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Opinião|Inteligência artificial na Medicina

ONG Zoé usa IA para levar saúde à região amazônica. É uma ferramenta poderosa que, sempre em conjunto com os profissionais de saúde, pode ajudar a melhorar a saúde humana

Por Marcelo Averbach e Ricardo Betti

Os avanços tecnológicos têm exercido impacto inquestionável sobre a Medicina no que se refere ao diagnóstico e ao tratamento. Entre as tecnologias disponíveis, destacam-se a ressonância nuclear magnética e o PET-CT, as terapias biológicas, as imunoterapias e as tecnologias envolvidas nos procedimentos cirúrgicos, como a laparoscopia, algumas formas de energia utilizadas durante os procedimentos e a cirurgia robótica, aplicada num crescente número de pacientes que se beneficiam com abordagens menos invasivas e, consequentemente, melhor recuperação pós-operatória.

Nos últimos anos, a inteligência artificial (IA) e o machine learning (ML) têm revolucionado o campo médico. Enquanto a IA representa sistemas inteligentes que tendem a simular a inteligência humana, o ML tem foco no aprendizado de máquinas por meio de dados apresentados ou mesmo experiências anteriores, sem a necessidade de programação específica: a máquina aprende por meio de padrões e aplica o aprendizado em situações futuras semelhantes.

A IA e o ML têm sido empregados em diversas áreas da Medicina, incluindo a interpretação de eletrocardiogramas, a contagem de leucócitos, a análise de imagens como fotografias da retina e interpretação de lesões de pele, a avaliação de imagens radiológicas, anatomia patológica e endoscopia digestiva. Na colonoscopia, a IA tem sido importante para detectar diminutas lesões, alertando o médico para uma atenção especial de forma a evitar que pequenos pólipos deixem de ser diagnosticados, melhorando, assim, a acurácia do método.

Algumas pequenas alterações decorrentes de resíduos fecais ou mesmo bolhas podem ser marcadas pelo dispositivo e não ser de fato um pólipo, daí a importância do médico treinado para definir o diagnóstico final e a conduta mais acertada. Entretanto, a utilização da IA permite não apenas a melhora na identificação das lesões colorretais, mas também o diagnóstico diferencial entre elas.

Desta forma, as lesões hiperplásicas, que têm um comportamento menos preocupante, são distinguidas das neoplásicas, que têm potencial de transformação para o câncer. Assim, a IA também auxilia na definição de quais lesões necessitam de um tratamento específico.

Estudos recentes mostram, ainda, uma superioridade na avaliação de um especialista treinado quando comparado ao sistema acoplado à IA, porém o impacto clínico da IA aplicada à colonoscopia tem se mostrado muito importante, aumentando a taxa de detecção de adenomas e, assim, reduzindo o risco do desenvolvimento do câncer, também definindo de forma mais precisa os intervalos entre os procedimentos para seguimento.

A ONG Zoé, que atua às margens do Rio Tapajós atendendo a população ribeirinha, levou a laparoscopia à pequena cidade de Belterra (PA), fazendo as primeiras cirurgias por esta via na região e também a IA em colonoscopias para rastrear o câncer colorretal naquela pequena cidade, com ótimos resultados. O uso consciente desta nova tecnologia pode não somente trazer precisão no diagnóstico, como também poupar tempo dos profissionais, que podem dedicá-lo aos cuidados dos pacientes, em vez de despendê-lo na elaboração de documentos.

Por fim, a IA tem sido incorporada na elaboração de textos sobre os mais diversos assuntos, incluindo aqueles com finalidade científica. Tais aplicações têm sido alvo de críticas severas.

É importante ressaltar que a IA está em fase de desenvolvimento e a sua aplicação clínica deve ser cautelosa, lembrando que, por garantia de segurança, deve ser vista como uma importante ferramenta com futuro promissor, mas que na atualidade não substitui de forma alguma os profissionais de saúde.

Como disse John McCarthy, um dos pioneiros da IA e que cunhou esse termo em 1956, “nós queremos que as máquinas façam as coisas que exigem inteligência quando realizadas por pessoas”. A IA é uma ferramenta poderosa que pode ajudar a melhorar a saúde humana, mas sempre em conjunto com os profissionais de saúde.

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SÃO, RESPECTIVAMENTE, LIVRE-DOCENTE PELA CLÍNICA CIRÚRGICA DA FMUSP, FUNDADOR DA ONG ZOÉ, DOCENTE DA PÓS-GRADUAÇÃO DO INSTITUTO SÍRIO LIBANÊS DE ENSINO E PESQUISA; E MÉDICO PELA FMUSP, MASTER OF SCIENCE PELA MIT SLOAN SCHOOL OF MANAGEMENT, CHAIRMAN DO CONSELHO CONSULTIVO DO MIT CLUB - BRASIL E CONSELHEIRO DA ONG ZOÉ

Opinião por Marcelo Averbach e Ricardo Betti