreas sem suporte do sistema público de saúde.

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Com ele vão mais três médicos, quatro dentistas, dois veterinários e uma equipe de apoio com cerca de 20 pessoas entre mecânicos, cozinheiros, pessoal de logística, pesquisadores – todos voluntários –, além de oficiais cedidos pela Marinha local para dar suporte e segurança. É a Expedição Alma Pantaneira, criada pelo Instituto Alma Pantaneira (IAP), organização sem fins lucrativos fundada por Albaneze.

A expedição parte de Poconé (MT) e leva dois dias até a primeira parada. Segue para vários municípios da região até Corumbá (MS). A viagem de duas semanas percorre 1,1 mil km em veículos 4x4, que conseguem atravessar terrenos alagados, arenosos e esburacados.

Waldir Albaneze atende morador de área isolada no Pantanal Foto: Paulo Cruz/IAP

“São regiões onde só é possível chegar de avião, trator, cavalo e carros preparados”, conta Albaneze. Em razão das dificuldades de acesso e da distância, praticamente não há assistência pública por causa do alto custo. Também é difícil encontrar profissionais dispostos a trabalhar nesses locais.

Nas paragens, o grupo monta “consultórios” em tendas e em varandas e salas de fazendas e atende de crianças a idosos. Os dentistas operam com três consultórios móveis e prestam serviços como tratamento de cáries, extração de dentes e até confecção de dentaduras, além de orientações de limpeza e escovação.

No ano passado, a General Motors, que apoia projetos no Pantanal, doou um equipamento de raio X odontológico portátil que ajuda nos diagnósticos. Os médicos atendem problemas de pele, ortopédicos e clínicos gerais.

“A ideia é prestar atendimento primário, com atividades preventivas como fluoretação em crianças, avaliação de pressão, glicemia e outros procedimentos; quando identificamos alguma patologia, prescrevemos medicamentos que recebemos da Prefeitura de Corumbá”, diz Albaneze.

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Em novembro, quando ocorreu a 11º expedição, foram realizados mais de 4 mil procedimentos, número recorde. “Nos primeiros três anos a média de atendimento era de 150 a 200 pessoas, depois passou para 300 a 400 e este ano foram 700 pessoas”, informa ele.

Aprendizado com o avô

Quando criança, Albaneze passava as férias na fazenda do avô Romeo, médico renomado de Corumbá, e via chegaram ao local caminhões com pessoas nas caçambas, gente chegando à cavalo ou de trator para falar com o avô, que atendia a todos. “Eles escutavam o avião chegando e corriam para lá.” Quando se formou em medicina, decidiu ajudar pessoas como fazia Romeo, mas, em vez de esperar que viessem até ele, foi ao encontro delas.

“Comprei um jipe e eu e meu pai (empresário do ramo de restaurantes) começamos a visitar as áreas isoladas para dar atendimento aos pantaneiros”. Nos quatro primeiros anos, os dois viajavam com poucos voluntários.

Em 2016, Albaneze criou formalmente o IAP e o projeto Expedição Alma Pantaneira e o grupo de voluntários cresceu. Atualmente, a equipe de médicos e dentistas vêm de várias partes do Brasil, como Rio de Janeiro e Minas Gerais. Alguns participam com frequência e outros fazem uma espécie de rodízio.

Dentistas voluntários atendem crianças em 'consultórios' improvisados Foto: Paulo Cruz/IAP

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Os patrocínios também aumentaram e atualmente cobrem 50% dos gastos, que ficam em torno de R$ 550 mil por expedição. “Antes, os participantes se cotizavam e bancavam as despesas”. Em 2022, o grupo recebeu ajuda extra com o empréstimo de dois caminhões da Marinha e duas picapes S10 Z71 da GM. Outros oito veículos eram dos participantes ou foram cedidos por empresários da região.

Albaneze trabalha como médico ortopedista na Santa Casa e na Polícia Militar de Campo Grande (MS). Ele e o pai Geraldo participaram das 11 edições da expedição - sempre realizada em suas férias - e já prepara o roteiro da próxima, em outubro de 2023. “Ajudar essas pessoas isoladas, que não têm recursos, é algo impagável para nós.”

A expedição também tem pesquisadores que estudam formas de melhorar a água que abastece essa população, que é ferruginosa e salobra, e também a recuperar tradições pantaneiras perdidas na última década, como “carnear” gado (jeito típico de retirar a carne do animal para fazer carne seca).

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