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Cientista político, autor do livro ‘10 Mandamentos – Do brasil que Somos para o País de Queremos’, foi candidato à Presidência da República

Opinião|Na democracia, a responsabilidade é nossa

Escolha do mal menor colaborou para a degeneração das instituições democráticas. Eleições municipais são ótima oportunidade para inaugurar um novo tempo

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Atualização:

A democracia depende da existência de instituições inclusivas. Elas produzem governos eficientes que servem a sociedade, garantem as liberdades individuais e fazem valer o Estado Democrático de Direito. Já as instituições extrativistas destroem a democracia. O Estado é capturado por grupos de interesse que arrancam o couro, a carteira e a liberdade do cidadão que trabalha, empreende e produz para sustentar os feudos dos privilégios corporativistas dos setores público e privado. Essa é a principal conclusão do livro de Daron Acemoglu e James Robinson, Por que as nações fracassam.

Os sinais de debilidade institucional no Brasil são preocupantes. No comando da Nação está um presidente que volta ao poder com a clara intenção de desfazer os avanços das reformas (como o Marco do Saneamento e a reestatização de refinarias) e reescrever a história para apagar os escândalos de corrupção que mancharam a sua história e a do PT; um governante que dobra a aposta em políticas fracassadas de industrialização, reestatização, protecionismo e reserva de mercado que mantiveram o Brasil com taxas medíocres de crescimento nos últimos 40 anos; um chefe de Estado ignorante e irresponsável, que usa a diplomacia para proferir impropérios de um militante de esquerda juvenil e ofender o sofrimento do povo judeu e o Estado de Israel, cuja criação contou com o apoio e a liderança de um grande estadista brasileiro, Oswaldo Aranha.

A degeneração institucional do Supremo Tribunal Federal (STF) é preocupante. Em vez de ser o guardião da Constituição, tornou-se o exemplo de insegurança jurídica, privilégio imoral e ineficiência estatal. Como é possível ter segurança jurídica num país onde o STF muda o entendimento sobre tributo e o cobra de maneira retroativa? Como se justifica no Estado Democrático de Direito a abertura de inquéritos sem objetivo muito definido e com prazo indeterminado, que se transformam num instrumento de arbitrariedades jurídicas, permitindo decretar prisões e restrições de direitos de suspeitos de infrações genéricas? Como é possível achar normal que membros do STF julguem causas cujos escritórios de advocacia têm vínculo com parentes de seus ministros? Como ser membro do Poder Judiciário mais caro do mundo e não se envergonhar da impunidade e da insegurança jurídica que reinam no País? Como não sentir vergonha de juízes se comportarem como fariseus, que violam o teto constitucional de remuneração do funcionalismo público e se autoconcedem supersalários, penduricalhos e privilégios (sem contar que já gozam de 60 dias de férias)?

A combinação de degeneração institucional e populismo gera um enorme desafio para a nossa democracia. A perda de confiança nas instituições, o baixo crescimento econômico e a perpetuação de feudos de privilégios nos setores público e privado denotam um sistema político incapaz de responder aos anseios e à esperança dos brasileiros. Líderes populistas se apresentam como os únicos representantes legítimos da vontade popular, mas, na verdade, são demagogos perigosos que atacam as instituições quando elas buscam conter seus rompantes irresponsáveis.

É verdade que as nossas instituições mostraram coragem e eficiência ao debelar as ameaças à democracia nos últimos tempos. Na década passada, desvendaram o maior escândalo de corrupção da história, levando à punição de corruptos e corruptores denunciados pela Lava Jato. Removeram do poder por meio do impeachment uma presidente incompetente e imoral que usou pedaladas fiscais para ocultar o desastre das finanças públicas do seu governo; e provaram seu zelo à Constituição e à democracia ao rechaçar alucinações golpistas de celerados que felizmente não tiveram sucesso. Mas as instituições não aguentam desaforos recorrentes de eleitores que renovam o mandato de governantes populistas durante 20 anos (2002-2022).

Como disse o poeta W. B. Yeats, “tudo se parte, o centro não sustenta. Mera anarquia avança sobre o mundo. (...) Os melhores sem suas convicções e os piores com as mais fortes paixões”. No mundo da polarização, a sensatez desapareceu e o centro desabou. Restou o radicalismo, a intolerância de uma minoria com fortes paixões que arrastou o eleitor sensato a votar em populistas. A ideia de que não temos escolha é mero autoengano. Sempre há escolha para as pessoas que têm convicção nos valores fundamentais da liberdade e da democracia. Elas não se dobram à escolha utilitarista do mal menor.

A escolha do mal menor, que levou à eleição de populistas, colaborou para a degeneração das instituições democráticas. A perpetuação de instituições extrativistas é fruto das nossas escolhas, atitudes e, principalmente, do nosso voto. Só há um jeito de quebrar este círculo vicioso: crer nos valores da democracia e não compactuar com populistas; apoiar os defensores das reformas para criar instituições inclusivas; e votar em gente decente. As eleições municipais oferecem uma ótima oportunidade para inaugurar um novo tempo. Na democracia, só o voto popular pode mudar o destino da Nação e sepultar o populismo.

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CIENTISTA POLÍTICO, AUTOR DO LIVRO 10 MANDAMENTOS – DO BRASIL QUE SOMOS PARA O PAÍS DE QUEREMOS, FOI CANDIDATO À PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA

Opinião por Luiz Felipe D'Avila

Cientista político, autor do livro ‘10 Mandamentos – Do brasil que Somos para o País de Queremos’, foi candidato à Presidência da República

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