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Mortadela e manteiga como ceia de Natal: Como é a marcha dos imigrantes que tentam chegar aos EUA

Caravana com cerca de 6.000 imigrantes quer atravessar fronteira com Estados Unidos passando pelo México

HUIXTLA, México — O Dia de Natal significou o mesmo que qualquer outro para milhares de imigrantes caminhando pelo sul do México: mais uma jornada sob um sol quente. Não houve presentes, e o jantar de véspera de Natal foi um sanduíche, uma garrafa de água e uma banana distribuídos pela igreja católica a alguns dos imigrantes na cidade de Álvaro Obregón, no estado sulista de Chiapas, que faz fronteira com a Guatemala.

Os imigrantes passaram a noite de Natal dormindo em um pedaço de papelão ou plástico estendido sob um toldo ou tenda, ou no chão nu. Pela manhã, era acordar como de costume às 4 da manhã, para começar cedo e evitar o pior do calor, caminhando até a próxima cidade, Huixtla, a 30 quilômetros de distância.

Imigrantes caminham ao lado do Rio Grande, na fronteira entre México e EUA Foto: CHENEY ORR

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Karla Ramírez, uma imigrante de Honduras que viajava com outros adultos e quatro crianças, chegou a Álvaro Obregón tarde demais no domingo para receber qualquer comida distribuída pela igreja. Então, eles tiveram que comprar o pouco que podiam pagar. “Foi triste: nunca, nunca estivemos na rua antes”, disse Ramírez. “Nosso jantar de Natal foi um pouco de mortadela, manteiga e tomate, com uma tortilha.” O filho de sete anos de Mariela Amaya não entendia por que eles tinham que passar o Natal dessa maneira.

Amaya, também de Honduras, puxava a mão de seu filho cansado e relutante enquanto caminhavam. “Eles não entendem por que temos que fazer isso para ter uma vida melhor”, disse Amaya. Nem os governos do México e dos Estados Unidos, disse ela. “Por que eles não podem nos ajudar? Precisamos da ajuda deles”, disse ela.

A pouca ajuda que havia vinha de famílias locais, uma das quais distribuía tamales — comida tradicional local — e água aos migrantes que passavam. Os migrantes incluíam adultos solteiros, mas também famílias inteiras, todos ansiosos para chegar à fronteira dos EUA, irritados e frustrados por terem que esperar semanas ou meses na cidade próxima de Tapachula por documentos que poderiam permitir que continuassem sua jornada.

O México afirma que não emite vistos de trânsito, mas os imigrantes continuam esperando obter algum tipo de documento para que pelo menos possam pegar ônibus para a fronteira. “Esta jornada tem sido realmente difícil para nós, imigrantes. Precisamos que o escritório de imigração (mexicano) e o governo tenham pena de nós e nos deem um passe de livre trânsito seguro”, disse Jessica García, uma imigrante da Venezuela. O México diz que detectou 680 mil imigrantes se movendo pelo país nos primeiros 11 meses de 2023.

Travessia de imigrantes na fronteira entre México e EUA num trecho do Rio Grande Foto: CHENEY ORR

Com cerca de 6.000 pessoas, a caravana de imigrantes que partiu no domingo foi a maior desde junho de 2022, quando um grupo de tamanho semelhante deixou Tapachula. E, como a caravana de 2022 — que começou enquanto o presidente dos EUA, Joe Biden, recebia líderes em Los Angeles para a Cúpula das Américas —, a caravana de Natal deste ano veio poucos dias antes de autoridades dos EUA se reunirem com seus homólogos mexicanos na Cidade do México para explorar maneiras de conter o número de imigrantes que chegam à fronteira sudoeste dos EUA.

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O governo mexicano já disse que está disposto a ajudar a tentar bloquear imigrantes de atravessar o México; o governo teve pouca escolha, depois que autoridades dos EUA fecharam brevemente duas importantes passagens ferroviárias de fronteira no Texas, alegando que estavam sobrecarregadas pelo processamento de imigrantes.

Isso provocou um estrangulamento no transporte de carga do México para os Estados Unidos, bem como no envio de grãos dos EUA para alimentar o gado mexicano. As passagens ferroviárias depois foram reabertas, mas a mensagem foi clara.

Imigrantes caminham na fronteira entre México e EUA, perto do Arizona Foto: REBECCA NOBLE

O secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, deve chegar à Cidade do México na quarta-feira, 27, para elaborar novos acordos para controlar o aumento de imigrantes que buscam entrada nos Estados Unidos. A delegação dos EUA também incluirá o secretário de Segurança Interna, Alejandro Mayorkas, e a conselheira de segurança interna da Casa Branca, Liz Sherwood-Randall.

Neste mês, até 10 mil imigrantes foram detidos por dia na fronteira sudoeste dos EUA. Em maio, o México concordou em receber imigrantes de países como Venezuela, Nicarágua e Cuba que foram rejeitados pelos EUA por não seguirem regras que forneciam novos caminhos legais para asilo e outras formas de migração.

Mas esse acordo, destinado a conter um salto pós-pandemia na imigração, parece ser insuficiente à medida que os números aumentam novamente, perturbando o comércio bilateral e alimentando o sentimento anti-imigrante entre eleitores conservadores nos EUA.

As prisões por travessia ilegal ultrapassaram 2 milhões em cada um dos últimos dois anos fiscais do governo dos EUA, refletindo mudanças tecnológicas que facilitaram os imigrantes a deixarem suas casas para escapar da pobreza, desastres naturais, repressão política e crime organizado./AP

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