Por Ricardo Brandt, enviado especial a Curitiba, Fausto Macedo e Julia Affonso
A Polícia Federal incluiu a JD Assessoria e Consultoria, do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, em um grupo de 31 empresas "suspeitas de promoverem operações de lavagem de dinheiro" em contratos das obras da Refinaria Abreu e Lima (Rnest), em Pernambuco - construção iniciada em 2007, que deveria custar R$ 4 bilhões e consumiu mais de R$ 23 bilhões da Petrobrás.
O documento é o primeiro de uma série de perícias técnicas da Polícia Federal que apontam um percentual de desvios na Petrobrás de até 20% do valor de contratos. O percentual é superior aos 3% apontados até aqui nas investigações da Operação Lava Jato, que incluía apenas da propina dos agentes públicos e políticos.
"Foi identificada movimentação financeira da ordem de R$ 71,4 milhões, tendo como origem Construções e Comércio Camargo Corrêa S/A e como destino as seguintes empresas, suspeitas de operarem lavagem de dinheiro: Costa Global Consultoria e Participações, JD Assessoria e Consultoria; Treviso do Brasil Empreendimentos e Piemonte Empreendimentos", registra o laudo 1342/2015, anexado na última quinta-feira, aos autos da Lava Jato.
As outras três empresas citadas nesse trecho do laudo são de dois delatores daLava Jato que já confessaram envolvimento no bilionário esquema de desvios da Petrobrás: Paulo Roberto Costa (Costa Global), ex-diretor de Abastecimento da estatal, e Julio Gerin Camargo (Treviso e Piemonte), lobista da Camargo Corrêa e do grupo japonês Mitsui.
A JD - que passou a ser usada por Dirceu para dar consultorias e palestradas após sua saída do governo Luiz Inácio Lula da Silva, em 2006 - integra tabela de empresas indicadas "como operadoras de lavagem de capitais".
"No período compreendido entre 31 de maio de 2010 e 28 de fevereiro de 2011, foi identificada movimentação financeira da empresa Construções e Comércio Camargo Corrêa S/A para a empresa JD - Assessoria e Consultoria Ltda, num
montante de R$ 844,6 mil", registra a perícia.
Consultorias. Os peritos afirmam que em documento fornecido pela Camargo Corrêa, a JD integra uma lista de "diversas empresas consultoras que supostamente teriam prestado serviços à empreiteira".
"Nessa relação foi localizada uma planilha eletrônica contendo a descrição sucinta de um contrato entre a empresa JD Consultoria e a empresa Camargo Corrêa, cujo objeto foi apresentado como 'Serviços de consultoria e análise dos aspectos sociológicos e políticos do Brasil'", informa o laudo.
A Lava Jato apura o uso de falsas consultorias por políticos e ex-agentes públicos como forma de ocultar dinheiro de propina. Além de Dirceu, outros ex-ministro como Antonio Palocci, são alvos de investigação.
As suspeitas reforçadas pelo laudo da PF são de que os pagamentos para a JD tiveram relação com as obras vencidas em 2009 pelo Consórcio CNCC - liderado pela Camargo Corrêa - para construção das Unidades de Coqueamento Retardado (UCR-21 e UCR-22), da Refinaria Abreu e Lima.
"Em face das suspeitas já definidas nos documentos de referência, permanece a suspeita sobre a regularidade dessas relações, reforçada pelo vínculo temporal estabelecido com a obra da Unidade de Coqueamento Retardado da Rnest."
O novo laudo, concluído no dia 2, tem 209 páginas e cruza dados contábeis, de engenharia, quebras de sigilos e materiais arrecadados em buscas, com ajuda da Petrobrás, apontando "sobrepreço de R$ 648,5 milhões". "Correspondendo a um sobrepreço mínimo de 16,8% do total contratado, considerados os aditivos e o termo de quitação parcial."
Subscrito pelos peritos criminais federais João José de Castro Vallim, André Fernandes Britto e Adilson Carvalho Silva, o laudo estabelece uma relação entre os pagamentos da estatal para empreiteira do cartel e as sucessivas etapas de contratação de fornecedoras e prestadores de serviços e consultorias como forma de ocultar as propinas.
A JD faturou ao todo R$ 29 milhões em oito anos - desse montante, R$ 8 milhões, pelo menos, com empresas acusadas de cartel na Petrobrás, pela Lava Jato.
Defesa. O criminalista Roberto Podval, que representa Dirceu e a JD, informou em petição protocolada em abril na Justiça Federal do Paraná que atualmente a consultoria está 'inoperante', cessadas todas as suas atividades.
A defesa tenta em côrtes superiores um habeas corpus preventivo para evitar a decretação de novas prisão do ex-ministro - condenado no mensalão, em 2013.
O ex-ministro sustenta que a consultoria prestada à Camargo Corrêa não tem relação com contratos da Petrobrás e que elas foram efetivamente prestadas, sem qualquer irregularidade.
A empreiteira, por meio do criminalista Celso Vilardi, apresentou em abril documentos nos autos da Lava Jato sobre os pagamentos e o contrato da JD com a Camargo Corrêa. Ele informou que os serviços foram efetivamente prestados.
"O ex-ministro José Dirceu e a JD Assessoria e Consultoria sempre estiveram à disposição da Justiça e prestaram todos os esclarecimentos solicitados pela 13ª Vara Federal do Paraná no curso da Operação Lava Jato. Conforme já informado à Justiça, a relação comercial da JD com as construtoras investigadas não tem qualquer vínculo com os contratos das empreiteiras com a Petrobrás", assinalou a assessoria de Dirceu, na ocasião.
COM A PALAVRA, A ASSESSORIA DE IMPRENSA DO EX-MINISTRO JOSÉ DIRCEU
"A defesa do ex-ministro José Dirceu afirma que nunca teve contrato com o consórcio responsável pela obra da refinaria Abreu e Lima. Segundo o advogado Roberto Podval, Dirceu foi contratado pela Camargo Corrêa para atuar em Portugal, como a própria construtora reconhece. Não teve, portanto, qualquer relação com contratos e obras da Petrobrás. Todas as informações, como contrato e notas fiscais, já foram encaminhadas à Justiça Federal do Paraná em janeiro."