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Instrução Normativa estende caracterização de importador indireto às pessoas físicas

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Por Fernanda Sá Freire, André Menon e Laura Cavalcante
Atualização:
Fernanda Sá Freire, André Menon e Laura Cavalcante. FOTOS: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

A partir de 3 de outubro, as pessoas físicas poderão ser formalmente consideradas encomendantes ou adquirentes por conta e ordem de operações de importação indireta de mercadorias, sujeitando-se, assim, aos mesmos controles atualmente previstos exclusivamente às pessoas jurídicas nessas operações.

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A previsão que estende às pessoas físicas a caracterização formal de importadores indiretos - prerrogativa até então exclusiva de pessoas jurídicas - foi introduzida pela Instrução Normativa RFB nº 2101/2022, publicada no Diário Oficial da União em 13 de setembro, alterando a Instrução Normativa RFB nº 1.861/2018, que atualmente regulamenta a matéria.

Historicamente, até 2001, o ordenamento jurídico brasileiro apenas reconhecia a importação de mercadorias sob a modalidade de importação própria. Com a evolução das formas de operação em comércio exterior no Brasil, principalmente com a presença de estruturas que contavam com a terceirização dos serviços e das operacionalizações das importações, que buscavam facilitar as importações e o cumprimento das obrigações principais e acessórias, a legislação brasileira passou por inovações quanto à disciplina e regulamentação das operações de comércio exterior.

Nesse contexto, foi instituída a modalidade de importação por conta e ordem, por meio da edição da Medida Provisória nº 2.158-35/01, que alterou a redação do Decreto-Lei 37/66, de forma a prever a figura do "adquirente de mercadoria de procedência estrangeira, no caso de importação realizada por sua conta e ordem, por intermédio de pessoa jurídica importadora".

Seguindo a evolução do comércio exterior, em 2006 foi regulamentada outra modalidade de importação que também contava com intervenção de terceiros, mas com certas particularidades e maior assunção de riscos por parte do importador em relação à anterior modalidade de importação por conta e ordem. Trata-se da modalidade de importação por encomenda, instituída por meio da Lei 11.281/06.

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A evolução legislativa quanto a essas duas modalidades de importação de mercadorias no Brasil buscou regulamentar estruturas nas quais havia a intervenção de terceiros, sempre com o intuito de tornar esses intervenientes transparentes à fiscalização aduaneira, especialmente com o objetivo de coibir eventuais práticas ilícitas como evasão de divisas, lavagem de dinheiro, sonegação fiscal, descaminho, interposição fraudulenta, entre outras.

Assim, atualmente, existem três principais modelos de importação de mercadorias reconhecidos e regulamentados no Brasil: (i) importação direta (ou importação por conta própria, não analisada no presente material), (ii) importação por conta e ordem e (iii) importação por encomenda - essas duas últimas modalidades de importação indireta.

Desde a sua instituição até os dias atuais, porém, os modelos de importação indireta não eram completamente claros quanto à sua aplicabilidade às pessoas físicas - tanto na qualidade de importadores, quanto na qualidade de adquirentes (na importação por conta e ordem) ou encomendantes (na importação por encomenda).

Ao passo que a previsão das modalidades na forma instituída em lei contempla redação ampla, sem especificar a qualificação do adquirente ou encomendante, a disciplina regulamentar fazia menção exclusivamente às pessoas jurídicas, dando a entender que apenas pessoas jurídicas poderiam atuar na condição de adquirentes ou encomendantes. Dessa forma, às pessoas físicas caberia, em tese, apenas a realização de importação na forma direta.

De fato, em determinadas ocasiões, até mesmo a própria RFB manifestou seu e entendimento em soluções de consulta de que as modalidades de importação indiretas seriam vedadas às pessoas físicas. Mais recentemente, porém, esse entendimento foi relativizado, tendo a RFB manifestado seu entendimento de que, embora não vedadas às pessoas físicas, essas não estariam sujeitas ao mesmo controle aduaneiro aplicável às pessoas jurídicas nessas hipóteses.

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Com a recentíssima Instrução Normativa RFB nº 2101/2022, esse cenário se altera de forma considerável, de modo a também considerar - e sujeitar aos mesmos controles formais - as pessoas físicas que atuarem na condição de adquirentes/encomendantes. No entanto, é de se mencionar que a atuação como importadores indiretos segue sendo restrita às pessoas jurídicas.

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Importante destacar que permanecem sendo aplicáveis as mesmas limitações de destinação à mercadoria importada por pessoas físicas em operações diretas. Desta feita, as importações somente podem ocorrer para a realização de suas atividades profissionais, inclusive na condição de produtor rural, artesão, artista ou assemelhado; para uso e consumo próprio; e para coleções pessoais.

À luz do histórico da evolução legislativa das modalidades de importação indireta no Brasil, focada em capturar eventuais práticas ilícitas no comércio exterior, fica a indagação acerca das motivações da RFB para a extensão das modalidades às pessoas físicas neste momento.

Na prática, o maior efeito percebido com a extensão da disciplina relativa aos controles aduaneiros às pessoas físicas é o de que os riscos inerentes a essas importações indiretas também passam a ser expressamente aplicados a elas, especialmente a responsabilidade solidária - junto ao importador - na hipótese de caracterização da infração de ocultação do adquirente, mediante fraude ou simulação.

Não é demais lembrar, porém, que a atribuição de responsabilidade no comércio exterior, inclusive na qualidade de adquirente ou encomendante, sempre foi suficientemente ampla de forma a alcançar qualquer interveniente - seja pessoa jurídica, seja pessoa física.

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Da mesma forma, também não eram raros os casos em que a RFB promovia questionamentos quanto à qualificação de importações indiretas envolvendo pessoas físicas.

Entretanto, a forma de redação da disciplina infralegal, até antes da edição da Instrução Normativa RFB nº 2101/2022, não era expressa quanto à aplicação dos mesmos controles e formalizações dessas operações no caso de pessoas físicas.

Além disso, especificamente quanto à caracterização da infração de ocultação do adquirente, mediante fraude ou simulação, é de se notar que a nova regulamentação também traz mais uma previsão importante. Desde a criação das modalidades de importação indireta, a legislação determina a existência de contrato firmado entre importador e adquirente ou encomendante, bem como a necessidade de sua apresentação à RFB para fins do registro das importações.

De acordo com a Instrução Normativa RFB nº 2101/2022, porém, agora é expressamente previsto que a caracterização da infração de ocultação do adquirente ou encomendante, mediante fraude ou simulação, independe da existência de contrato formal prévio entre as partes. A previsão aplica-se tanto à operação realizada envolvendo pessoa física quanto a pessoa jurídica.

Não era novidade que a RFB já desconsiderava a existência de contratos formais para autuações aduaneiras, mas a inclusão dessa previsão pela Instrução Normativa RFB nº 2101/2022 parece ter sido instituída no intuito de conferir suporte legislativo a esse modo de autuação.

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E tal modificação é importante, uma vez que, de acordo com a legislação aduaneira, a infração de ocultação do adquirente, mediante fraude ou simulação, acarreta aplicação de pena de perdimento das mercadorias importadas ou - em caso de não localizadas ou já consumidas as mercadorias - a sua exigência na forma de multa equivalente ao valor aduaneiro das mercadorias importadas.

Por fim, cabe destacar que a Instrução Normativa RFB nº 2101/2022 dispensa, para as pessoas físicas, a adoção de procedimentos de prévio registro das importações, mas pressupõe, tal qual para as pessoas jurídicas, que o importador registre a respectiva declaração de importação com a indicação do CPF do adquirente ou encomendante e anexe contrato firmado entre as partes.

*Fernanda Sá Freire, André Menon e Laura Cavalcante são, respectivamente, sócios e advogada da área de Direito Tributário do Machado Meyer Advogados

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