A ascensão de Pablo Marçal (PRTB) nas pesquisas tem preocupado alguns eleitores, que, a menos de um mês da votação, já consideram recorrer ao voto útil para impedir que o influenciador avance para o segundo turno da eleição municipal em São Paulo. É o que mostra uma pesquisa qualitativa conduzida pelo Instituto Travessia com dez eleitores.
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Embora Marçal tenha o eleitorado mais fiel entre todos os candidatos, com pouca margem para uma desidratação, a pesquisa indica que ele terá dificuldade para conquistar novos eleitores. Isso porque o influenciador é o postulante com a maior rejeição e tem uma imagem já fortemente consolidada no imaginário dos paulistanos. As palavras usadas pelo grupo para descrevê-lo são um termômetro disso: enquanto seus apoiadores o veem como “sonhador” e “causador”, os demais eleitores recorrem a adjetivos como “lunático”, “mentiroso”, “fanfarrão” e “mau-caráter”.
Com 19% de intenção de voto na última pesquisa Datafolha, atrás de Ricardo Nunes (MDB, com 27%) e empatado tecnicamente com Guilherme Boulos (PSOL, com 25%) no limite da margem de erro, Marçal é o candidato que mais desperta emoções no grupo, tanto positivas quanto negativas.
Para seus apoiadores, ele é um voto de protesto, alguém que representa o “novo” nesta eleição. Sua “veia empreendedora” e postura firme contra o candidato do PSOL são pontos que agradam. “Eu voto nele porque ele é diferente e quer trazer algo novo”, diz D., de 36 anos, que não se incomoda com as polêmicas que recaem sobre o empresário. “Quem aqui nunca fez nada de errado?”, questionou ele, arrancando risos de outros participantes da pesquisa. “O que ele fez para mim é fichinha”, acrescentou, referindo-se à condenação do ex-coach por furto qualificado.
A maior parte do grupo, no entanto, demonstra receio diante da possibilidade de Marçal assumir a Prefeitura de São Paulo, e pelo menos quatro eleitores já consideram votar em um nome mais competitivo nas pesquisas para evitar que o ex-coach chegue ao segundo turno.
“Estou entre Tabata [Amaral] e [Guilherme] Boulos, mas consideraria votar no [Ricardo] Nunes só para o Marçal não ir para o segundo turno”, afirmou o estudante V., de 25 anos, que mora na Lapa. “Se for preciso votar em alguém para evitar que Marçal seja prefeito e depois vire um novo [Jair] Bolsonaro, farei isso”, declarou o consultor de vendas A., 56 anos, morador de Santa Ifigênia e eleitor de Tabata Amaral (PSB). Para ele, a deputada federal foi a única candidata que apresentou propostas nos debates.
A autônoma P., de 48 anos, moradora do Jaraguá, ainda não definiu seu candidato, mas admite que pode optar por um voto estratégico para frear Marçal. “Continuo indecisa sobre quem votar. Mas não voto de jeito nenhum no Marçal. Se eu tiver que votar em alguém que eu não gosto só para tirar ele, eu faço. Só para não ter a menor possibilidade de acontecer o que aconteceu com o [ex-presidente Jair] Bolsonaro. Essas pessoas chegam tumultuando e ganham capital político”, disse ela, que ao longo da dinâmica elogiou a gestão Nunes.
Também indecisa, a personal trainer F., 27 anos, moradora da Vila Madalena, simpatiza com Boulos, mas prefere aguardar as pesquisas para avaliar “quem é o melhor candidato” para enfrentar Marçal, em quem ela não vota “de jeito nenhum”.
Voto útil tende a beneficiar Nunes
A pesquisa qualitativa sugere que Nunes pode ser o principal beneficiário do voto útil que parece se desenhar na eleição paulistana. O prefeito é visto como uma figura neutra, e sua reeleição não é considerada um risco pelos dez eleitores.
Embora Nunes seja descrito como alguém “fraco”, “apagado” e sem “sangue nos olhos”, os eleitores reconhecem pontos positivos de sua gestão, como a criação da faixa exclusiva para motos e a proposta da tarifa zero.
O horário eleitoral de Nunes, que foi exibido ao grupo durante a pesquisa, causou boa impressão, especialmente entre as eleitoras, que reagiram positivamente à ideia de implementar tarifa zero para mães que buscam seus filhos nas creches municipais. Uma eleitora indecisa chegou a comentar que Nunes é “zero carisma, mas tem proposta boa”.
Assim como Marçal, Boulos conta com um eleitorado mais convicto do que Nunes e Tabata, mas enfrenta o desafio da rejeição. Para seus apoiadores, o líder sem-teto simboliza “novidade”, “empatia” e “esperança”. Já para aqueles que o rejeitam, ele é visto como “fanfarrão”, “marionete” e “hipócrita”.
O líder sem-teto tem dificuldade de furar a bolha da esquerda, e eleitores menos ideológicos demonstram incômodo com inserções do candidato no horário eleitoral gratuito que o mostram ao lado de figuras associadas ao PT, como os ex-prefeitos Fernando Haddad (PT) e Luiza Erundina (PT).
Tabata Amaral é vista com bons olhos pela maioria do grupo, exceto pelos eleitores de Marçal. Alguns manifestam a percepção de que, aos 30 anos, ela seria muito jovem para ser prefeita. Há, ainda, uma confusão sobre o seu posicionamento ideológico: o grupo não tem clareza se Tabata é uma candidata de direita, esquerda ou centro.
O candidato José Luiz Datena (PSDB) não se sai bem nesse grupo de eleitores. “Coitado do Datena, até esqueci dele”, disse, aos risos, P., de 48 anos, após o nome do apresentador ser citado. Eleitores de Tabata e Marçal revelaram ter cogitado voto no tucano, mas acabaram mudando de opinião no decorrer da campanha. Datena tem registrado quedas nas pesquisas eleitorais. O apresentador saiu de 14%, no início de agosto, para 6%, segundo o último levantamento do Datafolha, divulgado nesta quinta-feira, 12.
“Nunes agrada especialmente aos eleitores que buscam uma opção mais segura, que fuja da polarização dos extremos Marçal e Boulos. O eleitorado de Boulos parece estar se solidificando, principalmente entre jovens e eleitores progressistas, enquanto os apoiadores de Marçal são muito rígidos e demonstram uma admiração incondicional pelo candidato. O que se percebe é uma cristalização tanto de Marçal quanto de Boulos, mas com a possibilidade de Nunes crescer mais que os dois por ser visto como uma escolha mais segura. Tanto que um dos indecisos, ao final, declarou voto em Nunes. Embora Tabata Amaral seja vista como a candidata mais preparada e qualificada, ela não demonstra força e experiência suficientes para governar São Paulo na visão do grupo”, avalia Renato Dorgan, cientista político e CEO do Instituto Travessia.
Segurança é o principal problema de São Paulo
Para o grupo de dez eleitores, a segurança é o principal problema da capital paulista, sendo a situação do centro mais crítica que a do resto da cidade. Eles relataram sensação de aumento de assaltos, furtos e presença de usuários de drogas nas ruas. Morador do Bom Retiro, P., 27 anos, não se sente seguro na cidade. “Já fui assaltado e espancado”, afirmou o vendedor. D., de 36 anos, é empresário e reside em Itaquera, na Zona Leste, lugar que acredita ser mais seguro que a região central de São Paulo.
Apesar de um integrante do grupo ter mencionado problemas no Sistema Único de Saúde (SUS), como a demora no atendimento em postos de regiões mais afastadas, três eleitores elogiaram o sistema de saúde na capital paulista, relatando experiências positivas de familiares em tratamentos de doenças graves, como câncer.
Houve críticas ao transporte público da capital, especialmente em relação à condição das frotas e à superlotação dos veículos em horários de pico.
“Em boa parte dos ônibus, o ar-condicionado não funciona”, afirmou A., 45 anos, morador do Tucuruvi. O empresário D. relembrou a relação dos ônibus com o crime organizado na capital. “Desde criança ouço falar que o transporte é do PCC [Primeiro Comando da Capital].” Apesar dos problemas, os eleitores elogiaram a gratuidade das passagens aos domingos. “Minhas clientes não tinham como ir ao parque com os filhos no fim de semana por falta de dinheiro”, contou a autônoma P..
Como funciona a pesquisa
Reunidos em uma “sala de espelho” — ambiente com espelho unidirecional que permitiu à reportagem observar a dinâmica sem ser vista —, os eleitores discutiram vários temas relacionados à cidade e à eleição municipal. A conversa foi mediada pelo cientista político Renato Dorgan, que conduzia as perguntas e estimulava a participação dos presentes. O grupo de eleitores, formado por dez moradores de São Paulo das classes B e C1, incluiu dois apoiadores de Nunes, Boulos, Marçal e Tabata, além de dois indecisos.
As pesquisas qualitativas não possuem a mesma precisão metodológica que as quantitativas em relação à amostra, pois não têm o objetivo de representar todo o universo do eleitorado. Elas são realizadas com grupos específicos, de oito a dez pessoas, que, embora não tenham valor estatístico, simbolizam os sentimentos de determinado segmento.