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Bastidores da política que movimentam a economia

Opinião|Haddad, ‘humilhado’ pela Câmara, tem nas mãos de Lira seus planos para a economia

O presidente da Câmara até agora não disse o que pensa em relação à meta do Haddad

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Foto do author Lorenna Rodrigues

A terra redonda da política tem girado tão rápido este ano que deve estar deixando tonto o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Que foi de dúvida do mercado financeiro a queridinho da Faria Lima com a mesma rapidez que fazia amizade com o “todo poderoso” presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). A ponto de Lira, insatisfeito com a articulação política do governo, pedir para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva catapultar Haddad para Casa Civil e promovê-lo a negociador geral da República.

Mais algumas voltas, porém, Haddad e Lira se desentenderam ao mesmo tempo em que o mercado começa a não morrer de amores pelo ministro. Pesquisa Genial Quest divulgada na semana passada mostra que caiu a avaliação positiva do ministro entre julho e setembro (de 65% para 46%) e subiu a negativa (de 11% para 23%).

O ministro Fernando Haddad e o presidente da Câmara, Arthur Lira, em encontro em abril deste ano Foto: WILTON JUNIOR / ESTADÃO

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A desconfiança do mercado vem mesmo depois de a Câmara ter aprovado o novo arcabouço fiscal criado pelo ministro da Fazenda para controlar as contas públicas. Foi um processo tão desgastante no Legislativo que, no meio dele, Haddad soltou numa entrevista a frase que irritou profundamente Lira – há quem diga que estão rompidos até hoje: “A Câmara está com um poder muito grande e não pode usar esse poder para humilhar o Senado e o Executivo”, declarou.

Só que o chefe da área econômica subestimou o que ainda viria pela frente. O mercado gostou da aprovação do arcabouço, claro, mas desconfia se será possível tirar do papel tudo o que é necessário para colocá-lo de pé. Especialmente as medidas para aumentar a arrecadação e a fatídica meta de déficit primário zero no ano que vem.

Depois do entrevero, Haddad depende, agora, do próprio Lira para salvar seus planos para a economia. Principalmente, sua “meta zero”. O deputado Danilo Forte (União-CE), relator do projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2024, que traz a previsão do resultado neutro, já deixou bem claro que não simpatiza com um alvo tão apertado para o ano que vem. Disse que tem “dó” de Haddad e que é “quase impossível” zerar a meta do ano que vem. “Da minha parte, não (está descartado alterar a meta). E acho que não também da parte do governo”, afirmou.

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Como pontuou Forte, nessa empreitada, o ministro da Fazenda não tem apoio garantido nem mesmo do governo. O “fogo amigo” da ala política atuou, sem sucesso, para que o projeto do orçamento nem sequer saísse do Executivo prevendo o déficit zero. Não vai ser no Congresso que os governistas farão esforços para defendê-lo.

A vontade de deputados e senadores de ter uma meta mais “frouxa” tem razão de ser: quanto mais apertada, menos espaço para liberar emendas. E aqui está o pulo do gato. Com o fim do orçamento secreto, Lira já deixou claro que quer que o Legislativo tenha mais controle sobre o orçamento de outras formas. Quer aumentar a impositividade da execução das emendas parlamentares, a parte desses recursos que o governo é obrigado a pagar.

Só que, de nada adianta o governo ter em tese que executar mais emendas ano que vem e, por outro lado, precisar congelar a liberação das verbas para entregar a meta de déficit zero. Nesse cenário, mesmo as emendas obrigatórias poderiam ser congeladas, e os parlamentares continuariam a ver navios. Em ano de eleição municipal, não conseguiriam colocar placa nas obras nos seus redutos eleitorais e impulsionar as candidaturas de seus apadrinhados às prefeituras.

O presidente da Câmara até agora não disse o que pensa em relação à meta do Haddad. Em um evento, falou apenas que é importante manter o “sarrafo” alto e que a casa legislativa está à disposição para um “debate franco”. Do pacotão de “medidas saneadoras”, aquelas necessárias para aumentar a arrecadação do governo e fechar a conta do arcabouço, o presidente da Câmara deixou claro que serão analisadas caso a caso, o que significa que dificilmente os R$ 168,5 bilhões pretendidos serão alcançados.

E o Legislativo não só não tem ajudado, como vem atrapalhando. Como mostrou o Broadcast, o Congresso pode aprovar medidas - apresentadas inclusive por parlamentares governistas – que podem custar R$ 88,5 bilhões por ano à União.

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Só Lira tem o poder de conter a sanha gastadora. É ele quem pode pautar, despautar e construir acordos para votar os projetos, especialmente sem o apoio total e irrestrito até mesmo dos mais ferrenhos governistas. Terá ele interesse?

Opinião por Lorenna Rodrigues

Editora do Broadcast, serviço de notícias em tempo real do Grupo Estado, em Brasília, e colunista do Broadcast e Estadão. Jornalista desde 2006, especialista em Orçamento e Gestão Pública e em Desenvolvimento Econômico. Responsável por coberturas como das emendas Pix e de investigações de fraudes no cartão de vacina do ex-presidente Jair Bolsonaro.

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