O caso estourou há duas semanas, quando o papa ordenou a suspensão da excomunhão do bispo tradicionalista britânico Richard Williamson. Para esse religioso, "nenhum judeu morreu em câmaras de gás", e o número de judeus mortos pelos nazistas não supera 300 mil. Sobre seu anti-semitismo, Williamson disse, em entrevista: "Anti-semitismo só é ruim se for contra a verdade. Mas, se algo é verdadeiro, não pode ser ruim. Não estou interessado na palavra anti-semitismo".
O bispo Gerhard Müller, de Regensburg, que também é tradicionalista, disse à Der Spiegel não saber por que o papa "estendeu as duas mãos" a um bispo que "inventou histórias de modo idiota e escandaloso". O jesuíta Klaus Mertes relatou que há "ultraje" entre os católicos, tanto em relação a Williamson como em relação à decisão de Bento 16. Internautas católicos em fóruns de discussão foram mais diretos. Um deles escreveu: "Williamson está cometendo um crime na Alemanha, enquanto o papa o premia tornado-o bispo da igreja. O que aconteceria se Williamson explodisse uma bomba numa sinagoga? O papa o faria cardeal?"
No Vaticano, o cardeal Walter Kasper, amigo do papa e presidente do Conselho Pontifício para a Promoção da Unidade Cristã, disse que Bento 16 não consultou ninguém sobre sua decisão. Kasper renunciou ao cargo.
Bento 16 aparentemente sentiu a pressão. Mandou dizer que não sabia que Williamson era um negador do Holocausto e, nesta quarta-feira, exigiu que o religioso se retratasse como condição para que sua reintegração fosse efetivada. Isso deve bastar para acalmar os ânimos, ainda que os danos causados pela crise sejam imprevisíveis.
Mas o caso todo levanta questões importantes. O papa está isolado? Estará ele cercado de assessores incapazes de contrariá-lo ou de alertá-lo para eventuais erros? Terá ele perdido contato com o mundo exterior, isto é, a vida real fora das muralhas do Vaticano? Visto que Bento 16 é o líder de milhões de fiéis ao redor do mundo, tido como farol moral e espiritual em meio às controvérsias do mundo contemporâneo, isso não é pouca coisa.