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Bolsa brasileira tem segunda maior alta em 20 anos no período pré-eleitoral

‘Estadão’ comparou o comportamento do índice Ibovespa nos meses de julho e agosto, os primeiros dois meses da corrida eleitoral, desde 2002: só em 2014 o mercado financeiro teve ganhos maiores

Foto do author Lucas Agrela
Por Lucas Agrela
Atualização:

Nos dois primeiros meses da atual campanha eleitoral oficial, o índice Ibovespa – referência para o mercado brasileiro – registrou a segunda maior alta, na comparação com os demais pleitos presidenciais dos últimos 20 anos. De julho a agosto deste ano, a alta foi de 11,14%. No período, o índice, principal da bolsa de valores brasileira, passou de 98.542 pontos, em 1.º de julho, para 109.523 pontos, em 31 de agosto.

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O único resultado mais alto foi em 2014. No ano em que Dilma Rousseff (PT) foi reeleita, a Bolsa teve o melhor resultado nessa janela de dois meses desde 2002, registrando uma alta de 15,27%, de acordo com dados compilados pela Clear Corretora. Em 2018, quando Jair Bolsonaro venceu nas urnas eletrônicas, a Bolsa paulista subiu 5,38% entre julho e agosto.

Quando considerados os dados acumulados para cada ano – sempre para o período de janeiro a agosto –, o resultado de 2014 também se destaca: naquele ano, o Ibovespa teve alta de 18,96% nos primeiros oito meses. Neste ano, a alta foi mais discreta, de 4,48%. E, em 2018, o índice ficou no zero a zero (veja mais abaixo gráfico com a comparação do desempenho dos índices desde 2002).

Volatilidade na bolsa de valores acontece em anos eleitorais, mas especialistas não veem um padrão Foto: Daniel Teixeira/Estadão Conteúdo

Para William Eid, diretor do centro de estudos em finanças da Fundação Getúlio Vargas (FGV(, não há um padrão de movimentos na bolsa brasileira em anos eleitorais. “A volatilidade da bolsa depende muito da incerteza que a eleição traz. Se os dois tiverem o mesmo programa, a mesma expectativa do mercado, não há mudança. Se houver um na frente que o mercado considere aceitável, a oscilação é menor”, diz.

Variação das ações, para cima e para baixo

Outra forma para observar o comportamento dos investidores na renda variável é de acordo com a variação dos investimentos. Esse movimento de oscilação dos ativos, para cima e para baixo, é chamado de volatilidade – e pode mexer com as emoções dos investidores.

Entre janeiro e agosto de 2022, a volatilidade da Bolsa de Valores brasileira igualou a de 2014. A variação, em valores corrigidos pela inflação, foi de 19% em ambos períodos.

De acordo com dados da Economatica/TC, a volatilidade mais forte dos últimos 20 anos da bolsa no período pré-eleitoral até agosto foi em 2002, quando atingiu 32%. Exceto por 1994, a oscilação tende a ser mais forte no fim do ano, de setembro a dezembro, após o resultado das urnas. Em 1998, por exemplo, a variação foi de 83%.

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Como se proteger do sobe-e-desce

Para o investidor pessoa física, a oscilação da renda variável pode gerar ansiedade por ganhos no curto prazo, ao tentar antever picos e vales dos preços das ações. No entanto, a recomendação dos analistas é ter paciência para obter retorno dos investimentos.

Fernando Siqueira, líder de pesquisa na Guide Investimentos, afirma que a variação na Bolsa normalmente acontece quando há chances de alteração entre direita e esquerda no poder, como ocorreu em 2002, 2014 e 2018. Para o especialista, o melhor período para a bolsa ainda está por vir, apesar de a projeção não estar imune a riscos. “Historicamente, o quarto trimestre é melhor para o Ibovespa, independentemente das eleições”, afirma Siqueira.

Histórico dos últimos 20 anos

Em 2002, a taxa Selic vinha de uma trajetória de redução, de 19% para 18% ao ano. Em agosto daquele ano, a meta da inflação já tinha sido abandonada. O clima era de cautela entre investidores, que realizavam lucros, e o mercado aguardava uma alta de José Serra nas pesquisas eleitorais contra Lula, que sairia vencedor do pleito, contrariando, à época, os desejos dos investidores da bolsa de valores. No ano, o Ibovespa amargava uma queda de 23,53%.

A percepção da administração petista pelo mercado era positiva. A partir de 2012, o PT começou a perder essa reputação por causa de muitos erros de condução da política econômica.”

Samuel Pessôa, economista

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O temor de uma sucessão presidencial que mudasse radicalmente a conduta da gestão do governo de Fernando Henrique Cardoso fez o País ter um desequilíbrio no balanço de pagamentos em 2002. De acordo com o Banco Central, o Fundo Monetário Internacional (FMI) desembolsou US$ 16,045 bilhões ao Brasil no ano de 2002. O País pagou US$ 4,564 bilhões de empréstimos anteriores, ficando com US$ 11,480 bilhões. Graças a esse montante recebido do FMI, o Brasil conseguiu fechar o ano com saldo perto de zero.

O governo FHC sofreu desgaste com a população, em parte, devido ao desemprego. A taxa média em 2002 foi de 11,7%, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O porcentual é um salto em relação aos 6,2% registrados um ano antes. Já na reta final das eleições, Lula tornou-se o líder inconteste da corrida presidencial na disputa com o tucano José Serra (PSDB). No segundo turno, Lula teve 61% dos votos válidos contra 39% de Serra.

Para Samuel Pessôa, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e da Julius Baer Family Office (JBFO), em 2002, o País lidava com o grave problema de não ter reserva em dólares, o que gerava um ciclo de desvalorização do real e aumento da dívida do governo, uma questão resolvida durante os governos de Lula. A trajetória do presidente petista ajudou a construir uma boa reputação em relação ao risco fiscal do País, mas isso se deteriorou com o tempo, especialmente a partir do fim de 2013.

“A percepção da administração petista pelo mercado era positiva. A partir de 2012, o PT começou a perder essa reputação por causa de muitos erros de condução da política econômica. Ao final de 2013, já havia ficado claro para o mercado que havia um desequilíbrio fiscal estrutural. O governo não conseguia pagar suas contas sem recorrer a um imposto inflacionário. O mercado começou a precificar o risco país. Por isso, no período eleitoral de 2014, o PSDB era visto com um compromisso maior com a responsabilidade fiscal”, afirma Pessôa.

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Samuel Pessôa, economista: 'descasamento' entre gastos e receitas Foto: Hélvio Romero/Estadão

Após o primeiro mandato de Lula, o mercado não precificou o risco do desconhecido até o segundo mandato de Dilma. Além do gasto para a reeleição e do aumento da dívida da Petrobras, a presidente teve uma crise política com o Congresso Nacional, que deu muitos sinais de que não iria aumentar a carga tributária do País e, por isso, exigia redução de gastos.

“Não há em nenhum lugar escrito algo que diga o quanto o governo pode gastar. A tendência era de que o gasto subiria. Se ele sobe, a receita tem que subir. O Congresso começou a dar muitos sinais de que não queria mais aumentar a carga tributária. Apareceu uma dissintonia do próprio Congresso. Isso fazia com que tivéssemos uma estrutura de gastos que não conversava muito com a estrutura de receitas”, diz Pessôa.

Em 2018, greve dos caminhoneiros

Já em 2018, o mercado enfrentou o impacto da greve dos caminhoneiros, mas também a economia começou a colher frutos da política de austeridade adotada por Michel Temer, composta especialmente pelo Teto de Gastos e por mudanças no financiamento do BNDES. Na visão do economista, tais atitudes levaram à redução do juro, aumento do emprego e queda da Selic ao menor patamar histórico no início do governo Bolsonaro.

O País também teria se beneficiado do fato de Temer não ter sido candidato e, por isso, não ter aumentado gastos públicos com essa finalidade. “Na nossa dinâmica doméstica, diante do cenário internacional adverso, há duas fontes de preocupação com e é grande. O Congresso aprovou a PEC Kamikaze e a PEC dos Precatórios. Não há mais espaço para a aprovação de mais medidas para Bolsonaro tentar se reeleger. A segunda diz respeito à responsabilidade fiscal do País”, afirma.

Caso Lula saia vitorioso do pleito, como apontam as pesquisas eleitorais, o principal risco que pode ser precificado, com queda de preços de ações, é a condução da Petrobras, uma das principais empresas do País e com grande peso no índice Ibovespa.

“A Petrobras é uma empresa importantíssima da bolsa e existe uma política para ela hoje. Não sabemos qual será a política do PT para ela. No passado, foi algo desastroso. Houve má execução de projetos, desperdícios no setor de refino, elevadíssimo nível de endividamento em 2015 e uso da empresa para subsidiar preços de combustíveis, gerando prejuízo para vender combustível barato para a população em ano eleitoral. Veremos que o PT aprendeu com os erros e eles não serão cometidos”, afirma Pessôa.

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