BRASÍLIA - A ex-primeira-dama peruana Nadine Heredia, mulher do ex-presidente Ollanta Humala, desembarcou nesta quarta-feira, dia 16, no Brasil, após receber asilo diplomático do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Em solo brasileiro, ela formalizou à Polícia Federal (PF) um pedido de refúgio ao Brasil - o que, na prática, impede que ela seja extraditada e garante a permanência provisória no País.
O ex-presidente e sua mulher foram condenados pela Justiça do Peru em uma ação de corrupção, originada da Operação Lava Jato. Eles receberam pena de 15 anos de prisão, acusados de lavagem de dinheiro.

O ex-presidente peruano foi à audiência no tribunal e saiu de lá preso. Nadine Heredia, por sua vez, não compareceu. Em vez disso, dirigiu-se à embaixada brasileira com o filho Samir Mallko Ollanta Humala Heredia.
Ela havia comunicado anteriormente problemas de saúde, mas sua defesa negou que ela tenha tentado “enganar” a corte. Em 2023, a Justiça peruana negou uma autorização para que Nadine viajasse à Colômbia para tratamento médico oncológico, em função de um câncer.
Ollanta Humala é um político de esquerda e tinha boa relação com o presidente Lula e o Partido dos Trabalhadores. A defesa deles pretende recorrer da condenação.
Segundo o Ministério Público, Humala e Nadine Heredia teriam recebido recursos de forma ilícita em operações da construtora Odebrecht (atualmente Novonor), que atuava no país vizinho em grandes obras públicas. Além disso, também teriam sido destinatário de dinheiro enviado para campanhas eleitorais, pela ditadura chavista na Venezuela.
Nadine Heredia deu entrada na Embaixada do Brasil em Lima, com pedido de asilo diplomático, logo após o anúncio da sentença. Em coordenação com o governo peruano, o governo Lula concedeu o asilo, e ela obteve um salvo-conduto para deixar o país.
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Um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) foi deslocado ao Peru para transportar a ex-primeira-dama. Ela desembarcou na Base Aérea de Brasília no fim da manhã desta quarta. Segundo o advogado peruano Julio Espinoza Goyena disse à rede de televisão RPP, a ex-primeira-dama e o filho menor de idade decolaram por volta das 4h da manhã de Lima.
Conforme Espinoza, a decisão dela de deixar o Peru foi pessoal e por razão familiar. Ele alegou que o tribunal se antecipou ao emitir a ordem de prisão do ex-presidente e sua mulher, em vez de aguardar o direito de recurso para uma eventual confirmação ou revogação, na segunda instância.
O advogado Leonardo Massud, que assessora a defesa do ex-presidente, disse em nota que as prisões não deveriam ter sido decretadas nesta fase do processo judicial. Ele argumentou que a Justiça peruana ignorou a obtenção de provas de forma ilícita, tese que levou à anulação de condenações da Lava Jato no Brasil, e que a decisão foi baseada em delações sem comprovação da origem dos recursos.
“Como advogado que trabalhou na obtenção de documentos, provas e declarações de nulidade para eles aqui no Brasil, posso afirmar que o fundamento da decisão ignorou a evidente ilicitude de várias provas e muitas que delas derivaram, tal como ocorrido aqui em casos semelhantes da Lava Jato”, disse Massud.
Pedido de refúgio
Nadine Heredia teve reuniões em Brasília com autoridades federais para regularizar sua entrada e tratar de seu status de asilada política, bem como informar ao governo sobre seus planos de permanência no País.
Conforme o Ministério da Justiça e Segurança Pública, ela e o filho solicitaram à PF o reconhecimento da condição de refugiados ao desembarcarem na Base Aérea de Brasília. Com o pedido, a PF emitiu registros de residência provisória que autorizam a estada dela e do filho em solo nacional até a decisão final. Pelas regras da Lei Brasileira de Refúgio, não há um prazo específico.
No entanto, o pedido pode se converter em um entrave à extradição. A simples solicitação de refúgio já suspende a temporariamente a tramitação de qualquer processo de extradição que venha a ser solicitado pela Justiça peruana, até uma decisão definitiva sobre a concessão ou não do status. Até o reconhecimento da condição de refugiada, por “fundado temor de perseguição por opinião política”, uma eventual extradição de Nadine Heredia fica bloqueada.
A deliberação cabe ao Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), órgão vinculado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública. O colegiado é misto, com representantes de entidades não-governamentais e do governo. O órgão se reúne a cada 60 dias.
A presidência do Conare é do MJSP. Os integrantes vêm dos ministérios da Educação, da Saúde, do Trabalho e Emprego, das Relações Exteriores, da PF e da sociedade civil. O governo tem maioria.
O Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur) tem assento sem direito a voto. São observadores a Defensoria Pública da União, a Procuradoria-Geral da República, e os ministérios do Desenvolvimento e Assstência Social, Família e Combate à Fome, dos Direitos Humanos e da Cidadania, de Portos e Aeroportos e dos Povos Indígenas.
A decisão pode ser demorada - em geral cerca de um ano. Antes de ser levada ao Conare, o solicitante de refúgio passa por entrevista na qual pode justificar o pedido e documentar o caso. Se o refúgio for negado, cabe recurso ao ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski.
Conheça as diferenças entre asilo e refúgio:
- Asilo. É regional (América Latina) e geralmente aplicado a casos de perseguição política contra um indivíduo por crimes políticos. Pode ser dado quando a pessoa já está no Brasil (asilo territorial) ou ainda em uma embaixada brasileira no exterior (asilo diplomático). Não há cláusulas para manter o status. Mas é necessária a comprovação de efetiva da perseguição. Basta uma decisão política do presidente.
- Refúgio. Tem alcance universal. É usado em casos de proteção a um grupo de pessoas, com perseguição generalizada, por motivos religiosos, raciais, de nacionalidade, de grupo social e de opinião política. Tem com base o “fundado temor de perseguição”. O refúgio é dado fora do país de origem, e essa proteção pode ser perdida. É medida humanitária, decidida inicialmente em processo colegiado pelo Conare, com recurso ao ministro da Justiça e Segurança Pública.