PUBLICIDADE

OMS aponta origem animal para vírus na China; EUA e 13 países criticam relatório

Análise produzida por especialistas internacionais e chineses descarta possibilidade de fuga de laboratório, mas diretor da agência pede nova investigação e critica Pequim por falta de transparência e por limitar acesso dos investigadores

PUBLICIDADE

Foto do author Redação
Por Redação

GENEBRA - A missão conjunta da Organização Mundial de Saúde (OMS) e da China para investigar as origens da covid-19 indicou que o novo coronavírus provavelmente foi transmitido de morcegos para os humanos por meio de um outro animal. O relatório dá as primeiras respostas sobre o início da crise sanitária, questão que continua a provocar tensão entre Pequim e Ocidente.

PUBLICIDADE

Composta por 17 especialistas internacionais e 17 especialistas chineses, a missão crê ser “entre provável e muito provável” que o vírus tenha pulado de um morcego para um animal intermediário e, então, para os humanos. Vírus similares, afirmaram, foram encontrados em pangolins.

Os Estados Unidos e 13 aliados - entre eles Reino Unido, Canadá, Austrália, Japão e Coreia do Sul - expressaram nesta terça-feira, 30, preocupação com o relatório e exortaram a China a fornecer "acesso total" aos especialistas. A nota indica que a missão apoiada pela OMS na China "foi significativamente atrasada e não teve acesso aos dados e amostras originais e completos".

Wuhan recuperou o movimento em comparação a um ano atrás, quando o governo decretou 'lockdown'. Foto: EFE/EPA/ROMAN PILIPEY

"É essencial que especialistas independentes tenham acesso total a todas as pessoas, animais e dados ambientais, pesquisas e pessoal envolvido nos estágios iniciais do surto, que são relevantes para determinar como esta pandemia surgiu", acrescenta o comunicado, sem criticar explicitamente a China. Outros países que assinaram a declaração conjunta foram República Checa, Dinamarca, Estônia, Israel, Letônia, Lituânia, Noruega e Eslovênia.

Os governos também acusam a OMS de ser demasiadamente mansa diante da China. O governo de Trump chegou a dar entrada no processo para sair do órgão sanitário argumentando que a agência era demasiadamente pró-Pequim, algo revertido pelo presidente Joe Biden já no dia da sua posseA demanda por uma investigação independente sobre a origem do vírus, por si só, foi fortemente impulsionada pelos americanos.

Críticos também apontam para a falta de transparência e acusam Pequim de manipular o relatório, sinalizando que vários dos cientistas chineses responsáveis pela coleta dos dados posteriormente analisados pela missão da OMS têm filiação com o governo. A divulgação do documento supostamente atrasou devido a negociações com o governo chinês que, por meses, pôs obstáculos para que a missão internacional chegasse à Wuhan.

Mamífero encontrado em zonas tropicais da Ásia, pangolins podem ter sido animal intermediário na transmissão do novo coronavírus para humanos. Foto: Freeland Foundation/AP

Em uma entrevista recente à CNN, o secretário de Estado de Biden, Antony Blinken, disse ter preocupações reais com a metodologia e o processo aplicados no relatório da OMS, incluindo o fato de que Pequim aparentemente ajudou a escrevê-lo. O governo chinês, que nega todas as acusações de negligência e omissão, reagiu. "Os EUA estão falando sobre o relatório. Ao fazer isso, será que não são os americanos que estão tentando pressionar os integrantes do grupo de especialistas da OMS?", indagou Zhao Lijian, porta-voz da Chancelaria.

Publicidade

A investigação

A equipe de investigação da OMS passou 27 dias em Wuhan, cidade no centro da China onde surgiram os primeiros casos de covid-19, e as descobertas vêm à tona quase 14 meses depois do primeiro caso. Desde então, a pandemia já infectou mais de 126 milhões de pessoas e matou 2,7 milhões. Apesar das vacinas desenvolvidas em tempo recorde, variantes mais contagiosas se alastram e levam diversas regiões a implementarem quarentenas.

A análise mais completa até o momento sobre a origem da pandemia, tópico essencial para evitar crises sanitárias futuras, não traz grandes surpresas e recomenda estudos mais aprofundados sobre várias, porém pouco prováveis, teorias. A única exceção é a hipótese de que o patógeno teria escapado do Instituto de Virologia de Wuhan — suposição promovida sem qualquer embasamento pelo ex-presidente americano Donald Trump. De acordo com a missão de especialistas, é "extremamente improvável" que isso tenha acontecido. Incidentes deste tipo, ressalta o documento, são raros e sequer há registros de patógenos próximos ao coronavírus em laboratórios da cidade antes de dezembro de 2019.

Seguranças acompanham membros da missão da OMS em visita ao Instituto de Virologia de Wuhan Foto: Hector Retamal/AFP

A missão da OMS nunca teve por finalidade identificar exatamente a origem do vírus, já que isso costuma levar anos. Até hoje, por exemplo, não se pode afirmar com acurácia qual espécie de morcego é responsável pelo ebola, algo estudado há 40 anos. Sabe-se, contudo, que os morcegos carregam coronavírus e, até hoje, o patógeno mais próximo do Sars-CoV-2 de que se tem conhecimento foi encontrado em morcegos.

Animais e a doença

Os especialistas recomendam ainda estudos adicionais sobre animais domesticáveis que possam ser suscetíveis ao Sars-CoV-2, o causador da covid-19, como gatos e visons. Segundo o relatório, também não está claro se o mercado central de Huanan foi o marco zero do vírus, ou apenas o lugar onde começou a circular em maior escala. O local, onde os primeiros pacientes frequentavam ou trabalhavam, vendia carnes exóticas e animais vivos.

Cientista trabalha em instalações de segurança no Instituto de Virologia de Wuhan Foto: JOHANNES EISELE / AFP

Além disso, o documento listauma possível, mas "improvável", cadeia de transmissão entre animais e humanos por meio de carnes congeladas. Isso havia sido descartado pela OMS, porém há vozes influentes na China que defendem que o vírus chegou a Wuhan por meio de embalagens contaminadas. A inclusão da hipótese aumentou ainda mais o ceticismo ao redor do relatório, já alvo de críticas antes mesmo dos especialistas desembarcarem em Wuhan. / AFP e NYT

Publicidade