PUBLICIDADE

Publicidade

'O governo como um todo agiu muito tardiamente', diz especialista

Para Sérgio Firpo, professor do Insper, medidas anunciadas pelo Ministério da Economia são eficazes e necessárias, mas ainda é preciso fazer mais

Por Douglas Gavras
Atualização:

Para o professor do Insper Sérgio Firpo, especialista em mercado de trabalho, ficou evidente que o governo subestimou o tamanho do impacto da epidemia do novo coronavírus no Brasil. E, apesar de algumas medidas acertadas para tentar evitar demissões em massa e perdas ainda maiores de renda dos trabalhadores, é preciso fazer mais. A seguir, trechos da entrevista ao Estado.

Sérgio Firpo vê as medidas como necessárias, mas ainda crê que elas são 'remédio para febre'. Foto: Nilton Fukuda/Estadão

PUBLICIDADE

A proposta do governo, de permitir que as empresas reduzam até 50% da jornada e dos salários sem negociação coletiva, parece razoável?

Parece necessário, sem isso não vai dar para segurar o emprego das pessoas. Em setores que mais evidentemente vão sentir a queda de demanda, como transporte aéreo, hotelaria e turismo, é ainda mais importante. Há uma série de ocupações em que os empregos só vão ser mantidos se os trabalhadores tiverem uma jornada menor. Sem isso, muitos serão selecionados para serem demitidos -- e ainda assim, haverá demissão. A questão é que esta é uma crise transitória e as empresas não querem arcar com custos de demissão, se puderem evitá-los. Agora, o mais importante é tentar suavizar um pouco a oscilação brusca da atividade econômica. A perda de receita das empresas vai ser muito grande, mas espera-se que a economia retome no segundo semestre ou no ano que vem. O momento requer um esforço de todos. É preciso entender que se trata de um momento diferente, sendo preciso coesão social, para ajudar os que mais vão precisar. As famílias de classe média deixam de ter suas diaristas e se solidarizam mantendo o suporte para essas trabalhadoras. A gente deixa de comprar de lojas grandes e vai para as lojas de bairro. É preciso fazer um esforço conjunto.

Em um primeiro momento, as medidas não contemplavam os trabalhadores informais. O que foi proposto depois é suficiente?

Na questão dos informais, a proposta de um auxílio de R$ 200 parece pouco e não está claro como eles vão determinar quem é elegível ou não. Está com mais cara de que irá se tornar um benefício universal. A implantação depende de organização de deixar os detalhes mais claros para dar certo.

A alternativa de pagar seguro-desemprego para quem tiver salário reduzido é acertada?

Sim. É como se o empregado estivesse meio empregado e meio desempregado. Se ele trabalhava 40 horas por semana e agora tem de trabalhar 20, não faz isso por opção. Ele ficou desempregado por metade da jornada. Receber o seguro-desemprego para isso parece fazer todo o sentido, ao menos como medida emergencial. O governo também estuda pagar pelo período de 15 dias em que o trabalhador com coronavírus ficar afastado. Parece muito dinheiro, mas não é. Quantas pessoas devem contrair a doença que estão na força de trabalho e estavam ocupadas? Espero que poucas.

Publicidade

A equipe econômica reagiu acertadamente, dado o tamanho da crise?

No mínimo, o governo como um todo agiu muito tardiamente. Ficou evidente que eles não anteciparam o problema ou até negaram enquanto podiam. Até o começo da semana, o presidente chamou de histeria. Só que é uma doença que vem pelos mais ricos e mata os mais pobres. A insatisfação da população está nos panelaços. Em diversas outras áreas, o governo já mostrava não estava à altura dos problemas. Com o coronavírus isso ficou evidente. Essa negação da realidade tem a ver com a forma como o governo lida com questões científicas. Os governos populistas de direita ao redor do mundo não prezam muito pelas evidências científicas e a gente está pagando por não dar a devida atenção a esse tipo de coisa.

O que foi feito até agora na economia é suficiente?

Agora é economia de guerra. Precisa ser feito alguma planificação, para que o sistema de preços não entre em colapso. Se as fábricas fecharem, como vai ser feito para que itens essenciais não deixem de ser produzidos? Esse tipo de levantamento não parece ter sido feito. O que foi feito até agora foi dar um remédio para febre, quando a situação requer medidas cirúrgicas. O governo precisa planificar e entender o que precisa ser produzido, garantir comida para todo mundo, remédio para todos. É preciso dar subsídios para setores específicos, para garantir a oferta de bens essenciais ou intervir diretamente na produção. Na questão logística, de levar esses itens até as pessoas, talvez o Exército pudesse ajudar.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.