Rascunho de parecer sugere que maioria na Suprema Corte dos EUA apoia derrubar garantia ao aborto

Se confirmada, a decisão acaba com meio século de proteção constitucional federal à garantia ao aborto e permite que cada Estado decida se restringe ou proíbe a interrupção da gravidez

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A Suprema Corte dos Estados Unidos deve votar para derrubar a histórica decisão Roe versus Wade, de acordo com uma minuta de uma decisão assinada pelo juiz conservador Samuel Alito que circulou no tribunal em fevereiro e foi publicada na noite de segunda-feira, 2, pelo site americano Politico.

O projeto opõe-se à decisão de 1973 que estabeleceu o aborto como um direito constitucional até entre 22 e 24 semanas de gestação, além de uma decisão subsequente de 1992 — a chamada Planned Parenthood versus Casey — que manteve amplamente o direito.

O site deixa claro, no entanto, que a decisão ainda pode ser alterada — uma decisão só é definitiva quando publicada pelo tribunal.

De acordo com o Politico, o impacto imediato da decisão, se confirmada, seria acabar com meio século de proteção constitucional federal dos direitos ao aborto e permitir que cada Estado decida se restringe ou proíbe a interrupção da gravidez.

O documento vem à tona em um momento em que muitos estados governados por republicanos querem aproveitar o atual equilíbrio de forças do Supremo — com seis juízes conservadores contra três progressistas — para restringir ou reverter a sentença do caso Roe versus Wade.

Manifestantes fazem protesto contra o aborto em frente à Suprema Corte dos EUA, em 21 de janeiro de 2022  Foto: Leigh Vogel/The New York Times

‘Roe vs Wade foi um erro’

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Alito chamou a decisão Roe versus Wade de errada e disse que a questão controversa, que anima debates políticos nos EUA há mais de uma geração, deve ser decidida por políticos, não pelos tribunais. A agência Associated Press não pôde confirmar imediatamente a autenticidade do rascunho que o Politico postou em seu site.

“Roe (caso) estava flagrantemente errado desde o início”, afirma o projeto de parecer. “Nós consideramos que Roe e Casey devem ser anulados”, acrescenta, referindo-se também a outro caso, o Planned Parenthood versus Casey, de 1992, que reafirmou a conclusão de Roe de um direito constitucional aos serviços de aborto, mas permitiu que os Estados colocassem algumas restrições à prática.

Segundo o Politico, outros quatro juízes conservadores —Clarence Thomas, Neil Gorsuch, Brett Kavanaugh e Amy Coney Barrett— teriam endossado a posição de Alito, indicado pelo ex-presidente George W. Bush para a mais alta corte do país em 2006.

Os magistrados da ala progressista —Stephen G. Breyer, Sonia Sotomayor e Elena Kagan—, que devem formar dissidência, estariam atuando para tentar convencer colegas a mudar de posição. Não está claro como Jonh Roberts, moderado, planejava votar.

Em geral na Suprema Corte americana, depois de uma argumentação oral e da votação inicial entre os ministros, um deles recebe a opinião majoritária e elabora uma minuta, que em seguida é distribuída aos demais. Este é o documento divulgado pelo Politico nesta segunda. Entre essa votação inicial e a decisão final, porém, a posição de cada juiz pode mudar. Uma decisão só é definitiva quando é publicada pelo tribunal.

Vazamento inédito

O projeto de parecer afirma que não há direito constitucional de serviços de aborto e permitiria que os Estados tivessem independência para regular mais fortemente ou banir totalmente o procedimento.

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A divulgação do documento de 98 páginas é inédita nos tempos modernos. Na história do tribunal, os primeiros rascunhos de parecer nunca vazaram antes que a decisão final fosse anunciada. Os primeiros rascunhos muitas vezes mudam no momento em que a decisão do tribunal é anunciada.

Mas se os juízes anunciarem uma sentença nos moldes do rascunho inicial, será uma mudança sísmica na lei e na política americanas, ocorrendo apenas a alguns meses das eleições de meio de mandato que decidirão quem controla o poder no Capitólio.

O aborto há muito divide os dois partidos – e o país – embora tenha regredido como uma questão central nos últimos anos. Uma decisão judicial nos moldes da do esboço inicial pode desencadear novas batalhas políticas no Congresso e nos Estados de todo o país sobre se e como o procedimento deve ser limitado.

O site publicou o que foi rotulado como um “primeiro rascunho” do “Parecer da Corte” em um caso que contesta a proibição do aborto após 15 semanas no Estado do Mississippi. A Suprema Corte ainda não emitiu uma decisão sobre o caso. Espera-se que o tribunal decida sobre ele antes que seu mandato termine, no fim de junho ou início de julho.

O Politico disse apenas que recebeu “uma cópia da minuta do parecer de uma pessoa familiarizada com os procedimentos do tribunal no caso do Mississippi, juntamente com outros detalhes que comprovam a autenticidade do documento”./AP e NYT

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