Quantas vezes você já se viu ensaiando uma versão “profissional” de si mesmo antes de uma reunião importante? Ou sentiu que precisava esconder partes fundamentais de quem você é para se encaixar na cultura da sua empresa? Talvez você tenha uma paixão secreta por astronomia, mas nunca menciona isso nas conversas de trabalho. Ou cresceu em uma família humilde, mas evita falar sobre suas origens.
Se você se identifica com alguma dessas situações, não está sozinho – e o mais surpreendente é que esse esforço para criar uma “persona profissional” pode estar sabotando seu potencial de liderança. Nossa relação com identidade no trabalho tem raízes profundas na história.
O psicanalista Carl Jung já falava sobre as “máscaras sociais” que usamos em diferentes contextos, e, até recentemente, essa separação radical entre o “eu pessoal” e o “eu profissional” era vista como natural e até desejável no mundo corporativo.

Essa realidade começou a mudar com o surgimento de líderes que ousaram trazer sua identidade completa para o trabalho. Satya Nadella, CEO da Microsoft, transformou sua experiência como pai de uma criança com necessidades especiais em parte fundamental de sua visão de liderança, influenciando toda a cultura de inclusão da empresa.
Tim Cook, da Apple, mostrou como revelar sua orientação sexual fortaleceu sua capacidade de liderar autenticamente. E Ursula Burns, que se tornou a primeira mulher negra CEO de uma empresa Fortune 500, fez de suas origens humildes uma fonte de força em sua liderança da Xerox.
Pesquisas em psicologia e neurociência sugerem que suprimir aspectos de nossa identidade – um fenômeno conhecido como ‘code-switching’ – pode ser mentalmente desgastante. Estudos indicam que manter uma ‘persona profissional’ diferente de quem realmente somos pode aumentar níveis de estresse e consumir energia mental que poderia ser usada para outras tarefas.
Em contrapartida, quando nos sentimos mais livres para ser autênticos, tendemos a experimentar menos estresse e maior capacidade cognitiva.
Como observa Herminia Ibarra, acadêmica nas áreas de comportamento organizacional e liderança, em sua pesquisa publicada na Harvard Business Review, a verdadeira autenticidade na liderança não é sobre uma exposição sem filtros, mas sobre integrar de forma significativa diferentes aspectos de quem somos ao nosso papel profissional.
É como eu costumo falar: ser autêntico é diferente de falar tudo que pensa, quem fala tudo que pensa é uma criança de 3 anos. Ser autêntico é se adaptar a cada ambiente, dentro dos seus valores e identidade. É esse o pulo do gato.
Para ajudá-lo a desenvolver uma identidade profissional mais autêntica e poderosa, aqui estão sete práticas fundamentais:
1. Cultive a multiplicidade: Faça um inventário completo de seus interesses, habilidades e experiências, mesmo aqueles que parecem não ter relação direta com seu trabalho atual. Se você é um executivo financeiro que ama fotografia, use essa sensibilidade artística para enxergar problemas por diferentes ângulos. Se pratica esportes, aproveite as lições de disciplina e perseverança em sua liderança. Cada hobby, interesse ou experiência pode se tornar uma ponte para conexões significativas com colegas e clientes. Quanto mais diversa for sua identidade, mais pontos de conexão você terá com diferentes pessoas.
2. Construa sua narrativa profissional: Desenvolva uma história coerente que integre suas diferentes experiências e transições de carreira. Identifique os momentos decisivos que moldaram quem você é hoje. Se você mudou de área, explique como cada experiência contribuiu para sua perspectiva única. Se enfrentou desafios, transforme-os em lições de resiliência. Uma narrativa bem construída ajuda outros a entenderem seu valor único e torna suas contribuições mais memoráveis.
3. Harmonize suas diferentes dimensões: Em vez de tentar separar sua vida pessoal da profissional, encontre maneiras de integrar suas diferentes facetas de forma produtiva. Se você é pai ou mãe, use suas habilidades de gestão familiar para melhorar seu estilo de liderança. Se tem background internacional, aproveite essa perspectiva multicultural para resolver problemas de forma inovadora. A chave é encontrar sinergias entre suas diferentes identidades e usá-las a seu favor.
4. Alinhe autenticidade com objetivos: Desenvolva um plano estratégico para revelar aspectos de sua identidade que podem impulsionar seus objetivos profissionais. Se almeja uma posição de liderança global, comece compartilhando suas experiências internacionais. Se busca um papel mais inovador, destaque seus projetos criativos pessoais. Identifique quais elementos de sua identidade podem ser mais valiosos em diferentes contextos e situações.
5. Pratique a revelação progressiva: Comece compartilhando aspectos de sua identidade em pequenos grupos ou em situações de menor risco. Observe as reações e ajuste sua abordagem conforme necessário. Cultive relacionamentos de confiança onde você possa ser mais aberto. Use reuniões individuais, almoços informais ou projetos em equipe como oportunidades para revelar mais sobre quem você é. Lembre-se que autenticidade não significa compartilhar tudo com todos - é sobre ser estratégico e genuíno ao mesmo tempo.
6. Desenvolva seu mapa de identidade profissional: Crie um documento vivo que evolui com você. Comece listando suas competências técnicas, mas vá além. Inclua suas experiências formativas, valores fundamentais, interesses pessoais e aspirações futuras. Revise e atualize este mapa regularmente, adicionando novas habilidades, experiências e insights. Use-o como uma ferramenta de reflexão antes de entrevistas, apresentações importantes ou mudanças de carreira. Este mapa não é apenas um exercício de autoconhecimento - é um recurso estratégico para sua evolução profissional.
7. Tenha clareza de seus valores. O professor na Columbia Business School Paul Ingram desenvolveu uma pesquisa sobre como ajudar líderes a serem mais autênticos através de um exercício focado em valores pessoais. Entre as principais descobertas, está que quando líderes têm clareza sobre seus valores pessoais, se sentem mais autênticos, são percebidos como mais autênticos por observadores externos e ganham mais confiança de suas equipes.
Sua identidade é como um ecossistema em constante evolução, onde cada elemento – suas experiências, valores, interesses e aspirações – nutre e fortalece os demais. Na era da inteligência artificial e do trabalho remoto, sua autenticidade é o diferencial que nenhuma máquina pode replicar.
O sucesso profissional de longo prazo frequentemente depende não apenas de competências técnicas, mas também de nossa capacidade de trazer nossa humanidade completa para o trabalho. Em um mundo em rápida transformação, sua autenticidade pode ser não apenas uma força pessoal, mas também uma importante vantagem profissional. O futuro tende a favorecer aqueles que têm a coragem de serem genuinamente quem são.