Entenda o veredicto de inquérito sobre o caso Jean Charles

Júri respondeu a 12 questões antes de dar seu veredicto de inconclusivo ao caso.

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Por Da BBC Brasil
Atualização:

O júri do inquérito que investigou as circunstâncias da morte do brasileiro Jean Charles de Menezes em Londres respondeu a 12 questões sobre o caso antes de dar seu veredicto de inconclusivo, nesta sexta-feira. O júri permaneceu reunido por sete dias para deliberar sobre as perguntas apresentadas pelo juiz-legista que presidiu o inquérito e para decidir o veredicto. Veja abaixo as questões respondidas pelo júri: SOBRE OS MOMENTOS FINAIS Pergunta: "O policial atirador C12 gritou 'polícia armada'"? Resposta: Não Pergunta: "Jean Charles de Menezes se levantou de seu assento antes de ser imobilizado pelo policial Ivor"? Resposta: Sim Pergunta: "Jean Charles de Menezes se movimentou na direção de C12 antes de ser imobilizado por Ivor" ? Resposta: Não As três questões acima estavam voltadas para os momentos finais da vida de Jean Charles de Menezes, quando ele foi cercado pelos policiais no metrô de Londres. Os policiais que estavam no vagão sustentavam que um grito de advertência foi feito antes de dois deles abrirem fogo contra Jean Charles. Mas os passageiros que estavam sentados no mesmo vagão disseram não ter ouvido nenhuma advertência. Rachel Wilson e seu namorado, Ralph Livock, estavam sentados em frente a Jean Charles no vagão e disseram no inquérito que nada foi dito para alertá-los antes dos disparos. Um dos policiais que estavam chegando ao vagão, segundos antes dos disparos, disse ter ouvido várias advertências verbais. Em seu depoimento, o policial C12, o primeiro dos dois que dispararam, disse ao júri que não tinha idéias pré-concebidas sobre como ia abordar Jean Charles. Ele disse ter decidido disparar tiros fatais porque Jean Charles se levantou e se movimentou na direção da arma apontada para sua cabeça. Ele disse ter concluído que Jean Charles estava prestes a detonar uma bomba e que precisava ser morto para que as outras pessoas fossem protegidas. Um policial da área de vigilância disse ter imobilizado Jean Charles antes dos disparos. A maioria no júri discordou do relato. Eles disseram que aceitavam o fato de Jean Charles ter se levantado, mas disseram não acreditar que ele tivesse andado na direção da arma. SOBRE AS CIRCUNSTÂNCIAS MAIS AMPLAS DA OPERAÇO O juiz-legista que presidiu o inquérito também pediu ao júri que considerasse quais destes fatores contribuíram ou não para a morte. A cada uma das questões o júri podia responder: 'sim', 'não', ou 'não podemos decidir'. Fator: "A pressão sobre a polícia após os ataques suicidas de julho de 2005". Resposta: Não podemos decidir Fator: "Uma falha em obter e fornecer para os policiais de vigilância imagens melhores de Hussain Osman (suspeito de planejar ataques frustrados em Londres um dia antes da morte do brasileiro)". Resposta: Sim Fator: "Uma dificuldade geral em fornecer a identificação do homem sob vigilância em tempo viável". Resposta: Não Fator: "O fato de que as visões dos policiais de vigilância em relação à identificação não foram comunicadas de maneira clara para a equipe de comando e para os atiradores". Resposta: Sim A Polícia Metropolitana (Scotland Yard) nunca havia passado por uma situação como essa. Ainda se recuperando dos ataques de 7 de julho, a cidade acordou no dia 22 sabendo que outros quatro suicidas estavam aparentemente à solta. Os recursos eram - para colocar de maneira suave - escassos, mas o júri não conseguiu decidir se a pressão sobre a corporação teve algum papel na tragédia. No espaço de algumas horas, a equipe ligou um dos suicidas a um crachá de uma academia de ginástica encontrado em um dos locais que foram alvo dos ataques frustrados do dia 21, e dali para o prédio de apartamentos onde Jean Charles de Menezes também morava. Durante o inquérito, o júri ouviu que alguns dos policiais de guarda no prédio não tinham a imagem do suspeito pelo qual procuravam. Muitos dos policiais de vigilância observando o prédio tinham visto apenas uma imagem ruim de Osman. Alguns dos policiais haviam visto uma foto de Osman no crachá da academia de ginástica, mas a foto era borrada e superexposta, fazendo com que sua pele parecesse mais clara. Outra foto, do dia de seu casamento, também encontrada no local, era mais nítida, mas não havia sido divulgada da mesma forma. A maioria do júri concluiu que essa falta de uma foto decente do suspeito era um fator mais importante na tragédia do que o fato de que ninguém podia identificar o próprio Jean Charles de Menezes. O júri disse que a confusão sobre o que exatamente as equipes de vigilância pensavam sobre quem eles estavam seguindo também teve influência no desfecho do caso. O policial de vigilância que estava mais próximo ao prédio, Frank, disse que havia saído para urinar quando Jean Charles saiu - por isso, não pôde ajudar na identificação. A Sala de Operações notou que o sujeito vigiado seguia a descrição de Osman, e um dos policiais disse que ele era "possivelmente idêntico". Outro policial de vigilância disse à Sala de Operações que o pedido para uma porcentagem de certeza era "ridículo". Quando Jean Charles chegou ao metrô, a comandante Cressida Dick disse que ele precisava ser impedido de entrar no sistema de transporte. Em seu depoimento, Charlie 2, o segundo atirador, disse ao júri que havia ouvido pelo rádio que os policiais de vigilância haviam identificado positivamente o homem. Fator: "O fato de a polícia não ter conseguido garantir que Jean Charles fosse detido antes de chegar ao metrô". Resposta: Sim O comandante John McDowell, atualmente coordenador nacional de operações de contraterrorismo, estabeleceu a estratégia para o dia logo nas primeiras horas daquela sexta-feira. Os agentes de vigilância iriam cercar o prédio e receberiam apoio de equipes de policiais armados. Pelo plano, qualquer pessoa que deixasse o prédio de apartamentos seria detida e liberada longe dali. A idéia era isolar o prédio e seus ocupantes - mas sem alertar os supostos suicidas, caso eles tivessem explosivos em seu poder. O prédio fica em um beco sem saída, o que tornava impossível a permanência em frente à porta de entrada sem chamar a atenção. A porta da frente era uma entrada comum a todos e, por isso, os policiais não sabiam de que apartamento vinham as pessoas que passavam por ali. Quando Jean Charles deixou o prédio, as equipes armadas ainda não estavam em posição de deter o possível suspeito, como estabelecia o plano estratégico. Em poucos minutos, o brasileiro já estava dentro um ônibus circulando por Londres, com policiais o seguindo e tentando descobrir se ele era ou não uma ameaça. Fator: "O comportamento inocente de Jean Charles aumentando as suspeitas". Resposta: Não Policiais que estavam seguindo Jean Charles afirmaram que o brasileiro estava nervoso e agindo de maneira estranha. Depois, soube-se que o eletricista estava, na verdade, provavelmente atrasado para o trabalho, no norte de Londres. Quando o ônibus em que Jean Charles chegou ao centro de Brixton, ele desceu e caminhou em direção à estação de metrô até que, repentinamente, voltou atrás e subiu em um ônibus. Os agentes de vigilância são treinados para procurar por pessoas que mudam de direção repentinamente na tentativa de despistá-los. Na verdade, porém, a estação de metrô estava fechada devido ao caos provocado pelas medidas de reforço na segurança da cidade. Fator: "O fato de que o time de comando não sabia a posição dos carros em que estavam as equipes de policiais armados à medida que se aproximavam da estação de metrô de Stockwell". Resposta: Sim. Fator: "Problemas nos sistemas de comunicação entre as várias equipes de policiais". Resposta: Sim Fator: "O fato de não se ter concluído, na ocasião, que os agentes de viglância poderiam ter sido usados para deter Jean Charles na estação de Stockwell". Resposta: Sim. O inspetor-chefe Greg Purser era um dos oficiais envolvidos na operação. Ele disse no inquérito que os agentes estavam sob "pressão desmedida" e diante de um "dilema aterrador". As decisões precisavam ser tomadas em questão de segundos ou minutos - e não calmamente, em horas, como em outras investigações. "Nós colocamos pressão desmedida, especialmente nos agentes de vigilância e, então, especialmente nas equipes armadas", disse. "Nós tinhamos uma missão enorme naquela manhã", acrescentou. "Para tentar levar a operação ao nível que nós gostaríamos, possivelmente seria preciso um dia inteiro. Nós estávamos tentando fazer isso em um curto período de tempo. É extremamente difícil." "Nós exigimos tanto das nossas equipes de vigilância e nós exigimos muito de nossas equipes armadas", concluiu. 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