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Paul Krugman: De Santis não é melhor do que Trump, como comprovam suas teorias da conspiração

Provável adversário de Donald Trump nas primárias do Partido Republicado propaga conspirações contra a vacina de covid-19

Por Paul Krugman (The New York Times)
Atualização:

Os republicanos mais uma vez nomearão Donald Trump para presidente? Ou eles vão recorrer a Ron DeSantis? Eu não faço ideia.

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Mas qualquer um que imagine DeSantis como uma figura mais sensata e mais sã do que Trump – que ele seja um populista de direita sem a paranóia que nega a realidade – está delirando. DeSantis não caiu nas mesmas armadilhas que Trump, mas caiu em algumas, e sua descida foi profunda.

Acima de tudo, DeSantis está se tornando cada vez mais o rosto das teorias da conspiração de vacinas, que transformaram um milagre médico em uma fonte de amarga divisão partidária e contribuíram para milhares de mortes desnecessárias. Vamos voltar e falar sobre a história das vacinas contra a covid-19 até agora.

Imagem mostra governador da Flórida, Ron DeSantis (esq.), ao lado do então presidente Donald Trump em visita de Trump à Flórida, em 29 de março de 2019. Os dois devem disputar as primárias do Partido Republicano para a próxima eleição Foto: Manuel Balce Ceneta / AP

Na primavera de 2020, o governo dos EUA iniciou a Operação Warp Speed, uma parceria público-privada destinada a desenvolver vacinas eficazes contra o coronavírus o mais rápido possível. O esforço deu certo: em dezembro de 2020, muito antes do que quase todos imaginaram ser possível, as vacinações estavam em andamento. (Recebi minha primeira injeção no mês seguinte, em 28 de janeiro de 2021.) E sim, foi um sucesso para o governo Trump.

As vacinas funcionaram? E como. Existem várias maneiras de avaliar seu efeito salva-vidas, mas estou especialmente interessado em uma abordagem simples promovida pelo pesquisador Charles Gaba, que analisa a correlação nos distritos dos EUA entre as taxas de vacinação e as taxas de mortalidade por covid. Entre maio de 2021, quando a vacinação em duas doses se espalhou pela primeira vez, e setembro de 2022, os 10% menos vacinados dos condados tiveram uma taxa de mortalidade mais de três vezes maior que a dos mais vacinados.

Agora, você deve ter ouvido que, neste momento, as mortes entre os americanos vacinados estão excedendo as dos não vacinados, o que é verdade. Mas isso ocorre em parte porque a maioria das mortes ocorre entre os idosos, que são predominantemente vacinados; muito poucos americanos não receberam nenhuma injeção; e não há pessoas vacinadas suficientes recebendo vacinas de reforço.

Mas por que alguns distritos dos EUA são muito menos vacinados do que outros? A resposta, como mostra Gaba, é o partidarismo: há uma relação surpreendentemente próxima entre a parcela de eleitores de um condado que apoiou Trump em 2020 e a porcentagem de residentes desse local que não receberam suas vacinas - e a porcentagem que morreu de covid.

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A propósito, você pode ver os mesmos padrões no nível de Estados inteiros. Por exemplo, embora Nova York tenha sido duramente atingida nos primeiros meses da pandemia (antes de sabermos como o coronavírus se espalhou ou quais precauções tomar), desde maio de 2021 mais do que o dobro de pessoas morreram de covid na Flórida do que em Nova York. Mesmo levando em consideração a população um pouco maior e muito mais velha da Flórida, são milhares de mortes em excesso no Estado.

Mas por que a vacinação deveria ser uma questão partidária? A oposição da direita a lockdowns e distanciamento social nos estágios iniciais da pandemia fazia pelo menos algum sentido, uma vez que essas medidas de saúde pública envolviam a exigência de que as pessoas fizessem sacrifícios para proteger a vida de outras pessoas. (Alguns podem dizer que tais trocas são o que a civilização é, mas tanto faz.) Mesmo a obrigatoriedade do uso de máscaras exigia aceitar um pouco de inconveniência, em parte pelo bem dos outros.

Mas ser vacinado é principalmente se proteger. Por que você não gostaria de fazer isso? A resposta imediata é a crença generalizada na direita de que as vacinas têm efeitos colaterais terríveis. Essa crença é difícil de justificar: se fosse verdade, não deveria haver muitas evidências para tais alegações, visto que mais de 13 bilhões de doses foram administradas em todo o mundo?

Ah, mas os suspeitos de sempre afirmam que as elites sinistras estão suprimindo as evidências. O que nos traz de volta a DeSantis, que anunciou na terça-feira que estava formando um comitê estadual para contrariar as recomendações federais de política de saúde - e pedindo uma investigação sobre “crimes e contravenções” não especificados relacionados às vacinas contra o coronavírus.

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OK, duvido que alguém acredite que DeSantis conheça ou se importe com as evidências científicas. Em vez disso, o que ele está fazendo é atender a uma base republicana que iguala ouvir especialistas, em saúde pública ou qualquer outra coisa, com ideologia identitária e “woke” e demoniza qualquer um que diga coisas que não quer ouvir.

Tanto quanto eu posso dizer, DeSantis não se juntou a nomes como Elon Musk para pedir a prisão de Anthony Fauci, que liderou a resposta dos EUA à covid. Mas ele chamou Fauci de “pequeno elfo” e disse que deveríamos “lançá-lo através do Potomac” (tão presidencial…).

Agora, a tentativa de DeSantis de se posicionar como o líder do movimento anti-vacina e dar pelo menos aprovação tácita às teorias da conspiração realmente cativará a base republicana? Mais uma vez, não sei. Mesmo que isso aconteça, suspeito que o prejudicará nas eleições gerais se ele se tornar candidato: a paranóia da vacina e o ódio de Fauci ainda são impopulares entre o eleitorado em geral.

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Mas qualquer um que imagine que substituir Trump por DeSantis como líder do Partido Republicano sinalizaria um partido em seu caminho para se tornar são novamente, terá um choque brutal.

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