CARACAS - Depois de mais de 50 sentenças que ao longo de 15 meses retiraram a conta-gotas atribuições do Legislativo venezuelano, o Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) extinguiu o poder do Parlamento, dominado pela oposição, ao derrubar as poucas competências que ainda possuía. Membros da Mesa de Unidade Democrática (MUD) e o secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), Luis Almagro, consideraram a decisão um golpe de Estado chavista.
A última estocada foi dada pela Sala Constitucional em sua sentença 156, publicada na noite de quarta-feira. Nela, a corte anunciou que exercerá “diretamente” as competências do Legislativo ou poderá delegá-las a outro órgão.
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A sentença foi firmada por quatro ex-militantes chavistas ou funcionários dos governos de Hugo Chávez e Nicolás Maduro. O TSJ acusa o Parlamento de desacato por descumprir sua ordem de remover três deputados suspensos. Esses parlamentares dariam à oposição a maioria absoluta no Legislativo, eleito em dezembro de 2015, na primeira vitória da oposição contra o chavismo em oito anos.
Com esse argumento, o tribunal retirou ao longo dos últimos meses atribuições como as de definir o orçamento nacional, convocar funcionários e até pagar o salário a seus trabalhadores. Ainda restava ao Congresso a possibilidade de produzir leis e confirmar a nomeação de embaixadores.
O presidente do Parlamento, deputado Julio Borges, anunciou que não a acatará a decisão. “Maduro deu um golpe de Estado. Qual é a diferença dessa sentença em relação às anteriores? É a primeira vez que outorgam todo o poder a Maduro para fazer as leis que quiser, para endividar o país como quiser, para perseguir os venezuelanos como quiser”, disse Borges, após rasgar uma cópia da decisão diante dos jornalistas e dizer que era um “lixo”. “Esperamos que nossas Forças Armadas sejam as primeiras guardiãs da democracia”, acrescentou.
A sentença foi tomada 48 horas após outra da mesma instância, que autorizou Maduro a “revisar excepcionalmente” várias leis em meio ao estado de exceção vigente desde janeiro de 2016. Os deputados opositores Juan Requesens, Marco Bozo, Carlos Paparoni e Amelia Belisario foram os primeiros a sair à rua. Eles sofreram agressões de agentes da Guarda Nacional e simpatizantes do governo quando se aproximaram da sede do Tribunal Supremo de Justiça, noroeste de Caracas, para “devolver a sentença”.
Ao entardecer, foram registrados protestos pacíficos em pelo menos quatro lugares no leste de Caracas, feudo tradicional da oposição. Estudantes universitários eram a maioria dos manifestantes. Eles levavam bandeiras e gritavam frases como “votei para a Assembleia, não para o TSJ”. No âmbito jurídico e acadêmico a decisão também foi rejeitada. “Um poder constituído, no caso o TSJ, ignora a Constituição e anula outro poder que foi eleito pelo voto popular”, avaliou Alí Daniels, diretor de Acesso à Justiça, uma organização que fiscaliza o Judiciário.
A corte já havia concedido a Maduro o poder de governar por decreto em temas econômicos e administrativos. Na prática, segundo analistas, a última decisão formaliza o que acontecia desde a derrota do chavismo nas urnas. Ainda assim, a medida tende a acirrar a oposição ao governo e a condenação internacional a Maduro.
“A decisão do TSJ não terá impacto prático sobre a realidade venezuelana, uma vez que desde sua posse a Assembleia Nacional não tem exercido suas prerrogativas legais”, disse o analista Luis Vicente León, da Datanálisis. “Mas desconhecer uma Assembleia eleita pelo povo e bloquear suas funções é uma ação inaceitável em uma democracia.” Ele acredita que não haverá eleições nos próximos meses.
O governador de Miranda e líder opositor, Henrique Capriles, criticou o que chamou de “Madurazo”, em referência ao “Fujimorazo” – autogolpe do então presidente peruano Alberto Fujimori, que fechou o Congresso em 1992 para governar com plenos poderes. O deputado chavista Diosdado Cabello pediu à militância que se aliste “para defender o país de uma eventual intervenção militar do imperialismo e inimigos internos”. / COM AFP, AP e EFE
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