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Um paradoxo chamado Faixa de Gaza; leia o artigo

Quando escutamos o nome Gaza, sentimos como se fosse um lugar perigoso e pobre; é verdade, mas nem sempre foi assim

Por André Lajst*

Já estamos acostumados a acompanhar, de tempos em tempos, notícias de confrontos violentos na Faixa de Gaza. Israel e grupos radicais palestinos que controlam a região já se enfrentaram em pelo menos cinco operações de larga escala, além de eventuais atritos pontuais. Milhares de palestinos e centenas de israelenses já morreram e se feriram. Quando escutamos o nome Gaza, sentimos como se fosse um lugar perigoso e pobre. É verdade, mas nem sempre foi assim.

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Gaza sempre foi um lugar lindo, com praias claras e um mar propício para pesca. Nas décadas de 70 e 80, turistas israelenses lotavam hotéis e lojas de móveis, época em que a região era controlada na sua totalidade por Israel. Não havia cercas ou muros e palestinos podiam trabalhar em Israel sem nenhuma dificuldade.

Com a primeira intifada entre 1987 e 1992 e os Acordos de Oslo que trouxeram do exilio a OLP (Organização para Libertação da Palestina), o primeiro governo palestino da história foi formado e passou a controlar então as populações palestinas que viviam sob monitoramento israelense. Gaza começou a ficar um pouco mais fechada até a saída total de Israel em 2005 da região. Dois anos depois, o Hamas expulsou a Autoridade Palestina e passou a ser o poder soberano de fato.

Palestinos entram em confronto com forças de segurança de Israel na cidade de Nablus, na Faixa de Gaza  Foto: Jaafar Ashtiyeh / AFP

Para que o sonho dos palestinos de terem um país e um lar nacional independente e próspero se concretize, eles precisam de um governo único que seja soberano em um território específico e que este governo negocie com Israel e seja reconhecido pelo mundo como uma entidade legítima. Mas justamente o contrário está acontecendo.

O controle do Hamas e da Jihad Islâmica Palestina sobre Gaza não contribue para que o povo palestino tenha um país, muito pelo contrário. Também podemos afirmar com segurança, que as liberdades individuais dos palestinos em Gaza diminuíram drasticamente nos últimos 20 anos, o que nos leva a conclusão paradoxal de que os palestinos em Gaza tinham mais liberdades quando Israel os governava, do que quando os próprios palestinos passaram a governar a região.

As ondas de violência parecem sistêmicas. Os grupos Jihad Islâmica e Hamas não reconhecem o direito de Israel existir, não pretendem fazê-lo e qualquer negociação com o Estado Judeu gira em torno apenas de questões comerciais ou de cessar-fogo frágeis mediadas pelo Egito. Caso a ideologia desses grupos não mude, as chances de um processo de paz com base em dois Estados que envolva os grupos de Gaza é zero.

Isso nos leva ao outro paradoxo, o de soluções provisórias para que um ambiente de não violência prevaleça e a população de Gaza tenha mais oportunidades de crescimento econômico. Para isso, Israel precisa abrir ao máximo o bloqueio implementado desde 2007, após a tomada do Hamas da região.

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O dilema de Israel está justamente nisso: quanto maior a abertura, mais próspera Gaza se torna, e mais armas ou munições os grupos terroristas que controlam Gaza conseguem traficar ou produzir, aproximando ambas as partes de um próximo conflito. O bloqueio total do enclave cortaria totalmente o acesso dos grupos radicais a materiais bélicos mas acarretaria uma crise humanitária sem precedentes e portanto está fora de cogitação, assim como uma retomada da região por parte de Israel, algo que poderia acontecer apenas mediante uma guerra de longa duração com milhares de mortos.

Nos resta apenas nos apoiar na moralidade, na religião e no tempo. Um acordo de paz entre israelenses e palestinos só será possível quando a Faixa de Gaza e a Cisjordânia tiverem um governo unitário, e este governo reconheça o direito à legitimidade de existência de Israel. Para que isso aconteça, os grupos radicais da Faixa de Gaza precisariam mudar sua ideologia ou deixar de existir. Quanto mais controle eles têm da política e da sociedade palestina, menor a chance dos palestinos serem livres e finalmente conquistarem um merecido lar nacional.

*André Lajst é cientista político, professor, doutorando em Ciências Sociais pela Universidade de Córdoba, Espanha e presidente-executivo da StandWithUs Brasil

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