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Tribunais do faz de conta

Escolha dos conselheiros das cortes de Contas não respeita os critérios previstos em lei

Por Suely Caldas
Atualização:

De uma longa lista de instituições que precisam mudar – para o bem da democracia e o bom uso do dinheiro público –, os tribunais de contas ganharam destaque esta semana. Se estendida para outros Estados, a Operação Quinto do Ouro, da Polícia Federal, que prendeu cinco dos sete conselheiros do tribunal do Rio de Janeiro, vai se juntar à Lava Jato para progredir o “Brasil passado a limpo” e mandar para a cadeia muita gente que faz da função de zelar pelo dinheiro da população um meio para enriquecer. No Brasil não faltam órgãos de controle da gestão pública, o que falta é confiança neles. E por quê?

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A proliferação de inquéritos contra conselheiros dos tribunais de São Paulo (cadê Robson Marinho?), Brasília (e Domingos Lamoglia?), Rio de Janeiro, Mato Grosso, Bahia, Espírito Santo, Rondônia e o pleno inteiro do pobre Amapá mostra que o problema não é pontual, não é só a má-fé de um ou outro delinquente. Trata-se de algo estrutural, é a forma de escolher os conselheiros desses tribunais que permite, facilita e abre caminho para a delinquência. Além de outros males que permeiam toda a administração pública brasileira: o não cumprimento da lei e a impunidade.

Tribunais de contas existem para fiscalizar, aprovar ou rejeitar as contas de presidentes, governadores, prefeitos, empresas estatais ou órgãos públicos sustentados com dinheiro dos impostos. O Brasil tem 33 tribunais – o da União, criado em 1890; 29 estaduais; 2 municipais (São Paulo e Rio de Janeiro); e 1 distrital (Brasília). Resumidamente, eles carregam três erros estruturais que incentivam a prática da corrupção: 1) são parte do Poder Legislativo, quando deveriam estar no Judiciário; 2) os cargos são vitalícios; e 3) o maior erro dos três, o critério de escolha dos conselheiros.

Um terço deles é escolhido pelo presidente ou governador e dois terços, pelo Congresso Nacional e Assembleias Legislativas. Pela lei, deveriam ter reputação ilibada, idoneidade moral e, pelo menos, dez anos de experiência com provas de conhecimentos jurídicos, econômico-financeiros e de administração pública. Não há respeito a esses critérios. Em geral, os escolhidos são parlamentares em idade de aposentar ou derrotados em eleições, assessores da confiança de governadores e do presidente. São aposentadorias de luxo ou nomeados com a intenção de fazer vista grossa às fraudes e aprovar as contas do governador, muitas vezes “com louvor”, como proclamava Paulo Maluf em relação à sua gestão.

Os cinco presos do Rio são políticos ligados ao ex-governador (também preso) Sérgio Cabral, ao atual, Luiz Fernando Pezão, ao presidente da Assembleia Legislativa, Jorge Picciani (PMDB), e a um filho do ex-governador Marcelo Alencar, que o nomeou há 20 anos. Nenhum deles tem os conhecimentos exigidos em lei, tampouco reputação ilibada, já que desde 2008 são acusados de corrupção em inquéritos policiais, e continuaram no exercício da função.

A Lei de Responsabilidade Fiscal foi o mais extraordinário avanço para o controle dos gastos públicos, mas, para ter aplicação eficaz, precisa de tribunais de contas independentes, que fiscalizem com rigor, denunciem corrupção e rapinagem do dinheiro público, em vez de protegerem governantes irresponsáveis. Pensando nisso, os idealizadores da Lei Fiscal tentaram passar no Congresso uma proposta de emenda constitucional com cinco itens: 1) como no Judiciário, os cargos de ministros e conselheiros seriam ocupados por técnicos de carreira e concursados; 2) o mandato seria de seis anos, não mais vitalício; 3) criar um conselho nacional para fiscalizar os tribunais de contas; 4) vedar a nomeação de funcionários apadrinhados sem concurso público; e 5) definir com precisão e rigor os critérios de notório saber e reputação ilibada.

Fracassaram. Adivinhem por quê. 

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*jornalista