A narrativa de corrupção em nosso país é antiga. Sabe-se que a formação do Brasil foi marcada pela existência de proximidade entre as esferas do público e privado, criando uma tradição de personalismo e patrimonialismo que ainda resiste no serviço público.
Nosso processo histórico foi marcado pela concessão de muitos benefícios a um pequeno grupo de pessoas. Com a colonização portuguesa, a Coroa se valeu dos particulares, delegando-lhes poderes públicos a fim de custearem a exploração do território, o que veio acarretar essa confusão entre público e privado, perdurando até os dias atuais.
Essa saga parece interminável a cada dia que passa. Assim, ficou marcada a década passada e permanece atualmente. Novas narrativas são, constantemente, apresentadas, com ousadia, sofisticação e novos personagens.
Na última década, pela primeira vez, houve avanço do combate à corrupção no Brasil. Criminosos poderosos foram processados, condenados e presos. Os brasileiros voltaram a ter esperança de que o país deixaria para trás a pecha de “paraíso da impunidade”, tornando-se o país da lei e da ordem.
A Operação Lava Jato revelou o maior esquema de corrupção pública da história brasileira, deixando claro, para todos, a causa principal do jeitinho brasileiro – o Formalismo.
Nesse sentido, saliento o pensamento de Riggs (1964) ao explicar a raiz estrutural do jeitinho brasileiro. “O denominado formalismo é a diferença entre o que a lei diz e aquilo que acontece de fato, sem que isso gere punição para o infrator da lei. É a existência de desconfiança das normas jurídicas dentro de uma sociedade”.
Em razão desse formalismo excessivo é que o “jeitinho” foi formado e usado para burlar as leis, as normas, as regras, as ordens etc.
Então, o combate à corrupção, mesmo com o apoio da sociedade, não foi suficiente para impedir que, no final da última década, viesse, à tona, a vingança daqueles que, outrora, foram julgados e punidos. Um plano claro de blindagem entre os envolvidos impôs medo a todos que ousassem ou ousarem enfrentá-los.
Mesmo diante de tantos retrocessos, a boa notícia é que sempre surgiram e surgirão bons exemplos diante de cenários caóticos. A Itália é a prova disso, pois foi lá que, em meio ao domínio da máfia, surgiu o “Addiopizzo”, entidade italiana formada por empresários que se recusaram e se recusam a pagar propina a agentes públicos, inspirados no empresário Libero Grassi, morto pela máfia por recusar submissão à exigência de arcar com esse suborno institucionalizado.
Atualmente, no Brasil, apesar dos esforços para a construção de narrativas infundadas e contrárias a quem procurou combater à corrupção como também de quem se posicionou a favor da Lava Jato, sem qualquer critério técnico, surge a esperança ante as falácias que não se sustentaram e não se sustentam.
Creio que a população está começando a compreender o que aconteceu e, portanto, sente a necessidade de se posicionar, de forma contundente, contra os atos contrários ao espírito público.
Nesse contexto de integridade pública, as eleições de 2024 se apresentam como uma janela de oportunidades para que boas escolhas sejam feitas, e que os malfeitores não alcancem o Poder.
Existe um candidato perfeito? Claro que não. Não devemos nos pegar aos vieses de esquerda, de direita ou de centro, mas, sim, à identidade de cada candidato, ao seu comportamento e ao seu histórico de vida. O Brasil já mostrou que tais orientações apenas fomentaram discursos mantenedores de poder. Não é à toa que, segundo a mídia, aprovaram o perdão da dívida de 23 bilhões de reais dos partidos políticos.
Talvez você se pergunte: Qual o viés ideológico correto? Eu diria que você já tem, em mente, a sua resposta. Basta você colocar sua reflexão em prática. Então, eu perguntaria: Você colocaria um contador que desviou recursos de sua empresa para cuidar novamente da contabilidade?
Se você respondeu, em sua mente, a pergunta formulada, reflita no seguinte acréscimo: qual seria a razão de confiar a administração da “coisa pública” a alguém que praticou crime contra a Administração Pública?
Talvez você seja uma pessoa otimista, e queira, ainda, citar algum exemplo de administrador público que desviou recursos públicos, mas se arrependeu e indenizou o Estado. Mesmo que assim fosse, será que você confiaria e concederia outra oportunidade a esse administrador?
Não esqueça, o seu voto é uma arma poderosa de transformação. O Ímprobo é o pior dos criminosos, pois atinge toda a sociedade, sequestra o futuro de crianças, mata doentes em filas de hospitais, ceifa vidas pelas estradas em péssimas condições e destrói a esperança de dias melhores.
Quando um corrupto se mantém no Poder ou chega ao Poder, toda a sociedade perde. Não importa a ideologia que você mais se identifica, a chaga da corrupção atinge a todos, como um vírus mortal, sem perguntar em quem você votou na última eleição.
Se o plano de construir uma sociedade livre, justa e solidária se mantém de pé, o primeiro passo para a liberdade é não ser prisioneiro de nenhum agente político. Pelo contrário, em uma Democracia forte, há a alternância de projetos com o debate constante de ideias e a existência de visões contrárias, de forma pacífica.
O povo tem uma importante missão em pouco menos de um mês: retirar corruptos do Poder ou impedi-los de chegarem ao Poder, pois se o vírus da corrupção for controlado, sobra a seleção de candidatos éticos e competentes.
Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Esta série é uma parceria entre o Blog do Fausto Macedo e o Instituto Não Aceito Corrupção. Os artigos têm publicação periódica
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