Opinião | Sem tempo a perder: equidade de gênero no mercado jurídico

A diversidade e a inclusão, também e especialmente nos espaços de decisão, são essenciais para as pessoas, o ambiente e os negócios

Por Glaucia Lauletta

Uma rápida verificação na lista de novos estudantes ingressos nas faculdades de Direito, ou mesmo das classes já formadas, evidencia que o mercado jurídico tem recebido cada vez mais mulheres. Essas profissionais já formam a maioria nos escritórios de advocacia, dos pequenos aos grandes, em todas as áreas e localidades do País.

Contudo, embora as mulheres ocupem um espaço de destaque na chamada “base da pirâmide”, sabemos que as lideranças ainda sofrem com a baixa presença feminina. Entre sócios, gestores e conselheiros, a participação masculina é predominante. A necessidade de mudarmos esse cenário é urgente, pois está mais do que demonstrado que a diversidade e a inclusão, também e especialmente nos espaços de decisão, são essenciais para as pessoas, o ambiente e os negócios.

Justamente com o objetivo de estimular o aumento da participação feminina nas lideranças dos escritórios de advocacia, foi criada, em 2023, a Aliança Jurídica pela Equidade de Gênero, que conta com representantes de treze escritórios de âmbito nacional. Desde então, fomentamos discussões profundas a respeito da simetria de oportunidades e sobre quais iniciativas seriam primordiais para que ela fosse garantida e ampliada.

Sabemos que o caminho é longo e que há desafios a serem enfrentados. As sociedades têm características, históricos e estratégias distintas, e cada qual terá seu próprio momento para abordar o tema e, verdadeiramente, oferecer oportunidades equânimes às suas profissionais. No entanto, aprendemos ao longo das últimas décadas que, quanto antes o tema for priorizado, melhores e maiores serão os frutos a serem colhidos.

Todas essas reflexões nos levaram a concluir que seria valioso formular e compartilhar uma agenda mínima de políticas e iniciativas, com o objetivo de ampliar a equidade de oportunidades para mulheres nos escritórios de advocacia. Essas recomendações são baseadas em experiências bem-sucedidas, boas práticas e políticas implementadas, além de resultados relevantes alcançados, que beneficiam não somente as profissionais envolvidas, mas também toda a coletividade.

Pesquisas recentes destacam a relevância da pauta de gênero e seu impacto no mercado de trabalho e na economia mundial. Segundo o 10.º Relatório do Banco Mundial sobre Mulheres, Empresas e o Direito, o Produto Interno Bruto (PIB) global poderia aumentar em 20% se fossem implementadas políticas que reduzissem as dificuldades impostas às mulheres enquanto profissionais. Em 2023, esse porcentual representaria cerca de US$ 5 trilhões.

Os indicativos, por sua vez, não são só quantitativos. Empresas com mais mulheres em posições de liderança apresentam melhores índices de satisfação, atratividade e performance. No entanto, a realidade ainda está distante do que seria aceitável.

Uma pesquisa da FIA Business School, realizada com mais de 150 mil funcionários de 150 grandes empresas do Brasil, mostrou que, até o ano passado, as mulheres ocupavam apenas 38% dos cargos de liderança. Embora seja um avanço em comparação com porcentuais anteriores, ainda é insuficiente, considerando aonde queremos e podemos chegar.

A par de todos esses índices, a verdade é que estamos falando de sociedades e resultados, mas, acima de tudo, de pessoas e de justiça. Ser mulher e profissional ainda é um grande desafio para aquelas que se aventuram no mercado de trabalho. Mulheres ainda são discriminadas por terem ambição, subestimadas mesmo quando extremamente preparadas, e vistas com desconfiança. Além disso, ainda temos dificuldade de vivenciar o senso de pertencimento, tão fundamental a todo e qualquer profissional. Por quê? Porque nossas referências ainda são predominantemente masculinas.

O caminho mais rápido para evoluirmos a uma velocidade mais razoável é aumentar a presença feminina nas posições de liderança. A propósito, mulheres na liderança são o principal vetor para levar outras diversidades ao “topo da pirâmide”.

Não se fará uma sociedade justa com pessoas de uma única raça, orientação sexual ou gênero. Não se fará uma sociedade justa se perpetuarmos os erros, preconceitos e vieses que permearam o ambiente corporativo por tantos anos. Não se fará uma sociedade justa se profissionais forem preteridas por não se identificarem com o padrão que até então é dominante. Não se fará uma sociedade justa se restar uma única profissional que tenha suas oportunidades reduzidas ou eliminadas simplesmente por ter nascido mulher. A hora é agora; não há mais tempo a perder.

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É SÓCIA DO ESCRITÓRIO MATTOS FILHO

Opinião por Glaucia Lauletta

É sócia do escritório Mattos Filho