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Bruno Soller analisa o comportamento do eleitor brasileiro com base em big data e pesquisa

Opinião|Marina ou Macron: qual tipo de terceira via Tabata Amaral representará em São Paulo?

Independentemente de sua eleição, deputada federal tem todos os elementos para sair maior da disputa do que entrou

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Antes mesmo de começar a eleição para a prefeitura de São Paulo, um fato já pode ser dado como certo: Tabata Amaral é uma vitoriosa no processo. Independentemente de sua eleição ou não, a jovem deputada federal, de apenas 30 anos, tem todos os elementos para sair maior da disputa do que tem entrado nela. Até mesmo, se sucumbir a uma possível pressão para deixar a corrida para um posto de ministra, a empreitada já terá sido de sucesso. Com a ausência de jovens lideranças com apelo eleitoral, a parlamentar pessebista tem conseguido se sedimentar como uma alternativa à provável polarização e arranca de números satisfatórios para alguém que ainda precisa se tornar mais conhecida do grande público.

Com uma média na casa de 8% das intenções de votos, levando em consideração as últimas pesquisas de opinião divulgadas por Atlas, Paraná e Datafolha, Tabata ainda aparece em um segundo pelotão no arranjo eleitoral paulistano. As movimentações políticas, entretanto, podem favorecê-la a tal ponto que a deixe como a única alternativa possível entre o embate nacional Lula x Bolsonaro, que promete contaminar o eleitorado da cidade. Com a cada vez mais provável aliança entre Ricardo Nunes e Jair Bolsonaro e a dificuldade de Kim Kataguiri se viabilizar candidato dentro do União Brasil, o cenário político tende a criar três avenidas em São Paulo. Na raia da direita-conservadora Ricardo Nunes, na esquerda-lulista Guilherme Boulos e na terceira via Tabata Amaral.

Tabata Amaral lançou sua pré-candidatura na última semana, na laje da casa de sua mãe, na Vila Missionária Foto: Werther Santana/Estadão Conteúdo

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Na eleição presidencial, a mais aguerrida da história, 15% dos paulistanos acabaram votando em candidatos que fugiam da polarização nacional. Esse número é praticamente o dobro dos 8% que escolheram candidatos sem que fossem Lula ou Bolsonaro quando pensamos em todo o território nacional. Só Simone Tebet chegou a fazer 8% na capital paulista, mostrando que há na cidade um potencial maior em busca de uma via que não esteja contaminada pelo dualismo lulobolsonarista.

Em regiões de poder aquisitivo mais alto, essa dinâmica por quebra da polarização ganhou contornos mais interessantes. Nos zonais do Jardim Paulista e Indianópolis, por exemplo, a soma das candidaturas de terceira via, na eleição anterior, atingiu 24% dos votos. Na Vila Mariana, 21%, e em Perdizes, 19%. Há uma demanda natural nesses lugares por essa quebra da polarização. Mesmo que não majoritária, há indícios de que existe um espaço de construção para candidaturas que dialoguem com essa expectativa eleitoral.

Oriunda da periferia de São Paulo, Tabata fez questão de lançar sua pré-candidatura na Vila Missionária, bairro onde cresceu, localizado na Zona Sul da cidade, na região de Cidade Ademar, onde Lula, com 51%, teria vencido a eleição em primeiro turno caso só fossem computados os votos da região. A estratégia de construir sua candidatura do subúrbio para o centro, além de dialogar com a sua história de vida, é fundamental para não permitir que acabe se reduzindo a ser uma candidata dos mais abastados da capital. Seu histórico eleitoral já aponta para isso. Foram nas zonas mais ricas da cidade onde Tabata foi mais votada para deputada federal na sua última eleição.

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Tabata Amaral vai tentar quebrar a polarização entre o prefeito Ricardo Nunes e o deputado federal Guilherme Boulos na disputa pela capital paulista Foto: Taba Benedicto/Estadão

Sua associação com o apresentador José Luiz Datena, que pode ser seu vice na disputa, além de buscar trazer respostas para um dos maiores problemas que a cidade enfrenta, a crise da segurança pública, também tem um componente importante para popularizá-la nos bairros de menor renda. Segundo dados do Kantar, que mede os perfis dos telespectadores, o programa Brasil Urgente, da Band, apresentado por Datena, tem como público fiel cidadãos de classe C1, C2 e D, moradores das franjas da cidade. Além disso, um perfil etário mais velho, algo importante para a jovem candidata.

O sucesso dessa empreitada definirá que tipo de terceira via Tabata conseguirá ser na contenda de outubro desse ano. Para chegar ao Palácio Anchieta, não haverá outra hipótese, a não ser conseguir conquistar parcela do eleitorado da periferia paulistana, que tem uma visão de regular para ruim da atual gestão chefiada por Ricardo Nunes e ainda não comprou em definitivo a candidatura de Boulos, que tende a ser impulsionada pela popular Marta Suplicy e por Lula. Os movimentos até aqui parecem acertados, mas a efetividade disso só poderá ser vista mais à frente, quando o eleitor se conscientizar de que terá que fazer suas escolhas.

Sem essa penetração popular, Tabata correrá o risco de repetir Marina Silva, quando de sua primeira candidatura presidencial. Candidata pelo PV, à época, Marina surgiu como uma terceira via, com posições políticas marcantes e um discurso ambientalista moderno para a época em que o tema sustentabilidade ainda não exercia o papel de protagonismo que possui hoje. Amealhou quase 20% dos votos e saiu muito maior do que quando entrou na disputa. Entretanto, Marina ficou restrita ao chamado “voto de opinião”, alcunha dada de forma preconceituosa para o voto das classes mais altas. Para Marina faltou chegar ao povo. Suas ideias ficaram restritas a uma parcela da população que não é capaz de eleger majoritariamente nenhuma candidatura.

Sonho de muitos marqueteiros políticos, a estratégia Macron é a definição de sucesso de uma candidatura de terceira via. O movimento En Marche! liderado pelo presidente francês Emmanuel Macron, de caráter social liberal foi criado para juntar esquerda e direita e propor um renascimento da política francesa. O plano era polarizar contra a polarização do Partido Socialista e da direita liderada por Le Pen. Mostrar que havia um caminho de consenso melhor para os franceses e que superava as amarras ideológicas. Sua construção se deu por duas formas: a primeira como um polo que rejeitava o binarismo do atraso e a segunda no debate sobre o medo. Apoiou-se na rejeição de Le Pen para mostrar aos eleitores de esquerda que somente ele poderia vencer a candidata ultradireitista, que gerava bastante dúvidas sobre suas ideias e capacidade de implementá-las.

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Mostrar-se capaz de ser a única alternativa a derrotar o bolsonarismo em São Paulo, pode ser importante para que Tabata tenha êxito em sua trajetória. Apoiar-se em certa rejeição de Boulos é uma tática para que não fique presa apenas a propor ideias e se mostrar preparada. Com apenas dois mandatos de deputada federal e tão jovem, Tabata já pode ser considerada vitoriosa. Conseguiu importantes apoios, é debatida em todos os meios de comunicação e parte de bons índices para sua primeira eleição majoritária. Todavia, para não cair na armadilha de se tornar uma nova Marina Silva, Tabata necessita fazer um jogo eleitoral sem erros e pragmático, para quem sabe surpreender e instaurar uma nova frente política, que pode ser semente para derrotar a polarização no País.

Opinião por Bruno Soller

Bruno Soller é estrategista eleitoral. Especializado em pesquisas de opinião pública, é graduado em Relações Internacionais pela PUC-SP, com especialização em Comunicação Política pela George Washington University. Trabalhou no governo federal, Câmara dos Deputados e Comissão Europeia.

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